O dano extrapatrimonial como resultado do descumprimento contratual: razão, requisitos e limites da proteção aos direitos da personalidade por violação do negócio jurídico

AutorBruno Montanari Rostro
Ocupação do AutorDoutorando e Mestre em Direito Civil e Empresarial pela UFRGS. Pós-Graduado em Direito dos Contratos e Responsabilidade Civil pela UNISINOS. Advogado.
Páginas51-70
O DANO EXTRAPATRIMONIAL
COMO RESULTADO DO DESCUMPRIMENTO
CONTRATUAL: RAZÃO, REQUISITOS E LIMITES DA
PROTEÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE
POR VIOLAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO
Bruno Montanari Rostro
Doutorando e Mestre em Direito Civil e Empresarial pela UFRGS. Pós-Graduado em
Direito dos Contratos e Responsabilidade Civil pela UNISINOS. Advogado. bmrostro@
gmail.com.
Sumário: 1. Introdução – 2. Os direitos da personalidade como fundamento do dever de indenizar danos
extrapatrimoniais por descumprimento do contrato – 3. A diculdade de sistematização da teoria do
dano extrapatrimonial por descumprimento contratual – 4. Conclusão – 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A indenização do dano extrapatrimonial decorrente do descumprimento contra-
tual está entre os últimos passos dados em relação à admissibilidade de indenização por
danos desta natureza. Se hoje há consenso com relação à possibilidade de indenização
do dano extrapatrimonial, tanto em virtude da violação de preceitos jurídicos contidos
no ordenamento quanto na esfera contratual, o tema nem sempre percorreu caminhos
pavimentados. Primeiro, havia resistência quanto a simples possibilidade de compen-
sação do dano de natureza extrapatrimonial em qualquer situação; depois, quando se
passou a admitir a compensação de danos a esse título, o problema foi tê-lo de forma
autônoma, sem que se tratasse de mero reexo de danos patrimoniais.
Agostinho Alvim,1 entre 1949 e 1972, identicou a indenizabilidade do dano extra-
patrimonial como uma questão bastante controvertida. Constatava àquela época que a
doutrina convergia para aceitação do dano puramente moral, porém, o tema encontrava
forte resistência de aplicação pelos Tribunais. Dizia o autor que a possível razão da demora
das cortes em aceitá-lo residia no fato de que a doutrina atuava simplesmente no campo
teórico, onde era mais fácil a construção do tema, mas os juízes, que atuavam no caso
concreto, encontravam extrema diculdade em identicar o dano extrapatrimonial e
aplicar condenações equivalentes, o que fazia, então, o tema retroceder nos Tribunais.
Também, mostrava-se necessário superar algumas barreiras para que se admitisse
uma espécie de dano que dissesse respeito somente aos elementos da personalidade
1. ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1980.
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da pessoa, como, por exemplo, a insistência de tratar por dano extrapatrimonial o que
Agostinho Alvim constatava ser nada além de um dano patrimonial presumido, como
no caso do art. 1.530 do CC/16, que previa que, na hipótese de cobrança de dívida
não vencida, reter-se-iam juros pelo tempo que faltava para vencer, caso que, embora
muitos sustentavam ser indenização por dano moral, tratava-se não mais do que abalo
de crédito cuja prova dos danos para evitar a cobrança indevida por vezes era de difícil
estimação. Para Agostinho Alvim, com razão, tratar o dano moral como o que repercute
no patrimônio era o mesmo que negar indenizá-lo, pois o dano moral é somente aquele
que não repercute no patrimônio da vítima.2
Mas ainda que àquele tempo, quando se cogitava de compensação por dano não
patrimonial, isso somente ocorreria nos casos previstos em lei, igual a sistemas como
dos direitos alemão e italiano, países que passaram pelo mesmo roteiro de evolução
da matéria havida no Brasil. Na Itália, p.ex., cuja previsão legislativa determinava a
indenização dos danos não patrimoniais somente nos casos previstos em lei, segundo
relata Barcellona,3 foi apenas em 2003 que houve a redenição dos pressupostos e do
conteúdo do dano não patrimonial pela jurisprudência, para determinar que o dano
não patrimonial é ressarcível também nos casos em que o fato ilícito venha a lesar um
interesse ou um valor da pessoa de relevo constitucional e não suscetível de avaliação
econômica. Nesse aspecto, no Brasil, a CF/88 foi determinante para erradicar de vez a
impossibilidade de o lesado obter indenização de cunho não patrimonial, ou que essa
hipótese de indenização se prendesse à lei, o que depois veio arrebatado pelo CC/02, na
conjunção dos artigos 186 e 927.
Além disso, o reconhecimento da indenizabilidade do dano extrapatrimonial
necessitou superar argumentos de que não se deveria cogitar indenizar pelo sofri-
mento e que não seria possível encontrar a equivalência entre dor e dinheiro, ambos
fundamentos hoje vencidos pelo entendimento de que há prevalência da proteção
da pessoa no ordenamento jurídico4 e de que a indenização monetária não visa à
equiparação ou supressão da dor, mas uma compensação em forma de conforto
pelo abalo sofrido.5
2. Mesmo quando o ilícito tem no seu suporte fático a pessoa humana e o dano lhe seja acometido (e.g. na injúria),
mas exista repercussão patrimonial (e.g., a perda de clientela), não signica que estaremos tratando de danos
extrapatrimoniais, mas, como distingue terminologicamente Fernando Noronha (Direito das obrigações. 3. ed.
São Paulo: Saraiva, 2010), danos pessoais impuros de repercussão patrimonial.
3. BARCELLONA, Mario. Il danno non patrimoniale. Giurè: Milano, 2008.
4. “Se se nega a estimabilidade patrimonial do dano não-patrimonial cai-se no absurdo da não indenizabilidade do
dano não-patrimonial; portanto, deixar-se-ia irressarcível o que precisaria ser indenizado. Mais contra a razão
ou o sentimento seria ter-se como irressarcível o que tão fundo feriu o ser humano, que há de considerar o inte-
resse moral e intelectual acima do interesse econômico, porque se trata de ser humano. A reparação pecuniária
é um dos caminhos; se não se tomou êsse caminho, pré-elimina-se a tutela dos interesses mais relevantes. Não
só no campo do direito penal se há de reagir contra a ofensa à honra, à integridade física e moral, à reputação
e à tranqüilidade psíquica” (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. São
Paulo: Ed. RT, 1984, t. LIII. p. 218).
5. SANSEVERINO, Paulo de Tarso. Princípio da reparação integral: indenização no Código Civil. São Paulo:
Saraiva, 2010.
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