A tutela penal do direito à proteção de dados pessoais

AutorCecilia Choeri da Silva Coelho
Páginas329-353
329
A TUTELA PENAL DO DIREITO À PROTEÇÃO
DE DADOS PESSOAIS
Cecilia Choeri da Silva Coelho1
Sumário: 1. Introdução. 2. O direito fundamental à proteção de dados.
3. O papel do direito penal na proteção de dados pessoais. 4. O
tratamento de dados pessoais no âmbito da segurança pública e de
atividades de persecução e repressão de infrações penais. 4.1. A
experiência europeia. 4.2. O tratamento de dados por particulares em
atividades de prevenção e repressão ao crime. 5. Referências
bibliográficas.
Palavras-chave: Proteção de dados segurança pública processo
penal.
1. Introdução
Em setembro de 2020, entrou em vigor no Brasil, a Lei n.
13.709/2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD),
seguindo uma tendência mundial de normatização do uso de dados
pessoais pelas empresas e pessoas em atividades econômicas, a fim de
proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre
desenvolvimento da personalidade das pessoas naturais. A Lei
estabelece uma série de princípios que devem orientar o tratamento de
dados pessoais (entendido como toda operação realizada com dados
1 Doutoranda em mestre em Direito Penal pela Univ ersidade do Estado do Rio de
Janeiro (Uerj). Pesquisado ra do Centro de Pesquisa em Crimes Empresariais e
Compliance Prof. João Marcello de Araújo Jr (CPJM-Uerj). Ad vogada com atuação
em Proteção de Dados.
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pessoais, como a sua coleta, armazenamento, classificação,
transferência etc2), bem como regras para que seja considerado lícito.
Quanto ao seu sistema de responsabilidade, este foi concebido
de forma dualista, tendo sido prevista a responsabilidade administrativa
e civil dos agentes de tratamento de dados. A primeira decorre do
descumprimento dos seus dispositivos e a segunda, dos danos causados
pelo tratamento inadequado dos dados. As sanções administrativas
podem variar da mera advertência até multa de R$50 milhões por
infração. Já o ressarcimento pelos danos causados na esfera civil é
medido em razão da extensão do dano (artigos 42 e 42, da LGPD).
Embora a LGPD deva ser observada também pelas pessoas
jurídicas de direito público que tratam dados pessoais, o legislador
expressamente excepcionou sua aplicação, dentre outras hipóteses, ao
tratamento de dados pessoais realizado para fins exclusivos de
segurança pública, defesa nacional, segurança do Estado ou atividades
de investigação e repressão de infrações penais (artigo 4º, III, da
LGPD). O compartilhamento de dados entre autoridades brasileiras e
também de outras países é uma das principais e mais eficientes formas
de cooperação para combate ao crime e vem aumentando enormemente
nos últimos anos, especialmente com o avanço das tecnologias de
vigilância e controle da população. As particularidades envolvidas
nessas atividades de tratamento de dados e os riscos relacionados à
possibilidade de uso abusivo dessas tecnologias não foram
desconsideradas pelo legislador, que determinou que lei específica trate
sobre o assunto por meio de medidas proporcionais e estritamente
necessárias ao atendimento do interesse público, observados o devido
processo legal, os princípios gerais de proteção e os direitos do titular
previstos nesta Lei (artigo 4º, parágrafo 1º, da LGPD).
Além disso, a LGPD não trouxe a tipificação de crime visando
tutelar a privacidade e/ou proteção de dados pessoais, limitando-se,
como visto, a impor consequências administrativas e civis,
respectivamente, pelo descumprimento de seus dispositivos e pelos
danos decorrentes, e ressalvando, no art 52, § 2º, a possibilidade de

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