Alterações das Regras do Contrato de Trabalho

AutorFrancisco Meton Marques de Lima
Ocupação do AutorProfessor Titular da Universidade Federal do Piauí - UFPI. Doutor em Direito Constitucional pela UFMG.
Páginas57-75

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O contrato individual de trabalho sofreu sensíveis alterações, que flexibilizam o modelo anterior; cria o contrato de trabalho intermitente; reduz os itens da remuneração com natureza salarial; modifica a equiparação salarial e facilita a rescisão contratual. Para efeito didático, dividimos esse item em onze subitens.

19.1. Contrato de autônomo

Art. 442-B. A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação.

Amauri M. Nascimento resume: "Aqueles que detêm o poder de direção da própria atividade são autônomos e aqueles que alienam o poder de direção sobre o próprio trabalho para terceiros em troca de remuneração são subordinados".

Esse artigo objetiva esvaziar a pretensão dos trabalhadores que assinam contrato de autônomo e depois reivindicam os benefícios do vínculo de emprego. Essa prática é comum entre representantes comerciais, dentre outras categorias.

Mas não tem jeito. A relação de emprego define-se pelos fatos que configuram as suas características: pessoalidade da prestação do serviço, não eventuali-dade, subordinação hierárquica ao empregador e remuneração, conforme art. 3º da CLT, não revogado. É contrato-realidade. Estando presentes esses elementos, todo escrito em contrário não tem eficácia, por força do art. 9º da CLT, segundo o qual "Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação".

Além disso, contra a forma falsa opera o princípio da primazia da realidade, segundo o qual, havendo discrepância entre a forma e os fatos, prevalecem estes.

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Por fim, nenhum ato, seja de que origem for, ficará isento de apreciação pelo Poder Judiciário, conforme inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal, cláusula pétrea (§ 4º do art. 60, CF), que somente por outra Constituinte poderá ser revogado.

Concluindo, na prática, o dito do art. 442-B não terá eficácia alguma.

19.2. Contrato de trabalho intermitente de nição

Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado, ou para prestação de trabalho intermitente.

[...]

§ 3º Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria.

A alteração no caput se deu para incluir o trabalho intermitente ou por hora entre os contratos de trabalho.

E o § 3º foi acrescido para definir o contrato de trabalho intermitente.

Ver continuação no art. 452-A, que o regulamenta no caput e nove parágrafos.

19.3. Negociação individual equivalente à coletiva

Art. 444. [...]

Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.

O art. 468 da CLT veda a alteração contratual lesiva ao empregado, ainda que ele concorde.

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O art. 611-A foi acrescido pela Reforma para flexibilizar os direitos trabalhistas mediante negociação coletiva do trabalho, quebrando a rigidez do art. 468, fazendo prevalecer o negociado sobre o legislado. Assim dispõe o caput do art. 444:

Art. 444. As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.

Pois bem. Esse artigo ganhou um parágrafo com a lei da Reforma, para permitir que o trabalhador portador de diploma de nível superior, com remuneração igual ou superior a duas vezes o valor do maior benefício previdenciário (o valor do maior benefício previdenciário é R$ 5.531,31 a partir de 1º.1.2017) pode negociar individualmente, sem intervenção do sindicato, naquelas matérias que o art. 611-A elenca como passíveis de negociação coletiva. Ou seja, esse empregado prescinde de tutela sindical e estatal.

Todavia, há que se observar que, naquelas matérias em que a Constituição exige negociação coletiva, como nos incisos VI (redução temporária de salário e jornada), XIII (jornada de trabalho), XIV (turno ininterrupto de revezamento), do art. 7º, o legislador ordinário não tem poder para dispor.

Portanto, nas citadas matérias, continua a vedação de negociação individual para reduzir direitos, o que torna nulo o ato (inclusive lei de qualquer hierarquia) que desobedecer à norma superior. Para ganho do trabalhador, a negociação é sempre livre, por força do art. 7º, in fine, da Constituição.

Outrossim, a vontade há de ser isenta de vício de consentimento, como erro, ignorância, dolo, fraude etc., conforme arts. 138 e segs. do Código Civil. Na dú-vida, há que se aplicar a regra in dubio pro operario. Ficar de olho também no princípio da irrenunciabilidade, que tem por fundamento o vício presumido de consentimento, com assento no art. 9º da CLT.

19.4. Sucessão de empresas

Art. 448-A. Caracterizada a sucessão empresarial ou de empregadores prevista nos arts. 10 e 448 desta Consolidação, as obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida, são de responsabilidade do sucessor.

Parágrafo único. A empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada fraude na transferência.

Assim preceituam os arts. 448 e 449 da CLT:

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Art. 448. A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.

Art. 449. Os direitos oriundos da existência do contrato de trabalho subsistirão em caso de falência, concordata ou dissolução da empresa.

A mudança na lei se deu para deixar bem claro que a empresa sucessora herda as dívidas trabalhistas, inclusive as contraídas antes da sucessão. E que haverá solidariedade passiva trabalhista entre as empresas quando ficar comprovada fraude na transferência.

Não há novidade, pois esse é o direito há muito consagrado pela jurisprudência, conforme OJ n. 261 da SbDI-1 do TST:

BANCOS. SUCESSÃO TRABALHISTA

As obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para o banco sucedido, são de responsabili-dade do sucessor, uma vez que a este foram transferidos os ativos, as agências, os direitos e deveres contratuais, caracterizando típica sucessão trabalhista.

Russomano averba que "dá-se a sucessão quando uma firma assume o ativo e o passivo de outra, prosseguindo na negociação da firma anterior". São dois os requisitos da sucessão: a) que um estabelecimento, comunidade econômico-jurídica, passe de um para outro titular; e b) que a prestação de serviço pelos empregados não sofra solução de continuidade.

Esta é a regra geral, de fácil compreensão, porém surgem os casos nebulosos, como o das empresas de ônibus que ganham a concorrência e obrigam-se, no contrato de concessão, a aproveitar os trabalhadores da empresa que perdeu a concessão; da empresa que adquire, encampa, incorpora, etc. outra e a desativa, não dando prosseguimento à atividade econômica, ou muda seu objeto de exploração econômica. Na dúvida, pro operario.

A União, os Estados, Distrito Federal e Municípios sucedem as empresas públicas e sociedades de economia mista em liquidação, conforme OJ n. 343 da SDI-I. Na privatização das estatais, a empresa adquirente será sucessora; nas concessões públicas, a vencedora sucede a vencida, em regra; e já se cogita da sucessão de provedores da Internet.

O contrato de trabalho é intuitu personae ou pessoal só em relação ao obreiro. Em relação ao empregador, a tendência é de impessoalizá-lo. O importante é a continuidade da empresa e dos liames laborais, indiferente a mudanças no tipo societário, na razão social, na denominação, na titularidade, ou mesmo a desconstituição como pessoa jurídica para permanecer só como de fato:

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Encerramento formal da empresa. Continuidade de fato. Subsistente a relação empregatícia - Extinta a empresa, mas comprovada a continuidade na prestação do serviço, mantém-se inalterada a relação empregatícia - art. 448, CLT. (TRT, 22ª Reg. Rel. Juiz Francisco Meton Marques de Lima)7

Contudo, "Inexiste sucessão trabalhista, se a empresa adquire o acervo daquela que faliu, através de terceiro adquirente, que por sua vez arrematou os bens em hasta pública".

Os arts. 60, parágrafo único, e 141, II, da Lei de Recuperação Judicial n. 11.101/05, eximem a empresa adquirente do acervo da falida das obrigações trabalhistas desta.

Em relação a Municípios desmembrados, a OJ n. 92 dispõe: "Em caso de criação de novo município, por desmembramento, cada uma das novas entidades responsabiliza-se pelos direitos trabalhistas do empregado no período em que figurarem como real empregador".

Ver comentário ao art. 10-A sobre a responsabilidade do sócio retirante.

19.5. Trabalho intermitente regulamentação

Art. 452-A. O contrato de trabalho intermitente deve ser celebrado por escrito e deve conter especificamente o valor da hora de trabalho, que não pode ser inferior ao valor horário do salário mínimo ou àquele devido aos demais empregados do estabelecimento que exerçam a mesma função em contrato intermitente ou não.

§ 1º O empregador convocará, por qualquer meio de comunicação eficaz, para a prestação de serviços, informando qual será a jornada, com, pelo menos, três dias corridos de...

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