Art. 4º-A. Comentários

AutorRaphael Miziara/Iuri Pinheiro
Ocupação do AutorAdvogado/Juiz do Trabalho do TRT da 3ª Região
Páginas50-73

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1. Empresa prestadora de serviços. De acordo com a redaçao dada pela Lei n. 13.429/17, a empresa de prestação de serviços — EPS é a pessoa jurídica de direito privado que objetiva prestar à contratante (pessoa natural ou jurídica), serviços determinados e específicos. Aqui a Lei introduziu significativa novidade, pois traz figura nova. A EPS só será utilizada quando se tratar de terceirização perene, ou seja, sem ser a produzida pelo trabalho temporário. Na hipótese de trabalho temporário, a empresa prestadora de serviços é denominada de ETT — Empresa de Trabalho Temporário.

Com a Reforma Trabalhista, não mais se fala em serviços determinados e específicos, expressões de sibilino alcance. Passou-se a considerar prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade económica compatível com a sua execução.

Portanto, a partir da Lei n. 13.467/2017 pode-se conceituar a empresa de prestação de serviços — EPS como a pessoa jurídica de direito privado que objetiva prestar à contratante (pessoa natural ou jurídica), quaisquer serviços ligados às suas atividades, inclusive sua atividade principal, desde que tenha capacidade económica compatível para a execução do objeto contratual.

2. Pessoa jurídica de direito privado. Assim como na ETT, a EPS, necessariamente, deve ser pessoa jurídica. Com isso, não é dado a pessoa natural figurar como empresa prestadora de serviços. Ao mencionar a expressão "pessoa jurídica" a Lei ainda traz outra consequência, qual seja, a de evitar que sociedades não personificadas (tais como, sociedade em comum — arts. 986 e seguintes, do Código Civil — e sociedade em conta de participação — arts. 991 e seguintes, do Código Civil) atuem na qualidade de empresa prestadora de serviços.

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Ademais, é preciso mencionar que o art. 4ª-B, inciso II, da Lei n. 6.019/74, incluído pela Lei n. 13.429/2017, impõe como requisito para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros o registro na Junta Comercial.

Nesse prumo, o registro do ato constitutivo de uma pessoa jurídica deve ser realizado no Cartório do Registro das Pessoas Jurídicas (quando se tratar de fundação, associação ou sociedade simples) ou na Junta Comercial (quando se trate de sociedade empresarial ou microempresa).46

Com isso, conclui-se que a empresa prestadora de serviços deve ser, necessariamente, sociedade empresarial, excluindo-se a possibilidade de uma fundação, associação ou sociedade simples se ativar como empresa prestadora de serviços.

3e4. Destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos. Essas expressões foram revogadas pela Reforma Trabalhista. No entanto, tendo em vista o debate recente, optou-se por comentá-las.

É princípio basilar de hermenêutica jurídica aquele segundo o qual a lei não contém palavras inúteis: verba cum effectu, sunt accipienda.47 Ou seja, as palavras devem ser compreendidas como tendo alguma eficácia. Não se presumem, na lei, palavras inúteis.48

Desse modo, imperioso se mostra a valoração de todos os vocábulos para perquirição do verdadeiro sentido e alcance de um texto, porque este deve ser entendido de modo que tenham efeito todas as suas provisões e de modo que nenhuma parte resulte inoperativa ou supérflua, nula ou sem significação alguma.49

Imperioso, portanto, descortinar a mens legis no que toca às expressões "determinados" e "específicos". Começaremos por explicar o que não significam tais expressões, a partir de uma interpretação que subtrai significados e possibilidades semânticas.

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A primeira coisa que se pode afirmar, sem medo de errar, é que tais palavras não podem ser interpretadas como sinónimas de "atividade-fim" ou "atividade--meio". O motivo é simples, como se passa a explicar.

Na sua redação originária, o Projeto assim estabelecida, verbis: "considera-se empresa de prestação de serviços a terceiros a pessoa jurídica de direito privado, legalmente constituída, que se destina a prestar determinado e específico serviço para outra empresa, fora do âmbito das atividades-fim e normais da tomadora dos serviços".

A parte final do dispositivo, que foi retirada posteriormente, dizia: "fora do âmbito das atividades-fim e normais da tomadora dos serviços". Ora, tal redação nos faz concluir que, a toda vista, "determinado e específico" não significa e nunca significou, desde o início do projeto, "atividades-fim".

Entender assim é afirmar que a redação do projeto originário trazia consigo uma verdadeira contradição em termos, pois, substituindo-se a expressão "determinado e específico" por "atividades-fim", por exemplo, a sentença ficaria, inadmissivelmente, assim grafada: "que se destina a prestar serviço em atividade-fim para outra empresa, fora do âmbito das atividades-fim".

Logo, pensar que "serviços determinados e específicos" significa atividade-fim e/ou atividade-meio é conferir interpretação que tangencia o absurdo. É um óbvio, ululante.

Pois bem, demonstrado que "determinados e específicos" não indica atividade-fim, importa agora tentar descobrir os significados de tais palavras.

Serviço determinado é aquele previamente estipulado e delimitado/identificado quanto à sua natureza, visto de forma mais ampla. Como exemplo, pode-se mencionar: serviço de limpeza, serviço educacional, serviço de vigilância patrimonial, dentre outros.

Por sua vez, serviço específico é o serviço especificado, enumerado, discriminado, pormenorizado. O próprio nome está a indicar que o serviço determinado é mais genérico. De outro lado, o serviço específico é, como a própria linguagem nome sugere, mais especificado. Ou seja, especificar um serviço é enumerar, discriminar e pormenorizar as tarefas atinentes ao serviço determinado.

Essa diferenciação fica ainda mais nítida quando se faz o cotejo do dispositivo em comento (art. 4ª-A, caput) com o art. 5ª-B, II. Com efeito, ao mencionar serviços específicos, o art. 4ª-A, caput, deve ser lido em conjunto com o art. 5ª-B, II, da Lei, que exige, como conteúdo obrigatório do contrato de prestação de serviços, a especificação do serviço a ser prestado.

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Logo, pela dicção legal, nao basta determinar os serviços no contrato, é preciso que os mesmos sejam especificados, de modo a que o trabalhador não tenha nenhuma dúvida de quais tarefas ele desempenhará perante a tomadora.

A finalidade da Lei, ao mencionar que os serviços devem ser determinados e específicos, foi evitar a utilização indiscriminada dos trabalhadores, pela contratante, em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços. Tanto é que essa possibilidade restou expressamente vedada no art. 5S-A, § 1s, da Lei: "É vedada à contratante a utilização dos trabalhadores em atividades distintas daquelas que foram objeto do contrato com a empresa prestadora de serviços".

Com efeito, a expressão "serviços determinados e específicos" revela que a terceirizaçao só é admitida quanto a serviços delimitados previamente e especificados. Vale dizer, a empresa prestadora não pode prestar serviços genéricos, não se admitindo a terceirizaçao, pela empresa contratante (tomadora), de atividades sem especificação.50

Sobre o tema, vale lembrar que a CLT, em seu art. 443, § 1ª, ao disciplinar o contrato por prazo determinado, afirma que este é o contrato de trabalho cuja vigência dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada.

Nos contratos por prazo determinado do art. 443 da CLT admite-se que o objeto do contrato diga respeito à atividade-fim do empreendimento. Ou seja, essa execução de serviços especificados pode se referir a atividade-fim.

Em razão dessa previsão, Gustavo Filipe Barbosa Garcia lembra que pode surgir uma outra linha interpretativa. Assim registra o notável professor:

No contrato de trabalho a prazo determinado o empregador contrata o empregado diretamente, inclusive para realizar atividades inerentes à sua atividade empresarial.

Com isso, torna-se possível o entendimento de que a terceirizaçao, desde que seja de serviços delimitados e especificados, pode dizer respeito às atividades essenciais da contratante, ou seja, integrantes de seu objetivo social.

Em outras palavras, com a Lei n. 13.429/2017, para certa corrente, permite-se concluir que a chamada atividade-fim da empresa tomado-

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ra pode ser terceirizada para uma empresa prestadora especializada, respeitando-se a exigência de que os serviços sejam determinados e específicos.51

Não compactuamos dessa linha de pensamento. A previsão celetista nada mais faz do que determinar a especificação dos serviços, ou seja, a delimitação dos mesmos, seja em atividade-fim, seja em atividade-meio. No entanto, para a aceitação de terceirizaçao geral na atividade-fim, era preciso que a lei previsse essa possibilidade expressamente, como fez com o trabalho temporário.

Agora, com a Reforma Trabalhista, o debate está superado e permite-se a terceirizaçao de serviços para a execução de quaisquer das atividades da empresa contratante, inclusive sua atividade principal.

5 e 6. Empresa prestadora de serviços contrata e remunera. É a empresa prestadora de serviços que contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores. Inicialmente, é preciso responder as seguintes indagações: há relação de emprego entre o trabalhador e a EPS? Em caso positivo, contrato é por tempo determinado ou indeterminado? No período em que não estiver em missão, como fica o recebimento dos salários? Ficariam eles em disposição remunerada? Esses e outros questionamentos serão aqui enfrentados.

O status do trabalhador é de empregado da empresa prestadora de serviços. Ora, é ela quem contrata e anota a CTPS, sendo também a responsável principal pelo pagamento de todos...

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