Dano moral nas relações de consumo: breve crítica à tríade - enriquecimento sem causa/indústria do dano moral/mero aborrecimento

AutorVitor Guglinski
Ocupação do AutorEspecialista em Direito do Consumidor pela Universidade Estácio de Sá (UNESA). Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas Vianna Júnior. Membro associado do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON).
Páginas257-272
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DANO MORAL NAS RELAÇÕES DE CONSUMO:
BREVE CRÍTICA À TRÍADE – ENRIQUECIMENTO
SEM CAUSA/INDÚSTRIA DO DANO MORAL/
MERO ABORRECIMENTO
Vitor Guglinski
Especialista em Direito do Consumidor pela Universidade Estácio de Sá (UNESA).
Graduado em Direito pelas Faculdades Integradas Vianna Júnior. Membro associado
do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON). Autor co-
laborador da obra Código de Defesa do Consumidor: Doutrina e Jurisprudência para
Utilização Prossional (Coleção Uso Prossional – Editora JusPodivm). Coautor da
obra internacional Temas Actuales de Derecho del Consumidor (editora Normas Jurí-
dicas – Peru). Coautor da obra Dano Temporal: O Tempo como Valor Jurídico (editora
Empório do Direito). Autor colaborador de diversos periódicos jurídicos. Ex-assessor
jurídico da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG). Advogado.
Sumário: 1. Introdução – 2. A imprecisão do argumento do enriquecimento sem causa e a falaciosa
tese sobre a existência de uma “indústria” do dano moral – 3. Críticas ao argumento do mero abor-
recimento – 4. Conclusão – 5. Referências bibliográcas.
1. INTRODUÇÃO
Foi com a entrada em vigor da Carta Republicana de 1988 que a reparabilidade
do dano moral ganhou previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro, cons-
tando como direito fundamental nos incisos V1 e X2 do respectivo art. 5º. Antes,
passou-se pela fase da irreparabilidade dessa espécie de dano, em que se af‌irmava ser
inestimável a dor moral, e até mesmo se considerar imoral atribuir um preço à dor3,
e apenas em casos pontuais deferia-se compensações por dano moral com base no
art. 156 do Código Civil de 19164.
Na órbita infraconstitucional – e nos estritos limites deste trabalho, isto é, sem
ignorar outros diplomas legais que também passaram a prever textualmente a repa-
rabilidade do dano moral -, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) foi
o primeiro diploma normativo a prever expressamente a prevenção e reparação de
1. “V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material,
moral ou à imagem”.
2. “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
3. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 91.
4. ANDRADE, André Gustavo de. Dano Moral e Indenização Punitiva: Os Punitive Damages na Experiência do
Common Law e na Perspectiva do Direito brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 8.
VITOR GUGLINSKI
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danos morais como direito básico do consumidor, em conformidade com o disposto
nos incisos VI5 e VII6 do seu art. 6º. Anos mais tarde, foi a vez do novo Código Civil
(Lei 10.406/02) incorporar tal previsão no seu art. 1867.
A expressa previsão normativa da reparação do dano moral no ordenamento
jurídico brasileiro, aliada ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, implícito no
inciso XXXV, do art. 5º, da CF/888 e à superveniência da Lei dos Juizados Especiais
(Lei 9.099/95), ampliou o acesso ao Poder Judiciário, que antes praticamente só era
possível àqueles que dispunham de capacidade f‌inanceira para litigar, ante o alto custo
de um processo judicial. Consequentemente, o maior acesso à Justiça possibilitou a
busca pela reparação de danos morais perante o Judiciário.
Porém, tão logo as indenizações começaram a ser deferidas, aqueles que
eram atingidos pelas condenações – principalmente as grandes sociedades
empresárias – argumentavam que o número de ações envolvendo pedidos de
compensação por danos morais mostrava que havia se instituído uma “indús-
tria” de ganhos fáceis.
Edson Nelson Ubaldo denuncia que essa suposta verdade contaminou parte
da magistratura, reforçando o argumento de juízes mais conservadores, que por
razões ideológicas, inclusive de fundo religioso, nunca viram com bons olhos o
novo instituto jurídico, ao mesmo tempo em que acabou inibindo magistrados mais
liberais, cujas sentenças passaram a ser reformadas pelos tribunais para diminuir
os valores f‌ixados9.
Sobre o número de ações cujo objeto envolve pedidos relacionados a violações
das normas de proteção e defesa do consumidor, Marié Miranda denuncia a respon-
sabilidade do Estado pelos retrocessos contemporâneos em matéria de proteção e
defesa do consumidor. Na esfera do Poder Executivo, a autora aponta def‌iciências que
vão desde a inef‌iciência dos órgãos de regulação ao disciplinar e f‌iscalizar inúmeros
setores de atuação de fornecedores no mercado de consumo (aviação civil, telefonia,
energia elétrica, atividade f‌inanceira, saúde suplementar etc.). Já no âmbito do Po-
der Legislativo, destaca a omissão das Casas Legislativas em relação à apreciação de
matérias que são objeto de projetos de lei envolvendo direitos do consumidor. Por
f‌im, quanto ao Poder Judiciário, elenca desde a edição de súmulas que discriminam
o consumidor em contratos bancários até a indevida f‌lexibilização das normas do
5. “VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”.
6. “VII o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patri-
moniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica
aos necessitados”.
7. “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
8. “XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
9. A propósito do dano moral. Disponível em http://www.amc.org.br/portal/o_judiciario/2009/AMC200906.
pdf. Acesso em: 21 ago. 2018.

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