O impacto da nova LINDB no julgamento de ações de improbidade administrativa pelos Tribunais Regionais Federais: a Lei no 14.230/2021 era mesmo necessária?

AutorHeloísa Conrado Caggiano/Paula Silva Martins
Ocupação do AutorDoutoranda e Mestre em Direito da Regulação pela FGV Direito Rio/Mestranda em Direito da Regulação pela FGV
Páginas192-246
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Transformações do Direito Administrativo:
Debates e Estudos Empíricos em Direito Administrativo e Regulatório
O impacto da nova LINDB no julgamento
de ações de improbidade administrativa
pelos Tribunais Regionais Federais: a Lei no
14.230/2021 era mesmo necessária?
Heloísa Conrado Caggiano320
Paula Silva Martins321
Resumo
Este artigo pretende verificar se e como os dispositivos da Lei
no 13.655/2017, que alteraram a Lei de Introdução às Normas do
Direito Brasileiro (LINDB), vêm sendo aplicados pelos Tribunais
Regionais Federais, enquanto instância recursal, no julgamento de
mérito de ações de improbidade administrativa, a confirmar a ne-
cessidade da recente reforma da Lei de Improbidade Administrativa
pela Lei no 14.230/2021.
Palavras-chave: Administração Pública; Controle Judicial; Improbi-
dade Administrativa; LINDB.
Introdução
O objetivo deste artigo é analisar como os Tribunais Regionais
Federais, ao julgar o mérito de ações de improbidade administrativa
enquanto instância recursal, têm aplicado as alterações promovi-
das pela Lei no 13.655, de 25.04.2018, ao Decreto-lei no 4.657, de
04.09.1942 (LINDB), a confirmar a necessidade da recente refor-
ma da Lei de Improbidade Administrativa, promovida pela Lei n
o
14.230/2021.
A LINDB consiste em um conjunto de norma gerais que orien-
tam a interpretação e aplicação das normas de direito privado e
320 Doutoranda e Mestre em Direito da Regulação pela FGV Direito Rio. Especialista em Direito
Tributário pelo IBET (2013). Formação em Direito Administrativo Contratual (2012) e em Ar-
bitragem (2018) pela FGV/SP, e em Finanças e Contabilidade pela Lisbon School of Business
and Economics (2014). Sócia do Xavier Vianna, Bockmann Moreira, Caggiano, Ramos, desde
2016. Bacharel em Direito pela UFPR (2009). E-mail: heloisacaggiano@hotmail.com.
321 Mestranda em Direito da Regulação pela FGV. Pós-graduada em Direito Tributário pela FGV
(2015). Graduada em Direito pela FGV (2012). Associada de Ulhoa Canto, Rezende e Guerra
– Advogados, desde 2013. E-mail: paula.martins@fgv.edu.br.
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O impacto da nova LINDB no julgamento de ações de improbidade administrativa
pelos Tribunais Regionais Federais: a Lei no 14.230/2021 era mesmo necessária?
de direito público. Especificamente quanto ao direito público, em
2018, o Decreto sofreu alterações pela Lei no 13.655/2018, que a ele
acrescentou 11 artigos (arts. 20 a 30) visando a conferir maior segu-
rança jurídica e eficiência na criação e aplicação de normas jurídicas.
Segundo consta da Justificativa do Projeto de Lei que deu ori-
gem à Lei no 13.655/2018 (PLS no 349/2015), o objetivo era o de
estabelecer “novas balizas interpretativas, processuais e de con-
trole a serem seguidas pela administração pública federal, estadual
e municipal”, alinhadas aos desafios contemporâneos da ação do
Poder Público.322
As alterações implementadas partiram de perspectiva pragmá-
tica da atuação administrativa, pretendendo enfrentar dificuldades e
desafios concretos da interpretação e aplicação do direito público.
Com isso, seria aprimorada tanto a atuação dos gestores públicos
(conferindo-lhes maior segurança jurídica na tomada de decisões)
como a dos órgãos de controle da Administração.
Dentre os problemas enfrentados estavam, nas palavras dos
autores do Projeto, o alto grau de indeterminação de normas pú-
blicas; a relativa incerteza quanto ao conteúdo de cada norma; a
tendência à superficialidade na formação do juízo sobre questões
jurídico-públicas complexas; a instabilidade dos atos jurídicos pú-
blicos ante o risco de invalidação pelas instâncias de controle; o
modo autoritário como, de usual, são concebidas e editadas nor-
mas pela Administração Pública, dente outros.323
Diante deste contexto é que a Lei no 13.655/2018 previu, por
exemplo, no caput do art. 20 da LINDB, a vedação a que, nas esfe-
ras administrativa, controladora e judicial, sejam tomadas decisões
com base em valores jurídicos abstratos. Especificamente sobre de-
cisão que determinar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processos
ou normas administrativas, o art. 21, caput, da LINDB estabeleceu
322 BRASIL, Senado Federal. Projeto de Lei: PLS no 349/2015. Inclui, na Lei de Introdução às Nor-
mas do Direito Brasileiro (Decreto-lei no 4.657, de 1942), disposições sobre segurança jurídica
e eficiência na criação e aplicação do direito público. Disponível em: https://legis.senado.leg.
br/sdleg-getter/documento?dm=4407647&ts=1593913219661&disposition=inline. Acesso em:
28 jun. 2021.
323 SUNDFELD, Carlos Ari. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Contratações públicas e seu
controle. São Paulo: Malheiros, 2013. p. 278.
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Transformações do Direito Administrativo:
Debates e Estudos Empíricos em Direito Administrativo e Regulatório
o dever de se indicar expressamente as consequências jurídicas e
administrativas da decisão.
Indo além, o art. 22 estabeleceu o dever de todo e qualquer
agente, ao interpretar as normas sobre gestão pública, considera-
rem os obstáculos e dificuldades reais do gestor e as exigências de
políticas públicas ao seu cargo. E o art. 28 da LINDB limitou os ca-
sos de responsabilidade pessoal de agentes públicos, por decisões
ou opiniões técnicas, a casos de dolo ou erro grosseiro, excluindo
a hipótese de culpa.324
Estes exemplos permitem cogitar da relação e relevância da
LINDB para o julgamento de ações de improbidade administrativa
(Lei no 8.429/1992 – LIA).
As ações de improbidade são importante instrumento de con-
trole judicial da atuação administrativa. Visam a sancionar agentes
públicos em casos de comprovado enriquecimento ilícito, prejuízo
ao erário e violação aos princípios da Administração Pública, nos
termos dos arts. 9o a 11 da LIA.
Em síntese, permitem que o Judiciário, quando provocado,
avalie aspectos objetivos e subjetivos da atuação de agentes pú-
blicos, visando à aplicação de sanções que vão desde a perda de
bens acrescidos ao patrimônio do agente em decorrência do ato,
até o ressarcimento de dano, perda de função pública, suspensão
de direitos políticos, dentre outros (art. 12 da LIA). Isso indepen-
dentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas
em lei específica.
Nada obstante o rigor das penalidades previstas, a análise dos
tipos de improbidade administrativa previstos na Lei (arts. 9o a 11, e
incisos) revela a amplitude das hipóteses de atuação administrativa
passíveis de controle, a saber: a) atos que importem enriquecimento
324 Para uma análise específica dos dispositivos introduzidos pela Lei no 13.655/2018 na LINDB,
vide FALCÃO, Joaquim; GUERRA, Sérgio (Coord.). Revista de Direito Administrativo – RDA,
Edição Especial da Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, out. 2018, ano 2012, dis-
ponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/issue/view/4255. Acesso em: 28
jun. 2021; MARQUES NETO, Floriano de Azevedo,FREITAS, Rafael Véras. Comentários à lei no
13.655/2018. 1. ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2019;e VALIATI, Thiago Priess, HUNGARO,
Luis Alberto e MORRETTINI E CASTELLA, Gabriel. A lei de introdução e o direito administra-
tivo brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019.

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