Apontamentos sobre o dano moral coletivo na jurisprudência do superior tribunal de justiça

AutorFábio Jun Capucho
Ocupação do AutorDoutor e Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Professor da Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso do Sul. Associado ao Instituto de Direito Privado. Membro da Academia de Direito Processual de Mato Grosso do Sul. Associado ao Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil.
Páginas153-174
APONTAMENTOS SOBRE O DANO MORAL
COLETIVO NA JURISPRUDÊNCIA
DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Fábio Jun Capucho
Doutor e Mestre em Direito Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de São
Paulo. Professor da Escola Superior da Magistratura de Mato Grosso do Sul. Associado ao
Instituto de Direito Privado. Membro da Academia de Direito Processual de Mato Grosso
do Sul. Associado ao Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil. E-mail:
professorfabiocapucho@gmail.com / ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0659-6170.
Sumário: 1. Introdução – 2. Da tutela dos direitos fundamentais e do direito do consumidor como
direito fundamental – 3. O dano moral coletivo e sua admissão pelo Superior Tribunal de Justiça – 4.
Crítica ao tratamento do dano não patrimonial coletivo pela jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça – 5. Conclusões – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Um dos maiores desaos do direito contemporâneo segue sendo a concretização
dos direitos fundamentais.
Com efeito, apesar do longo intervalo decorrido desde a primeira enunciação do
conceito e a despeito da sua inequívoca consolidação nos regimes constitucionais das
nações democráticas, não se pode armar que a situação seja de obra feita, concluída.
Graves crises ainda assolam mesmo países mais desenvolvidos – social, econômica
e institucionalmente – que o nosso, o que não nos permite, contudo, analisar com maior
candura o quadro local.
Na busca por formas de concretização, isso é, de passar do enunciado ao fato, as
ferramentas do regime jurídico da responsabilidade civil não podem ser ignoradas,
antes ao contrário, como bem evidenciam Fernando Rodrigues Martins e Claudia Lima
Marques, para quem o escopo primordial da responsabilidade civil seria a concreção
das normas de proteção dos direitos fundamentais.1
A Constituição federal de 1988 (CRFB) foi analítica na enunciação dos direitos
fundamentais individuais e sociais, reconhecendo-se o intuito de abrigar uma visão
1. MARTINS, Fernando Rodrigues; MARQUES, Claudia Lima. Danos qualicados constitucionalmente e a
formação da norma de proteção de direitos fundamentais no âmbito da responsabilidade civil. In: PIRES,
Fernanda Ivo (Org.); GUERRA, Alexandre et. al (Coord.). Da estrutura à função da responsabilidade civil: uma
homenagem do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade Civil (IBERC) ao Professor Renan Lotufo.
Indaiatuba, São Paulo: Foco, 2021, p. 18.
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(então) contemporânea dos interesses merecedores de especial tutela na sociedade
brasileira. É até hoje festejada pelo seu viés humanista, plural e democrático.
Examinando o âmbito de proteção dos direitos fundamentais, alude-se ao conceito
de ilícito constitucional, caracterizável em face da violação a deveres fundamentais, ao
par daquelas situações expressamente contempladas pelo constituinte com a garantia
de reparação dos danos suportados, individual ou transindividualmente.2
No presente estudo, concentrar-se-á em uma destas situações, destacando do rol
dos direitos fundamentais reconhecidos no ordenamento brasileiro o direito à tutela
do consumidor, consagrado no art. 5º, XXXII, da CRFB.3
O legislador constituinte tratou de conformar este direito também nos artigos 170,
V, da CRFB e 48, do ato das disposições constitucionais transitórias (ADCT), sendo
que, em todos os dispositivos, a ênfase foi na defesa do consumidor, o que evidencia a
compreensão constitucional da sua vulnerabilidade.
Não se pode olvidar, ademais, o disposto no artigo 24, VIII, da CRFB, sobre a
competência legislativa da União, onde se estampa a garantia de reparação dos danos
suportados tanto no plano individual, quanto transindividual.4
Observando a diretriz constitucional, edicou-se um sistema de proteção ao con-
sumidor, tendo por base o disposto na Lei 8078, de 11 de setembro de 1990, o Código
Um dos aspectos notáveis do sistema de defesa dos direitos dos consumidores
consiste no tratamento coletivo (lato sensu) dispensado pelo legislador, não apenas no
CDC, mas também na Lei 7347, de 24 de julho de 1985, conhecida por lei da ação civil
pública (LACP).
Inegavelmente, o conceito de dano de natureza coletiva (lato sensu) deve sobrema-
neira ao regime normativo do sistema de direito do consumidor.
Seja na doutrina, seja na jurisprudência, as questões de direito do consumidor, ao
lado das de direito ambiental, serviram para impulsionar o desenvolvimento do conceito
de dano coletivo, tanto o de natureza patrimonial quanto o não patrimonial. No entanto,
o quadro atual não permite concluir pela sua consolidação conceitual.
Nesta ordem de ideias, ainda há debate na doutrina e se observam contradições
na aplicação judicial da gura quanto a aspecto que se considera de enorme relevância.
Trata-se da caracterização do dano coletivo não patrimonial independentemente de
prova do prejuízo, ou in re ipsa.
Dada a natureza do dano (não patrimonial) e a dimensão do evento (transindi-
vidual), esta classicação se revela coerente. Todavia, conforme adiantado, observa-se
problemática.
2. MARTINS, 2021, p. 21-22.
3. Art. 5º (...)
XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.
4. MARTINS, 2021, p. 23.
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