Falência e recuperação de empresas

AutorSuhel Sarhan Júnior
Ocupação do AutorAdvogado. Mestre em Direito pelo Unisal - Lorena. Pós-graduado em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
Páginas315-404
Capítulo XVIII
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS
O Direito Falimentar e Recuperacional, disciplinados pela Lei n.
11.101/05, mostra-se como fundamental para a manutenção da atividade
empresarial que passa por crise, mas que ainda é viável ou mesmo como ins-
trumento de diminuição de riscos e proteção aos credores no caso de possí-
vel encerramento da empresa.
Por isso, estudar a atividade empresarial que passa por crise, bem como
conhecer os institutos que a ela poderão ser aplicados, é tarefa que se mostra
precípua no Direito, haja vista que, tais situações afetarão relações com cre-
dores trabalhistas, fiscais, fornecedores, instituições financeiras, consumi-
dores, entre outros. Enfim, trata-se de ramo interligado com outras discipli-
nas do Direito (Trabalhista, Fiscal, Consumerista, Cível e Bancário).
Tal estudo pormenorizado torna-se ainda mais importante pela atual
conjuntura econômica pela qual passa o Brasil, aonde vivemos um cenário de
recessão, com aumento do desemprego no setor privado, principalmente na
indústria de transformação, que vem sofrendo com a diminuição de sua pro-
dução e consequente baixa nos lucros, o que fez crescer, em especial no ano
de 2015, o número de pedidos de Recuperação Judicial e, também, de de-
cretação de Falências no Poder Judiciário.
Como dito, a Falência e a Recuperação não só se mostram importantes
para estudiosos ou operadores do Direito que militam na área, mas a toda a
coletividade de profissionais, haja vista que interferirá nas mais diversas
áreas do mundo jurídico.
Assim, antes de se estudar os institutos que podem ser aplicados para a
atividade empresarial em crise, importante esclarecer os motivos pelos quais
há uma legislação específica para regê-la em momentos desfavoráveis.
O questionamento inicial é: por que o legislador dispensou atenção es-
pecial para a empresa em crise, elaborando institutos específicos, que até
poderão beneficiá-la e de forma contrária não deu a mesma importância
para as pessoas físicas ou demais pessoas jurídicas não empresárias em cri-
se?
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A resposta é simples e objetiva: A empresa, exercida em forma indivi-
dual ou em sociedade, é importante instrumento de fomento da economia,
haja vista que a maior parte da mão – de – obra brasileira é absorvida por ela,
o que implica dizer que quanto mais empresas existirem maior será a contra-
tação de trabalhadores o que, por consequência, quanto mais pessoas empre-
gadas tivermos, mais consumidores estarão nas ruas comprando o que, por
fim, acarretará na necessidade da empresa contratar mais trabalhadores.
Enfim, a empresa movimenta o ciclo da economia, de forma que sua cri-
se pode gerar impactos enormes para toda uma região, um Estado ou até
mesmo ao País, em virtude do efeito cascata, explico.
Em São José dos Campos, interior de São Paulo, situam-se algumas in-
dústrias, que atuam em diversas áreas, desde a construção e comercialização
de aeronaves militares e comerciais até produtos de alimentação. Algumas
delas chegam a contratar cerca de vinte mil funcionários diretos, ou seja, se
multiplicarmos esse dado pelo número de pessoas que dependem desses
funcionários, caso alguma delas feche, serão oitenta mil pessoas em São José
dos Campos que perderão seu poder de compra.
Isso implica dizer que são consumidores que deixarão de gastar no co-
mércio, tirarão seus filhos do curso de inglês, não comprarão mais carros e
até entrarão nos supermercados, mas apenas para comprar produtos de ne-
cessidade básica.
Dessa forma, o comércio de São José dos Campos venderá menos e com
isso começará a demitir. Isso, sem contar, que esta fábrica que fechou, pro-
vavelmente, compra peças de fábricas terceirizadas e deixará de comprar e,
com isso, mais demissões virão. Ela pode contratar serviços de consultoria e
deixará de contratar e com isso mais demissões virão.
Enfim, o efeito é cascata e pode se alastrar para diferentes setores da
economia. Por isso, preocupou-se o legislador em reger a empresa em crise
e não deu essa mesma importância para as demais179.
A legislação que se aplica para reger a empresa em crise é a Lei n.
11.101/05, conhecida como Lei de Falência e de Recuperação de Empre-
sas. Até o ano de 2005, a empresa em crise era regida pelo Decreto n.
7.661/45.
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179 A atividade empresarial afeta o mercado e a sociedade. O modo de produção eco-
nômica, no sistema capitalista, é determinante das demais instâncias sociais. Por isso, o
interesse de agir nos processos regidos pela LRE reside na necessidade de um provimen-
to judiciário para deslindar não só a crise econômico-financeira de um empresário, mas
toda espécie de relações daí decorrentes e suas repercussões sociais.
A preservação da atividade negocial é o ponto mais delicado do regime jurídico de
insolvência. Só deve ser liquidada a empresa inviável, ou seja, aquela que não comporta
uma reorganização eficiente ou não justifica o desejável resgate (FAZZIO JUNIOR,
Waldo. Manual de Direito Comercial.16ed. São Paulo: Atlas, 2015, p. 596).
Atualmente dois institutos podem ser aplicados: Falência ou Recupera-
ção de Empresas. A recuperação, por sua vez, poderá se dar de forma judicial
ou extrajudicial.
Importante consignar que, muito embora sejam dois institutos previstos
na mesma lei e que se aplicam para a empresa em crise, são autônomos e
independentes entre si. Não há a necessidade de se recuperar a empresa para
só depois aplicar-lhe a falência, em absoluto: A falência pode se dar direta-
mente.
É bem verdade, como se verá, que em muitos casos tenta se recuperar a
empresa, restando-se infrutífera a tentativa, decreta-se a falência, mas não
que isso seja uma obrigação.
Assim, por serem institutos autônomos, previstos na mesma lei e que se
aplicam a empresa em crise, como saber se aplicar a recuperação ou a falên-
cia? A resposta será dada no decorrer da obra. Todavia, de início, a resposta
é a clássica do Direito: depende.
Dependendo do estágio da crise da atividade empresarial aplica-se a fa-
lência ou a recuperação, exemplifico.
Imagine um restaurante localizado na cidade de Ubatuba – SP, litoral
norte do Estado de São Paulo. Cidades litorâneas são conhecidas por serem
sazonais, ou seja, há fluxo grande de pessoas em determinada época do ano
e em outros não. Imagine, dessa maneira, que nos meses de maio, junho, ju-
lho, agosto e setembro, tal restaurante devido ao baixo movimento não con-
seguiu pagar alguns funcionários, não cumpriu com todos os impostos e pos-
sui dívidas de esfera civil, principalmente decorrente do contrato de locação
do ponto comercial. É evidente que essa empresa está passando por crise,
mas os sócios sabem que dezembro irá chegar, que terá virada de ano, férias
escolares e carnaval. Enfim, sabem que a maré irá melhor. Veja que essa em-
presa passa por crise, mas ainda é viável. Assim, deve ser concedida a recu-
peração.
Por outro lado, há crises em que a situação é mais drástica, ela já se agra-
vou de determinada maneira que, praticamente o passivo da empresa já su-
perou seu ativo. Em tais situações, outra solução não se vislumbra senão o
encerramento das atividades por meio do procedimento falimentar.
1. Causas da Crise
A crise empresarial não pode ser analisada sob um viés, pois seria tratá-la
de forma simples e abstrata, mostrando-se mais complexa que isso.
Primeiro, existem fatores externos e internos que podem afetar a ativi-
dade empresarial. Na maior parte das vezes, tentam associá-la a má gestão de
seus administradores, sócios ou diretores, imputando a eles práticas equivo-
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