A régua de lesbos no direito criminal

AutorJoão Carvalho de Matos
Páginas49-135
PRÁTICA E TEORIA DO DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL 49
A RÉGUA DE LESBOS NO DIREITO CRIMINAL
(Aristóteles comparava a eqüidade à “REGUA DE LESBOS”, régua
especial de que se serviam os operários para medir certos blocos de
granito; por ser feita de metal flexível, podia ajustar-se às irregularidades do
objeto: “a régua adapta-se à forma da pedra e não é rígida, exatamente
como o decreto se adapta aos fatos”.” Flexível como a régua de Lesbos, a
eqüidade não mede apenas aquilo que é normal, mas também as variações
e curvaturas inevitáveis da experiência humana}.
Diferente não é o Direito!
A atividade do legislativo x O trabalho do judiciário
(Aqui o Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, no votos vista ao
Resp nº 112.600/DF: afirmou existir profunda distinção entre a lei e o
Direito. Ele toma a lei como norma jurídica de extensão limitada. O Direito,
ao contrário, sistema de princípios que orientam e vinculam as normas
jurídicas, incluindo, portanto, também a lei.)
Eis, o voto:
“Do voto da lavra do Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, no
Recurso Especial nº 112.600/DF, extraímos: (...) Ninguém discorda,
há profunda distinção entre a – lei – e o Direito. Para orientar minha
JOÃO CARVALHO DE MATOS
50
posição, tomo a lei como norma jurídica de extensão limitada. O
Direito, ao contrário, sistema de princípios que orientam e vinculam
as normas jurídicas, incluindo, portanto, também a lei.
A lei desvinculada dos princípios enseja raciocínio formal, vazio de
conteúdo. Nessa linha colocam-se a escola da Exegese e a orientação
técnica jurídica, esta conhecida pela afirmação de Rocco que a filosofia
deveria ser deixada para os filósofos e a Sociologia para os sociólogos,
devendo o jurista preocupar-se somente com a norma jurídica.
Essas colocações próprias do positivismo ortodoxo durante muito
tempo vigoram nas Faculdades. Daí, até há pouco tempo, ouvia-se afirmações
como esta:
“O legislador faz a lei; o magistrado aplica lei”. Se a lei for
injusta, dizia o magistrado, devo aplicá-la, até que o legislador a
modifique, ou: “a lei é injusta, mas aplico a lei!”
Continuando, afirma o Ministro:
“As conclusões da Criminologia moderna, o reconhecimento
da Política Criminal estão mudando esse modo de pensar.
O Direito vai ganhando nova concepção. O Direito está
deixando de ser concebido como fim para ser recepcionado como
meio. Meio para concretizar valores. A decisão judicial não é neutra:
é axiológica, teleologicamente orientada. O juiz, então está deixando
de ser o “aplicador da lei”, para ser o crítico da lei.”
O juiz, na sua grandeza institucional, é, na verdade um agente políti-
co. Como tal, atua na realidade social. É, por isso, insta-se, o crítico da lei.
Cumpre, para bem delimitar o parâmetro, esclarecer:
A atividade do legislativo não se confunde com o trabalho do
judiciário. O primeiro elabora as leis. O Segundo tornando-a como expressão
do Direito. O Direito, como valor, não é feito pelo legislador. O legislador,
integrante da sociedade, com sensibilidade, elabora as normas, e o magis-
trado também no contexto social, faz a crítica do Direito em função do caso
PRÁTICA E TEORIA DO DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL 51
concreto. E aplica as normas que respondam ao contexto axiológico que
nasce e se impõe na sociedade. Muitas vezes, sociedade ganha extensão
internacional, como acontece com os Direitos Humanos.
Hoje, não se pode desenvolver nenhum raciocínio jurídico despre-
zando a Declaração dos Direitos Humanos e, ainda mais próximo de nós,
o Pacto de San J. da Costa Rica, subscrito pelo Brasil e formalizado pela
Câmara dos Deputados.
O juiz, assim, insista-se, agente político, assume importante papel,
notadamente no campo penal. Onde se encontram as sanções jurídicas
mais severas....
O acórdão, em comento, teve seu desfecho com a concessão de
“perdão judicial”, há dois condenados, por crime de furto. Como é sabido,
pela nossa legislação, não há perdão judicial em crimes dolosos de ação
pública incondicionada.
Ementa:
“RESP - PROCESSO PENAL - EXECUÇÃO DA PENA - O
art. 59 do CP indica o sentido, a finalidade da pena: “necessária e
suficiente para reprovação e prevenção do crime”. Assim, se não
reprovável a conduta (v.g. princípio da insignificância para a corrente
doutrinária que o tem como mera exclusão de culpabilidade, embora
melhor, pela estrutura do delito, dizer - exclusão de tipicidade) e não
se fizer necessária porque dispensável no caso concreto, o magistra-
do poderá deixar (deverá fazê-lo) de aplicar a pena. O Direito Penal
moderno não se restringe a raciocínio de lógica formal. Cumpre
considerar o sentido humanístico da norma jurídica. E mais. Toda lei
tem significado teleológico. A pena volta-se para a utilidade.”
Antonio Bento Betioli, em sua obra Introdução ao Direito, lições de
propedêutica jurídica, Editora Letras & Letras, 1995, São Paulo, 4ª edição
atualizada, p. 348/350, escrevendo sobre A EQÜIDADE, COMO A
JUSTIÇA NO CASO CONCRETO, ESCREVE:
“(...)

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT