Recuperação judicial. Participação dos credores na recuperação judicial. Supressão e abuso do direito de voto

AutorSérgio Campinho
Ocupação do AutorAdvogado. Professor de Direito Comercial da Universidade do Estado do Rio de Janeiro ? UERJ
Páginas551-598
RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PARTICIPAÇÃO DOS
CREDORES NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUPRESSÃO E
ABUSO DO DIREITO DE VOTO
PARECER
Sumário: I – A Consulta. II – O Parecer. II.1 – A recuperação
judicial como contrato e o controle judicial. II.2 – Princípios
informadores da recuperação judicial. II.3 – O pagamento na
moeda da recuperação. II.4 – A participação dos credores na
recuperação judicial. II.5 – A supressão do direito de voto do
credor. II.6 – A opção pelo recebimento do crédito em ação
de natureza cognitiva. II.7 – O abuso do direito de voto. II.8
– A rejeição do plano: Decretação da falência. III – As Res-
postas aos Quesitos.
I – A CONSULTA
As sociedades denominadas X Ltda. e Y Ltda. (“CONSULENTES”),
através de seus ilustres advogados, Drs. AAA e BBB, formulam con-
sulta a partir da questão central debatida nos autos dos Agravos de
Instrumento nos. xxxxx e yyyyy.
Nesse passo, as CONSULENTES relatam que:
Em 23.12.2013, a X Ltda. (“X”) foi contratada pela concessionária
Z S.A. (“Z”) para prestar serviços de construção e implantação dos
principais trechos da ferrovia Z, localizada no Estado do Pia, por
meio do Contrato de Empreitada por Preços Unitários nº. 002/2013.
Em 25.09.2015, após a deflagração de conflitos entre a X e a Z, o
referido contrato foi resolvido, o que teria gerado prejuízos à X.
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Diante desse cenário, agravado pela crise econômico-financeira vi-
venciada pelo Brasil, em 05.10.2015, a X apresentou pedido de recu-
peração judicial, o qual foi autuado sob o nº. aaaaa e distribuído para a
6ª Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janei-
ro.
No âmbito do aludido pedido de recuperação judicial, além de re-
querer o deferimento do seu processamento, a X pleiteou a intimação
da Z para (i) efetuar o depósito em juízo dos valores que não haviam
sido pagos no âmbito do mencionado contrato de empreitada; e (ii)
suspender a exigibilidade dos contratos de seguro, cujo objetivo era
garantir o pagamento de valores adiantados pela Z à X e as suas obriga-
ções contratuais em até 10% do valor do contrato.
Em 27.10.2015, o Juízo da 6ª Vara Empresarial deferiu o processa-
mento da recuperação judicial, porém rejeitou os pedidos indicados
acima, sob o fundamento de que o conflito existente entre as partes
deveria ser analisado por via própria.
Diante disso, em 04.11.2015, a X requereu, em face da Z, Medida
Cautelar, que foi autuada sob o nº. bbbbb e distribuída para a 18ª Vara
Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo, pretendendo afastar,
liminarmente, a exigibilidade das apólices de seguro. Na sequência, o
referido juízo determinou a suspensão do pagamento das apólices, após
consignar ser imprescindível a “apuração exata de responsabilidades e
valores eventualmente devidos por qualquer das partes”. Destacou,
ainda, que não havia liquidez que obrigasse a X a pagar qualquer quan-
tia à Z, sob o argumento de que, “a despeito da discussão da culpa em
si pela rescisão do contrato, somente após tal análise seria possível
constatar se há valor a ser pago pela autora à ré, ou não”. Tal decisão foi
mantida pela 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo, nos autos do Agravo de Instrumento nº. ccccc.
Em 03.12.2015, a X ajuizou Ação Principal, de natureza cognitiva,
autuada sob o nº. ddddd e igualmente distribuída para a 18ª Vara Cível
do Foro Central da Comarca de São Paulo, requerendo, dentre outros
pedidos, fosse a Z condenada a “arcar com custos, prejuízos e danos
decorrentes de inadimplementos contratuais da [Z] e rescisão abrupta
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e imotivada do Contrato”, os quais, na data de distribuição da aludida
ação, atingiam o montante de R$309.783.798,55.
Na mesma data, a X também propôs, em face da Z, a Ação Monitó-
ria autuada sob o nº. eeeee e igualmente distribuída para a mencionada
18ª Vara Cível, com o escopo de receber o valor histórico de
R$13.791.968,00, oriundo do Boletim de Medição nº. 16, emitido no
âmbito do prefalado contrato de empreitada.
Em 01.02.2016, a Z apresentou Reconvenção nos autos da citada
Ação Principal pleiteando a condenação da X ao pagamento de mon-
tante a ser “apurado mediante extensa dilação probatória em ‘fase pe-
ricial’ própria, ou ‘em liquidação de sentença’”, supostamente devido
em razão de adiantamentos, indenização pelos custos de nova contrata-
ção e de defeitos na prestação dos serviços e, ainda, pelos valores su-
postamente pagos a maior a título de taxa de administração.
Em paralelo, nos autos da recuperação judicial da X, as partes tra-
varam uma discussão sobre a competência para apreciação daquela ma-
téria, então submetida ao juízo da 18ª Vara Cível. Nesse contexto, em
18.02.2016, o juízo recuperacional se declarou incompetente para jul-
gamento das ações e consignou que a questão deveria ser apreciada e
decidida pelo juízo de São Paulo. Esse posicionamento foi mantido, à
unanimidade, pelos Desembargadores integrantes da 22ª Câmara Cível
do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no bojo do Agravo
de Instrumento autuado sob o nº. fffff, que atualmente encontra-se em
fase de Agravo contra a decisão que deixou de admitir o Recurso Espe-
cial interposto.
Por ocasião da distribuição do pedido de recuperação judicial da X,
constava em seu balanço verba de R$39.782.251,31 em favor da Z,
referente a adiantamentos para execução da obra. Apesar dessa quantia
ter sido consumida ao longo da execução do contrato de empreitada,
não foi objeto de medição, razão pela qual a Z foi listada na primeira
relação de credores apresentada. Com a publicação dessa primeira lista
de credores, a Z dirigiu ao Administrador Judicial Pedido de Divergên-
cia, que foi acolhido para majorar a quantia inicialmente listada para
R$46.782.795,65.
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