Lacuna no Processo Civil

AutorIla Barbosa Bittencourt
Páginas263-271

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1. Do agravo de instrumento no ordenamento jurídico brasileiro

O duplo grau de jurisdição é princípio constitucional implícito, que permite à parte inconformada com a decisão de primeiro grau recorrer a novo julgamento, a fim de satisfazer seus interesses. Está presente na legislação brasileira desde a Constituição Imperial de 1824. Foi consagrado pela Revolução Francesa, como garantia do regime democrático, e foi previsto pela Constituição Francesa de 22/08/1795 (arts. 211, 218 e 219) e faz parte do Pacto de São José da Costa Rica.

Nesse sentido, o agravo de instrumento é uma das formas recursais previstas no ordenamento jurídico brasileiro, de modo que nossa abordagem versará sobre a questão específica de sua interposição quando denegado o recurso especial ou extraordinário.

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Para tanto, faremos breve análise da sua previsão legal no ordenamento jurídico. Primeiramente, convém mencionar que o recurso era cabível contra decisões interlocutórias, de modo geral.

As decisões interlocutórias se caracterizam por ter resolvido, no curso do processo, uma questão incidente.1Por outro lado, Araken de Assis2esclarece que é inadmissível agravo contra as omissões do órgão judiciário. Segundo o autor, quando o gravame é provocado pela omissão do juiz, justamente por nada decidir, não é agravável. Nesse caso, o recurso adequado é chamado de embargos de declaração.

Com mudanças ocorridas na lei processual civil, tal recurso passou a ser previstos em casos específicos, como, por exemplo, na hipótese de decisão interlocutória que possa causar lesão grave ou de difícil reparação à parte, quando houver denegação de apelação ou decisão que receba a apelação em efeitos diversos e decisão que receba petição inicial de improbidade administrativa, sendo esta situação prevista na legislação extravagante.

Além dos casos previstos em lei, a Súmula 118 do Superior Tribunal de Justiça, "o agravo de instrumento é o recurso cabível da decisão que homologa a atualização do cálculo da liquidação". Os artigos 522 a 529 do Código de Processo Civil tratam do procedimento adequado à sua interposição, sendo que o agravo de instrumento deverá ser interposto diretamente perante o Tribunal competente e seu processamento será imediato, desde que devidamente instruído para que o Órgão Recursal analise a questão.

A petição escrita conterá os requisitos do art. 524, I a III do Código de Processo Civil e deve ser assinada pelo advogado da parte agravante e deverá ser interposta no prazo de dez dias. O agravo de instrumento, em regra, é recebido no efeito devolutivo e, se requerido, pode ser também recebido no efeito suspensivo e, neste caso, será concedido desde que presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora.

Vale sempre lembrar que a Súmula 86 do Superior Tribunal de Justiça permite que haja recurso extraordinário do acórdão que julga o agravo de instrumento. Nesse caso, teremos a figura do recurso extraordinário retido, ou seja, não será processado imediatamente porque, in casu, o recurso teria sido decidido de forma interlocutória. Portanto, somente após a decisão de mérito, o STF poderia decidir o recurso extraordinário em relação ao acórdão do STJ, proferido em sede de agravo de instrumento.

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Não é demais salientar que a decisão interlocutória deve ser impugnada imediatamente, sob pena de preclusão. Atualmente, a regra é o agravo retido, sendo que o agravo de instrumento tornou-se exceção permitida nos casos retromencionados. Cabível ainda lembrar o fato de que o juízo de admissibilidade dos recursos ocorre em dois graus: no juízo a quo e no juízo ad quem. Em tal situação podemos visualizar o duplo controle de admissibilidade dos recursos.

A distinção dos efeitos do juízo de admissibilidade são relevantes para o encaminhamento de nosso estudo: se o juízo de admissibilidade for negativo no órgão a quo, abre-se a via do recurso de agravo de instrumento, ora em análise. Se o juízo de admissibilidade for negativo no órgão ad quem, o resultado será o não conhecimento do recurso. Se o recurso não é conhecido, seu mérito não será analisado.

A título de ampliar o arcabouço de informações sumárias a respeito do agravo de instrumento, vale mencionar que a Reforma Recursal no Processo Penal3 pretende suprimir a Carta Testemunhável, cabível das decisões denegatórias de recebimento ou de seguimento de recurso, para dar lugar ao agravo de instrumento. Outra hipótese legal que será substituída pelo agravo, neste caso, retido ou de instrumento, será o recurso em sentido estrito, atualmente em vigor, destinado às decisões interlocutórias no processo penal.

2. O recurso especial e o recurso extraordinário no ordenamento jurídico brasileiro

É relevante recordarmos o fato de que, somente a partir da Constituição Federal de 1988, a tarefa de uniformização da interpretação da legislação federal infraconstitucional passou a ser do Superior Tribunal de Justiça. Até então, era atribuição do Supremo Tribunal Federal, por meio do recurso extraordinário.

Atualmente, está previsto no art. 105, III da Constituição Federal de 1988, acompanhado de suas hipóteses legais. A Lei nº 8.039/90 regula o seu processamento, bem como, o Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

Por se tratar de recurso excepcional, todas as vias ordinárias de recurso devem ter sido esgotadas, conforme o texto do inciso III do art. 105 da Constituição Federal de 1988: "causas decididas em única ou última instância", bem como a questão não pode ensejar reexame dos fatos, pois tal via recursal analisa, meramente, questão de direito infraconstitucional.

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Além daquele requisito legal, outros são exigidos para a admissibilidade do referido recurso. Entre eles está o prequestionamento. Para tanto, não basta que a parte alegue a questão federal de índole infraconstitucional no curso da ação, em primeiro grau ou nas razões de recurso. É preciso que a decisão recorrida faça referência a ela. Por isso, em caso de omissão do Tribunal, a parte deve opor embargos declaratórios, sob pena de faltar este requisito essencial ao seu recebimento.

Outra forma de realizar o prequestionamento está na interposição de embargos infringentes, cabíveis em face de...

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