Liberdade de expressão e arquitetura de escolhas: um 'empurrão' em direção a redes mais sociais

AutorVinicio Guimarães Salvarezza
Ocupação do AutorProcurador do Município de Niterói. Mestrando em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
Páginas472-499
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Transformações do Direito Administrativo:
Debates e Estudos Empíricos em Direito Administrativo e Regulatório
Liberdade de expressão e arquitetura
de escolhas: um “empurrão” em direção
a redes mais sociais
Vinicio Guimarães Salvarezza762
Resumo
O presente artigo parte dos ensinamentos da ciência compor-
tamental para sustentar o uso de nudges como solução preferencial
para a regulação do exercício da liberdade de expressão nas redes
sociais, visto que consentâneo com a natureza preferencial prima
facie da liberdade de expressão e a regra do art. 19 do Marco Civil
da Internet. Desse modo, é apresentado em um primeiro momento
a base teórica e normativa para defesa da regulamentação das ar-
quiteturas de escolhas orientada pelos algoritmos dos provedores
de redes. Após, serão enunciados alguns exemplos de nudges pro-
missores e compatíveis com ordenamento pátrio, cujo uso poderia
ser incentivado para reduzir a circulação de fake news nas redes,
sem prejuízo da enumeração de algumas das limitações da abor
-
dagem proposta.
Palavras-chave: Regulação; Liberdade de Expressão; Redes So-
ciais.; Vieses; Nudges.
Introdução
Em um contexto marcado pela profunda alteração da esfera
pública,
763
até então dominada por meios de comunicação, como
livros, jornais, periódicos, rádio, televisão, um espaço cada vez mais
762 Procurador do Município de Niterói. Mestrando em Direito Público pela Universidade do Es-
tado do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: viniciosalvarezza@gmail.com.
763 O termo esfera pública é vago, mas uso aqui o conceito de Thomas Vesting que, aproximan-
do-se das lições de Habermas sobre esfera pública, a define como o surgimento de uma
determinada cultura, que estabiliza a forma como a informação política e social se constitui
e dissemina dentro de um Estado. Há, primeiramente, a cultura das grandes cidades e agora,
cada vez mais, entramos na era da esfera pública das redes computacionais (Cf. VESTING,
Thomas. A mudança da esfera pública pela inteligência artificial. In: ABBOUD, George; NERY
JÚNIOR, Nelson; CAMPOS, Ricardo (Orgs.). Fake news e regulação. Coleção Direito e Trans-
formação. São Paulo: Thomson Reuters, Revista dos Tribunais, 2018. p. 193-212. Tradução de
Pedro Henrique Ribeiro e Revisão de Júlio Carvalho.)
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Liberdade de expressão e arquitetura de escolhas: um “empurrão”
em direção a redes mais sociais
digital, no qual todos se tornam ao mesmo tempo transmissores
e receptores da informação, surge e, com ele, amplia-se cada vez
mais o número de propostas regulatórias, que incentivam o moni-
toramento e a retirada de conteúdos fraudulentos (fake news) das
redes sociais.
Diante das críticas de que estas propostas regulatórias incen-
tivariam a denúncia de conteúdo, inclusive lícito,764 acarretando
um efeito amedrontador (chilling effect) ao exercício natural do
direito de liberdade de expressão, este artigo cogita opções regu-
latórias possíveis e menos intrusivas às liberdades fundamentais,
com foco na capacidade de certas arquiteturas de escolhas apro-
ximarem as redes sociais de um ideal de espaço público de debate
democrático pautado por transparência e razões eminentemente
públicas. Consequentemente, um ambiente mais transparente e
com mais pontos de contato entre os usuários da rede reduziria sua
suscetibilidade às famigeradas notícias fraudulentas (fake news).
De modo mais específico, busca-se a partir das premissas gerais
da ciência comportamental, discutir em que medida nudges (“cutu-
cão” ou “empurrãozinho” em tradução livre) podem ser utilizados
como instrumento regulatório preferencial do debate público no âm-
bito das redes sociais, explorando suas potencialidades e limitações.
A pesquisa, do tipo exploratório, parte de premissas teóricas bá-
sicas da ciência comportamental e busca justificar o uso de nudges
como opção regulatória preferencial à luz do contexto normativo-na-
cional e de precedentes dos Tribunais Superiores, especialmente
sobre liberdade de expressão. Para tanto, foram analisadas a biblio-
grafia especializada sobre a temática, legislação, decisões judiciais
e demais documentos oficiais.
O roteiro se desenvolve em três seções. Primeiro, abordam-se
noções gerais sobre o funcionamento de heurísticas e vieses e como
764 Logo após a vigência da lei alemã de regulação das redes sociais, a NetzDG, houve a polê-
mica retirada do Twitter da página de uma revista satírica alemã denominada TITANIC. Cf.
EIFERT, Martin. A lei alemã para a melhoria da aplicação da lei nas redes sociais (NetzDG) e
a regulação da plataforma In: ABBOUD, George; NERY JÚNIOR, Nelson; CAMPOS, Ricardo
(Orgs.). Fake news e regulação. Coleção Direito e Transformação. São Paulo: Thomson Reu-
ters, Revista dos Tribunais, 2018. p. 193-212. Tradução de Pedro Henrique Ribeiro.

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