Os Contratos nas Técnicas de Reprodução Assistida

AutorBeatriz Capanema Young
Páginas367-382
Os contratos nas técnicas de
reprodução assistida
Beatriz Capanema Young
Resumo: A Constituição da República de 1988, em seu artigo 226, § 7º,
reconhece a todos o direito ao livre planejamento familiar. No campo da re-
produção humana são significativas as conquistas permitidas pelo avanço da
ciência, especialmente no que diz respeito às técnicas de reprodução assisti-
da. O dinamismo com que ocorrem tais avanços coloca a ciência em des-
compasso com o direito, o que deixa diversas questões carentes de respostas
do legislativo. Nesse sentido, propõe-se analisar as espécies contratuais que
permeiam essas relações e possíveis problemas que podem sobrevir durante
a aplicação das técnicas de reprodução assistida, sempre propondo uma in-
terpretação constitucional humanizada ante o objeto de tais contratos de es-
copo existencial.
Palavras-chave: Biodireito. Planejamento familiar. Reprodução Assisti-
da. Técnicas. Resolução CFM nº 2.168/2017.
Abstract: The Republic Constitution of 1988, in its article 226 § 7º, rec-
ognize all citizens the right to independent family planning. In the human
reproduction field are significant the achievements allowed by the advance
of science, specially concerning the assisted reproduction techniques. The
dynamism that occurs these advances puts science mismatched with the
law, leaving various issues wanting answers from the legislative. In these
terms, its proposed examine the contractual species that surface in that re-
lation and the possible problems that can supervene during the application
of the assisted reproduction techniques, always proposing a humanized con-
stitutional interpretation because the object of such existential contracts.
Key-Words: Biolaw. Family planning. Assisted reproduction. Tech-
niques. CFM Resolution nº 2.168/2017.
Sumário: 1. Introdução. 2. Espécies contratuais nas técnicas de repro-
dução assistida. 2.1. O contrato de inseminação artificial. 2.2. O contrato de
fertizilação in vitro e a preservação criogênica de embriões. 2.3. O contrato
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de gestação por substituição. 2.4. Problemas suscitados pela aplicação das
técnicas. 3. Por uma interpretação contratual constitucional. 4. Conclusão.
Referências.
1. Introdução
Com fundamento nos princípios da dignidade da pessoa humana e da
paternidade responsável, a Constituição da República de 1988, em seu arti-
go 226, § 7º, reconhece a todos o direito ao livre planejamento familiar. Tal
direito abrange não somente a não interferência no exercício do direito de
fundar uma família, mas também o direito à procriação.1 A regulamentação
trazida pela Lei nº 9.263/96, prevê em seu artigo 9º o exercício do direito
ao planejamento familiar, através do oferecimento dos métodos e técnicas
de concepção e contracepção cientificamente aceitos. Neste sentido, com-
preende-se que as “técnicas de concepção” abrangem também as técnicas de
reprodução assistida.2
Para se chegar a efetiva concretização deste direito, conforme delimita-
do nos dispositivos constitucionais acima mencionados, foram necessários
dois grandes saltos evolutivos da ciência: o primeiro ocorreu na década de 60
com a criação da pílula anticoncepcional, e o segundo a partir da década de
70 com a difusão dos métodos de reprodução assistida e os bons resultados
obtido.3 Este segundo momento significou importante progresso na resolu-
ção de um dos problemas mais antigos da sociedade: a infertilidade.4 Os nú-
meros da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostram que a infertilida-
de é um problema vivido por 8% a 15% dos casais.5 No Brasil, estima-se que
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1 Para Heloisa Helena Barboza, o exame do parágrafo 7º, do artigo 226, da Consti-
tuição Federal de 1988, “permite reconhecer a introdução em nosso sistema de deno-
minada ‘autonomia reprodutiva’, sendo assegurado o acesso às informações e meios para
sua efetivação, ao se atribuir ao Estado o dever de propiciar recursos educacionais e
científicos para o exercício desse direito, e ao se vedar qualquer forma coercitiva por
parte de instituições oficiais ou privadas”. (BARBOZA, Heloisa Helena. Reprodução
humana como direito fundamental. In: Carlos Alberto Menezes Direito; Antônio Au-
gusto Cançado Trindade; Antônio Celso Alves Pereira. (Org.). Novas Perspectivas do
Direito Internacional Contemporâneo. 1. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2008).
2 BARBOZA, Heloisa Helena. Proteção da autonomia reprodutiva dos transexuais.
In: Revista Estudos Feministas. Florianópolis, mai./ago., v. 20, n. 2, 2012, p. 552.
3 Utiliza-se a expressão “reprodução assistida” como gênero, que comporta diferen-
tes espécies, como a inseminação artificial e a fertilização in vitro.
4 LEWICKI, Bruno. O homem construtível: responsabilidade e reprodução assistida.
In: BARBOZA, Heloisa Helena; BARRETO, Vicente de Paulo (Orgs.). Temas de Biodi-
reito e Bioética. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 102.
5 Disponível em: “http://www.who.int/reproductivehealth/publications/monito-
ring/924156315x/en/”. Acesso em: 17 fev. 2018.

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