Responsabilidade civil médica hospitalar

AutorPedro Pais de Vasconcelos
Ocupação do AutorProfessor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Páginas185-191
RESPONSABILIDADE CIVIL MÉDICA
HOSPITALAR
Pedro Leitão Pais de Vasconcelos
Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Presidente
da Direção da secção portuguesa da AIDA – Associação Internacional do Direito dos
Seguros – Secção Portuguesa. Diretor da revista DSR – Direito das Sociedades em Revista.
Membro do CIDP – Centro de Investigação de Direito Privado da Faculdade de Direito de
Lisboa. Membro da APODIT – Associação Portuguesa de Direito de Trabalho. Membro
do European Law Institute. Membro da Associação Portuguesa de Arbitragem. Advogado.
Sumário: 1. Introdução. 2. O dano injusto entre o direito civil e o direito comercial. 3. O mau
tratamento médico como resultado de uma escolha reprovável ou como risco inexorável. 4.
A perspectiva do risco e a solução do seguro. 5. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A teoria da responsabilidade civil é imensamente rica e não deixa, hoje, por tratar
já praticamente nada. É difícil encontrar lacunas no seu âmbito material interior. Mas
há ainda temas que são dogmaticamente periféricos, embora materialmente e funcio-
nalmente sejam inseparáveis da sua funcionalidade, praticabilidade e, quer dizer, da
sua ef‌iciência. Um dos principais é o da relação da responsabilidade civil com o seguro,
especif‌icamente com o seguro de responsabilidade civil e mesmo com o seguro em geral.
O Prof. John Birds, talvez o principal autor inglês do direito dos seguros, disse-me
um dia em conversa que liability without insurance is a dog with no teeth. E justif‌icou que,
em grande parte dos casos, não adiante muito condenar a outra parte em indemnização,
quando ela depois vai cair em insolvência e não pagar. A responsabilidade civil, por si
só e sem o seguro, tem uma ef‌iciência limitada na prática.
Mas proximidade entre a responsabilidade civil e o seguro não se queda por aqui. O
seguro é, também, um modo alternativo à responsabilidade civil de resolver a questão do
dano injusto.
O dano injusto é aquele cujo padecimento não é conforme com o plano normativo,
com as coordenadas axiológico-jurídicas do sistema. O risco é suportado, em princípio,
por aquele sobre quem cai (the risk lies were it falls), mas nem sempre é justo que assim
suceda e nem sempre o direito aceita que seja sofrido por aquele que teve a pouca sorte
de o sofrer. Quando assim sucede, diz-se em direito que o risco é injusto, leia-se, o risco
é ilícito. Não é que a ilicitude incida sobre o risco propriamente dito, porque haver risco
é uma fatalidade, mas antes sobre o facto de ser sofrido por aquela pessoa. Que alguém
sofra aquele risco e padeça das suas consequências não é lícito nem ilícito, é natural, mas
o que releva é a identidade de quem o sofre. Dano ilícito, nesta perspetiva, é aquele que
cai sobre alguém que não é justo que o sofra.1
1. A referência ao dano injusto surgiu no artigo 28º Decreto-Lei 32.171 de 29 de julho de 1942, a propósito da
responsabilidade civil dos médicos: “o médico que como tal causar, dolosa ou culposamente, um dano injusto

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