Negócio Jurídico

AutorCleyson de Moraes Mello
Ocupação do AutorVice-Diretor da Faculdade de Direito da UERJ - Professor do PPGD da UERJ e UVA - Advogado - Membro do IAB
Páginas627-715
Capítulo 13
NEGÓCIO JURÍDICO
13.1 Conceito e Importância
O conceito de negócio jurídico é um tema eivado de diver-
gências o que traduz uma série de teorias definidoras do negócio
jurídico. A doutrina, de modo geral, procura emoldurar a ques-
tão a partir da apresentação de diversas teorias sobre o negócio
jurídico, a partir da manifestação da vontade, suas limitações,
sua eficácia, dentre outros aspectos.
O negócio jurídico é por excelência o instrumento da auto-
nomia privada, através do qual os particulares autorregulam
seus interesses privados. Os conceitos de autodeterminação, au-
tonomia privada e liberdade contratual frequentemente são uti-
lizados como sinônimos.
De acordo com Joaquim de Souza Ribeiro a autodetermina-
ção é um conceito pré-jurídico que assinala o “poder de cada in-
divíduo gerir livremente a sua esfera de interesses, orientando a
sua vida de acordo com as suas preferências”.1 É um conceito
amplo que traduz um valor relacionado à pessoa humana. É uma
ideia diretiva básica, que, “no quadro de certas concepções polí-
ticas, ideológicas, éticas e econômicas, se condensa num princí-
pio fundante e estruturante do sistema de direito privado”.2 Da
mesma forma, Karl Larenz afirma que “la autodeterminación es
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1 RIBEIRO, Joaquim de Souza. O problema do contrato: as cláusulas
contratuais gerais e o princípio da liberdade contratual. Coimbra: Almedina,
2003, p. 22.
2 Ibid., p. 23.
una de las capacidades fundamentales del hombre. La posibili-
dad de celebrar contratos y de regular mediante ellos sus rela-
ciones jurídicas con otros es un importante tipo de actuación de
esta capacidad. Por esto la libertad contractual es un principio
del Derecho justo”.3
A autonomia privada é “um processo de ordenação que fa-
culta a livre constituição e modelação de relações jurídicas pelos
sujeitos que nelas participam”.4
A autonomia se contrapõe à heteronomia, já que é possível
que as pessoas fixem as regras que devem obedecer a partir de
seus próprios interesses, com vistas a uma maior dinâmica so-
cial.
De certa forma, a autodeterminação e a autovinculação esta-
belecida na esfera pessoal e familiar é uma marca indelével da
modernidade. O homem possui liberdade para fomentar suas
relações contratuais, bem como exerce o poder de dispor sobre
sua propriedade. Neste momento, a burguesia primava pela livre
circulação das riquezas sem as amarras do Estado e visava o in-
cremento do comércio e da economia.
Daí que a autodeterminação se entrelaça com a autonomia
privada, já que para alcançar aquele valor é necessário dar proe-
minência à autonomia privada, uma vez que esta configura o
princípio diretor das relações intersubjetivas.
Nessa linha, Ribeiro entrança o conceito de autonomia priva-
da com a autodeterminação. Vejamos: “o conceito contenta-se
com uma atividade de autorregulação de interesses privados,
com uma manifestação de vontade que utilize o negócio jurídico
como operador. Mas a questão institucional da autonomia priva-
da, a da definição de seu campo, requer um complexo de valora-
ções que atenda, em primeira linha, à típica possibilidade de rea-
lização pessoal dos sujeitos envolvidos. Por aqui se vê a indispen-
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3 LARENZ, Karl. Derecho justo: fundamentos de ética jurídica. Tradução:
Luis Díez-Picazo. Madrid: Civitas, 2001, p. 74.
4 RIBEIRO, Op. Cit., p. 21.
sabilidade do pensamento da autodeterminação, apto, à partida,
porque valorativamente cunhado por aquela ideia fundante, a
traduzir as exigências que dela decorrem”.5
A autodeterminação, na área negocial, representa, assim, a
capacidade humana de auto-organização em sociedade, sempre
presente como uma funcionalidade da autonomia privada.
Assim, os conceitos de autonomia privada e manifestação de
vontade estão relacionados ao conceito de negócio jurídico.
13.2 Teorias
Na dogmática jurídica, como dito inicialmente, continua
controvertida a conceituação do negócio jurídico. Vejamos,
pois, as suas principais teorias: a voluntarista, a objetiva, a estru-
turalista e da autorresponsabilidade.
13.2.1 Corrente voluntarista
Para a corrente voluntarista, o negócio jurídico é a manifes-
tação de vontade da pessoa com o intuito de atingir determina-
dos efeitos jurídicos, ou seja, é uma manifestação de vontade vi-
sando constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica. É
a posição mais tradicional na doutrina brasileira que relaciona o
conceito de negócio jurídico com o ato de vontade. Uma das ra-
zões é o teor do artigo 81 do Código Civil de 1916 que afirmava:
“Todo o ato lícito, que tenha por fim imediato adquirir, resguar-
dar, transferir, modificar ou extinguir direitos, se denomina ato
jurídico”. O Código Civil de 1916 tratava o negócio jurídico
como espécie de ato jurídico.
CLÓVIS BEVILÁQUA ao comentar o referido artigo 81 do
Código Civil de 1916 anota que “o ato jurídico deve ser confor-
me a vontade do agente e as normas de direito. É toda a manifes-
tação de vontade individual, a que a lei atribui o efeito de movi-
mentar as relações jurídicas”.5
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5 BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil comen-

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