Das Pessoas Jurídicas

AutorCleyson de Moraes Mello
Ocupação do AutorVice-Diretor da Faculdade de Direito da UERJ - Professor do PPGD da UERJ e UVA - Advogado - Membro do IAB
Páginas441-530
Capítulo 9
DAS PESSOAS JURÍDICAS
9.1 Conceito
Thelma Fraga entende por pessoa jurídica “a representação
decorrente da união de algumas pessoas naturais e/ou jurídicas
ou, ainda, da destinação de um patrimônio com o intuito da con-
secução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica, como
sujeito de direitos e obrigações”.1
Na definição de Arnaldo Rizzardo, a pessoa jurídica é “o ente
personalizado composto de duas ou mais pessoas físicas, unidas
por um nexo visando a uma finalidade específica, e com a capa-
cidade para realizar vários atos da vida civil; ou o ente público
instituído por lei, mas que pressupõe normalmente a presença
de vários indivíduos; ou o acervo de bens com destinação espe-
cial, no qual também se congregam indivíduos”.2
As pessoas, no mundo da vida, com interesses comuns, pro-
curam criar relações de cooperação unificando seus interesses
através das pessoas jurídicas. A pessoa jurídica, como ente juri-
dicamente personalizado, é sujeito de direitos e obrigações.
É o direito que investe a pessoa jurídica como titular de di-
reitos e deveres, uma vez que ela difere da existência da pessoa
natural. Esta possui existência biológica, aquela existência nor-
mativa. Tais entidades não possuem unicidade em sua denomi-
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1 FRAGA, Thelma Araújo Esteves; MELLO, Cleyson de Moraes. Direito
civil: introdução e parte geral. Niterói: Impetus, 2005, p. 142.
2 RIZZARDO, Arnaldo. Parte geral do código civil. 4. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006, p. 249.
nação. No Brasil, na Alemanha, na Espanha e na Itália optou-se
pelo termo pessoa jurídica. Na Argentina é utilizado o nome de
“entes de existência ideal” e em Portugal é empregada a expres-
são “pessoas coletivas”.
9.2 Natureza Jurídica
A natureza jurídica da pessoa jurídica é permeada por diver-
gências doutrinárias, fruto dos diversos pensamentos filosófico
de seus idealizadores.
As principais teorias para explicar a natureza e o fundamento
dessa entidade podem ser agrupadas da seguinte forma:3
1°) a que considera as pessoas jurídicas puras criações do Es-
tado, e, portanto, ficções da lei (Savigny, Laurent e Vauthier
etc.);
2°) a que afirma ser este gênero de pessoas uma simples apa-
rência escogitada para a facilidade das relações, sendo o verda-
deiro sujeito de direitos, que se lhes atribuem, os indivíduos que
as compõem ou em benefício dos quais elas foram criadas (Yhe-
ring e Bolze);
3°) a que contorna a dificuldade, dizendo que, no caso das
chamadas pessoas jurídicas ou sociais, os bens não têm proprie-
tários, os direitos não têm sujeitos (Windscheid, Brinz e Deme-
lius);
4°) a que considera a vontade como o sujeito dos direitos,
tanto em relação aos indivíduos, quanto às corporações e às
fundações (Zietelmann e Meuren);
5°) a que pretende ver nas pessoas jurídicas simples
manifestações de propriedade coletiva (Planiol);
6°) a que enxerga nas pessoas jurídicas (corporações, socie-
dades e fundações) substâncias reais e vivas como as que servem
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3 Trabalhos da Com. da Câmara, vol 2°, p. 294. In: SÁ FREIRE, Milciades
Mário de. Manual do código civil brasileiro: parte geral. Vol. II. Rio de
Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos, 1930, p. 175.
de base às pessoas físicas (Gierke, Endemann, D’Aguano, Gior-
gi, Fadda, Benza etc.).
Além das teorias acima mencionadas, é possível ainda indi-
car:
7°) a teoria normativista formalista kelseniana que entende
que a personificação das pessoas jurídicas é fruto da norma jurí-
dica que obriga e confere direitos e deveres a elas. Kelsen afirma
que “a pessoa física ou jurídica ‘tem’ como sua portadora – de-
veres jurídicos e direitos subjetivos e estes deveres são direitos
subjetivos, são um complexo de deveres jurídicos e direitos sub-
jetivos cuja unidade é figurativamente expressa no conceito de
pessoa. A pessoa é tão somente a personificação desta unida-
de”.4 Em relação à pessoa jurídica (corporação), Kelsen explica
que “uma tal corporação é, em regra, definida como uma comu-
nidade de indivíduos a que a ordem jurídica impõe deveres e
confere direitos subjetivos que não podem ser vistos como deve-
res ou direitos dos indivíduos que formam esta corporação como
seus membros, mas competem a esta mesma corporação”.5
8°) A teoria da realidade técnica adotada pelos franceses,
em especial, Saleilles, Geny, Capitant etc., sustenta que a pes-
soa jurídica possui existência real que não equivale à das pessoas
físicas. É uma espécie de realidade técnica, pela qual se tradu-
zem os fenômenos jurídicos existentes.
9°) A teoria da vontade diretora proposta por Ferrara “iden-
tifica os sujeitos de direito, não como os destinatários das vanta-
gens ou interesses, mas como os depositários da vontade das
pessoas jurídicas, que são os seus membros, ou, tal seja sua situa-
ção, os administradores, considerados, uns e outros, sob seu as-
pecto orgânico e não individual”.6
443
4 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Macha-
do. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 192-193.
5 Ibid., p. 194.
6 RAO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 4. ed. Vol. 2. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1997, p. 739.

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