Neoliberalismo, direito do trabalho e a subjetividade do trabalhador: perda de identidade, manipulação e flexibilização de normas

AutorIvan Simões Garcia e Jéssica Lima Brasil Carmo
Páginas205-225
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NEOLIBERALISMO, DIREITO DO TRABALHO E A
SUBJETIVIDADE DO TRABALHADOR:
PERDA DE IDENTIDADE, MANIPULAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO
DE NORMAS
Ivan Simões Garcia 1
Jéssica Lima Brasil Ca rmo2
Resumo: Sob o contexto neoliberal concretizado após a década de 1970,
a flexibilização do Direito do Trabalho orientou diversas reformas
promovidas no Brasil. As mudanças não se implementaram apenas em
nível normativo, mas sob a esfera subjetiva dos trabalhadores. A crise de
identificação da classe surge sob diversas roupagens, seja pela
disseminação do caráter do empreendedorismo, sob o discurso da
liberdade e da meritocracia, ou ainda pelos comportamentos que
caracterizam a “síndrome do patrão”. Os aspectos subjetivos então
desenhados, juntamente com as novas formas de contratação de
trabalhadores, desafiam um novo olhar sobre a subordinação jurídica e o
escopo de proteção das normas trabalhistas. Para o desenvolvimento
dessa pesquisa, objetivou-se, por meio do conceito de psicodinâmica do
trabalho de Christophe Dejours e da revisão bibliográfica crítica, revisitar
o conceito de subordinação jurídica, a doutrina que trata de
empreendedorismo e as formas de desconexão entre os trabalhadores e
sua identidade de classe.
1 Professor Associado de Direito do Trabalho da UERJ. Professor Adjunto de Direito do
Trabalho da UFRJ. Professor da PUC-RJ e do IBMEC-RJ. Membro permanente do
Programa de Pós-graduação em Direito (PPGD) da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro e do Programa de Mestrado em Direito da Universidade Candido Mendes. Doutor
em Direito do Trabalho (PUC-SP). Doutor em Filosofia (UFRJ). Mestre em Direito
Constitucional e Teoria do Estado (PUC-RJ). Pó s-graduado em Direito e Processo do
Trabalho (PUC-RJ). Advogado. E-mail: pr ofessorivangar cia@gmail.com. ORCID 0000-
0001-5639-086X
2 Doutoranda em Direito Processual (PPGD/UERJ), Mestre em Direito do Trab alho e
Previdenciário (PPGD/UERJ), Especialista em Direito Processual Civil e do Trabalho
(UVA), Bacharel em Direito (UERJ), Advogada e Professora. E-mail:
adv.jessica.bra sil@gmail.com
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Palavras-chave: psicodinâmica do trabalho, subjetividade,
flexibilização, neoliberalismo.
Introdução
A lógica capitalista das cinco últimas décadas (a contar
especialmente dos anos 70 do século XX), parece ter como pressuposto e
instrumento a cultura do aprofundamento3 das premissas de precarização
do trabalho (ANTUNES, 2009), do curto tempo de duração das relações
de trabalho e do despedimento dos empregados além de
questionamentos sobre a configuração e constituição do próprio trabalho
subordinado.
No que concerne à formação de um processo cultural (para além
da sua vinculação à conjuntura econômica e política) de estímulo ao
desemprego, Delgado (2017, p. 68) destaca que este é um “instrumento
cultural no processo de combate ao primado do trabalho e do emprego no
sistema capitalista contemporâneo.”
O desenvolvimento dessa pesquisa se realizou em algumas
etapas, sendo a primeira delas com o enfrentamento da crise da
subordinação jurídica. Na sequência, objetiva-se abordar a síndrome do
patrão e a perda da identificação de classe. Por fim, o escopo é encarar o
fenômeno da contratualização, o empreendedorismo e a ideologia da
liberdade como finalidade das relações de trabalho e todos os aspectos
subjetivos que impactam as relações de trabalho.
Para a compreensão dos impactos de tais ideologias na
subjetividade dos trabalhadores, é importante destacar que a formação da
subjetividade, pela saúde mental dos trabalhadores e o sofrimento no
ambiente de trabalho, perpassa pelo conceito de psicodinâmica do
trabalho aspecto desenvolvido por Dejours (2004) e que auxilia na
compreensão dos pontos abordados nessa pesquisa, como referencial
teórico.
Assim, a psicodinâmica do trabalho é responsável pelas análises
da dimensão psicossocial do sujeito no trabalho, a partir da constituição
3 A precarização das relações de trabalho não é fenôme no novo, tampouco surgindo a
partir dos movimentos de flexibilização do trabalho e das formas de labor. Sobre a
temática, Cf. CARDOSO, Adalberto.

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