Estado social e indústria 4.0: a ordem constitucional econômica e o direito ao trabalho no século XXI

AutorGuilherme Guimarães Feliciano, Filipe Piazzi Mariano da Silva e Lilian Fernanda Toso
Páginas135-181
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ESTADO SOCIAL E INDÚSTRIA 4.0:
A ORDEM CONSTITUCIONAL ECONÔMICA E O DIREITO AO
TRABALHO NO SÉCULO XXI
SOCIAL STATE AND INDUSTRY 4.0:
CONSTITUTIONAL ECONOMIC ORDER AND THE RIGHT TO WORK IN THE 21ST
CENTURY
Guilherme Guimarães F eliciano1
Filipe Pia zzi Mariano da Silva2
Lilian Ferna nda Toso3
Resumo: O artigo lança um olhar crítico e prospectivo sobre o fenômeno
da quarta revolução industrial e os seus impactos econômicos e sociais na
sociedade globalizada a partir da matriz jurídico-constitucional e de seu
programa econômico, que estabelece o primado do trabalho e da
educação como princípios basilares. Nesse encalço, discute-se como
normas constitucionais estabelecidas no século passado podem ser
compatíveis e não, ao revés, incongruentes com a realidade
econômica e social de um Estado social no século XXI.
1 Professor associado II do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social
da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Doutor em Direito Penal pela USP
e em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Livre-docente em Direito do Trabalho pela USP. Juiz titular da 1.ª Vara do Trabalho de
Taubaté. Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Just iça do Trabalho
(Anamatra), gestão 2017-2019. Titular da Cadeira n. 53 da Academia Brasileira de Direito
do Trabalho. E-mail: darkggf@usp.br
2 Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana M ackenzie e
Especialista em Direito Tributário também pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Advogado em São Paulo. Professor da Faculdade de Direito do Centro Universitário
Adventista de São Paulo das disciplinas de Direito Econômico, Direito Constitucional
Ordem Tributária, Econômica e Social, e Direito Eleitoral. Tem experiência na área de
Direito Público, com ênfase no Direito Tributário, Direito Econômico e Direito
Financeiro.
3 Advogada em São Paulo.
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Palavras-chave: 1. Indústria 4.0. 2. Quarta revolução industrial. 3.
Direito ao trabalho. 4. Estado social.
Abstract: The article takes a critical and prospective look at the
phenomenon of the fourth industrial revolution and its economic and
social impacts on the globalized society from the legal-constitutional
matrix and its economic program, which establishes the primacy of the
labor and the education as basic principles. In this vein, we discuss how
constitutional norms established in the last century may be compatible
and not, in reverse, incongruent with the economic and social reality of
a social State in 21st century.
Keywords: 1. Industry 4.0. 2. Fourth industrial revolution. 3. Right to
work. 4. Social state.
Sumário: Introdução. 1. Objetivos. 2. Metodologia. 3. Resultados e
Discussões. 3.1 A Quarta Revolução Industrial e o Surgimento da
Indústria 4.0. 3.2 A Indústria 4.0 e o Futuro do Trabalho e da Educação.
3.3 Direito ao Trabalho e à Educação na Ordem Constitucional de 1988.
3.4 O Texto Constitucional à Mercê da Realidade da Indústria 4.0. 3.5 O
Art. 7º, XXVII, da CRFB e a Proteção contra a Automação.
Considerações finais. Referências.
Introdução
Com o irromper do século XXI, tornou-se recorrente o debate em
torno dos possíveis efeitos da virtualização/digitalização das relações
humanas na tessitura da sociedade contemporânea. No campo do
desenvolvimento da atividade econômica, igualmente tal debate se faz
presente, sobretudo a se considerarem as implicações sociais de um
período que alguns autores designam como quarta revolução
industrial. Sob tal cenário, desenvolve-se o presente estudo, voltado à
compreensão crítica das possíveis intervenções do Estado no domínio
econômico para conciliar os direitos fundamentais clássicos e as novas
realidades cambiantes.
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Numa primeira hipótese, é relativamente fácil colacionar
argumentos que deem sustentabilidade a posicionamentos favoráveis e
desfavoráveis acerca da problemática aqui suscitada, destacando-se,
como exemplo, a previsão estabelecida no art. 1.º da Constituição da
República de 1988, que resguarda a proteção aos valores sociais do
trabalho como fundamento do Estado brasileiro e parece justificar, por si
, a promoção de políticas sociais e micro/macroeconômicas que
atendam a tal comando no contexto econômico e social atualmente
vivido. De outro giro, deve-se ter em conta o dirigismo característico do
texto constitucional, que pode sugerir amarras, tanto para o legislador
infraconstitucional quanto para os representantes do poder executivo, no
que se refere à aplicação de programas que visem adequar a
normatividade da Constituição de 1988 principalmente quando se trata
da intervenção do poder público no domínio econômico às novas
realidades, próprias do século XXI. Assim, p. ex., com que liberdade o
Poder Legislativo poderia (re)moldar as estruturas jurídicas que regulam
a empresa e o emprego às necessidades vivenciadas no presente século,
marcado pela revolução digital no processo produtivo? Ou ainda (o que é
o mesmo): quais os limites razoáveis de alargamento e/ou de flexão da
literalidade dos textos constitucionais e legais, em, matéria de emprego e
proteção social, na perspectiva da chamada “capacidade de
aprendizagem” das normas constitucionais?
É, pois, a partir dessa tensão teorética que se desenvolve o
presente estudo, considerando que os contornos sociais provocados pela
revolução digital experimentada no século XXI deverão ser considerados
no plano do financiamento e da proteção dos direitos sociais
estabelecidos constitucionalmente, sob pena de retrocesso, seja este
social, seja ele econômico (sendo certo que, a rigor, são mesmo
indissociáveis entre si).
Voilá.
1. Objetivos
O presente estudo propõe uma releitura crítica das possibilidades
do Direito Social e notadamente do Direito do Trabalho à vista das

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