Condenação Criminal do Empregado, Passada em Julgado, Caso não Tenha Havido Suspensão da Execução da Pena (Art. 482, d, da CLT)

AutorMelchíades Rodrigues Martins
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho Aposentado do TRT da 15ª Região. Mestre em Direito
Páginas170-181

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1. Introdução

Esta alínea é apontada como sucessora da norma que previa justa causa para o empregado que estivesse inabilitado a cumprir o contrato de trabalho por força maior (Lei n. 62/35, art. 8a, n. II).

Segundo Lamarca, a "desorientação jurisprudencial obrigou o legislador a acatar a inovação"177.

A hipótese de força maior é uma norma de exceção às regras gerais de que os contratos devem ser cumpridos.

Como o direito apresenta poucas exceções, jáque essas são e devem sertratadas como excepcionais, essas hipóteses têm como hermenêutica uma interpretação estrita, que não comporta ampliações.

Contudo, a alteração apresentada pela CLT restringiu ainda mais o campo de aplicação dessa situação, ou seja, não basta a força maior, é preciso a condenação criminal, passada em julgado, portanto, com execução da pena, com o que o trabalhador fica impossibilitado de cumprir o contrato de trabalho.

Por outro lado, o empregado que é condenado criminalmente, em decisão transitada em julgado, normalmente carrega o peso da desconfiança por parte do empregador e de seus colegas de serviços e com possibilidade de reflexos com os clientes da empresa.

A rigor, o empregado condenado criminalmente comete um ato faltoso contra a sociedade daí a sua punição. Se fosse o ato contra o empregador o trabalhador estaria cometendo um ato disciplinar que ensejaria a sua dispensa por justa causa, normalmente fundado em ato de improbidade ou de mau procedimento, ou então sem justa causa, se for essa a opção do empregador. Na verdade, são os reflexos da sua condenação criminal transitada em julgado é que trazem

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prejuízos para o ambiente de trabalho da empresa, aliada a ocorrência da impossibilidade da prestação de serviço em razão da prisão.

Com razão, portanto, Sérgio Pinto Martins quando afirma que "de acordo com a lei, a condenação criminal é a hipótese de justa causa, mas tecnicamente não deveria ser, pelos motivos expostos. Deveria ser hipótese de cessação do contrato de trabalho, sem pagamento de indenização ao empregado, devendo ser pago apenas aquilo que ele já adquiriu, ainda que proporcionalmente, e os salários pelos dias trabalhados. Seria uma hipótese de cessação do contrato de trabalho que resolve o pacto laborai sem que o empregado faça jus a indenizações, mas apenas àquilo que já adquiriu na empresa"178.

Finalmente, é de se registrar que mero inquérito judicial não é fato suficiente para caracterização da justa causa. Da mesma forma, o boletim de ocorrência policial que apenas noticia à autoridade policial fato delituoso. Há caso, no entanto, em que o processo criminal contribui para aplicação da justa causa, como ocorre, por exemplo, em confissão do ato faltoso pelo reclamante perante o Delegado de Polícia, de forma que esse fato aliado as demais provas constantes dos autos leva a procedência da justa causa:

Justa Causa -Ato de improbidade. Processo criminal. As provas constantes nos autos, em especial a confissão feita pela reclamante perante o Delegado de Polícia, são suficientes para amparar a justa causa aplicada, sendo de todo desnecessário aguardar o deslinde do processo criminal e o seu trânsito em julgado. Afinal, não é necessário que haja crime para justificar a dispensa por justa causa, mas sim falta grave o suficiente para abalar a confiança do empregador. TRT3âReg. RO 0103100-51.2009.5.03.0032 - (Ac. 4âT.) -RePLucilde D'Ajuda Lyra de Almeida. DEJT/TRT 3â Reg., 18.8.14, p. 143.

2. Campo da aplicação

Conforme se infere pelo disposto na alínea em comento, o fator determinante para a configuração da justa causa é a existência de condenação criminal do empregado já transitada em julgado, sendo outro requisito a ausência de suspensão de pena.

Observe-se, também, que o dispositivo legal não faz nenhuma referência ao tipo de crime praticado pelo empregado, ou mesmo se ele decorreu de contravenção penal, compreendendo-se nesse contexto que bastaria a condenação criminal transitada em julgado, para a sua incidência.

Se, no entanto, a razão dessa justa causa for pela impossibilidade de prestação de serviços principalmente, mas não só, em razão da prisão, ou de outras hipóteses de prisão, sem a condenação criminal, acarretariam dificuldades para o intérprete da lei.

A doutrina aponta para casos como a prisão preventiva, na qual não existe a condenação criminal, e por essa razão, não poderia ser aplicada ajusta causa em comento.

A própria recusa na aplicação da justa causa por lhe faltar os requisitos da condenação criminal e do trânsito em julgado demonstra que essa alínea não tutela os casos de impossibilidade de prestar o serviço por força maior, mas apenas especifica um caso desses. Até porque se o empregado estivesse impossibilitado de trabalhar por motivo de força maior, este fato por

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si só seria excludente da ocorrência de abandono de emprego, que é uma das hipóteses carac-terizadora de justa causa.

Outros casos de impossibilidade de prestação de serviço em razão de prisão, mas sem os requisitos da condenação criminal e do trânsito em julgado, podem ser apresentados, como a prisão temporária, prisão em razão da pronúncia, a prisão para apelar, em que já existe uma condenação, mas ainda sem o trânsito em julgado.

Se a base dessa norma for a impossibilidade de prestação de serviço, outras hipóteses ocasionariam ainda mais dificuldades, como o preso por não pagar pensão alimentícia, a prisão do depositário infiel.

Nessas hipóteses não haveria sequer condenação criminal, mas apenas uma execução de pena civil, com impossibilidade de prestação de relação empregatícia. Ainda aqui seria impossível a demissão por justa causa, por não preencher os requisitos da alínea d, do art. 482 da CLT: a condenação criminal.

Enfim, se a base para a elaboração dessa alínea foi a impossibilidade de prestação de serviço, essa não foi uma redação feliz, pois trata situações semelhantes com desigualdade.

Por outro lado, se a razão justificadora dessa norma não consistir na impossibilidade de trabalho, mas sim na condenação criminal, essa norma também não poderia ser reputada boa, pois distinguiria os condenados impossibilitados de trabalhar, daqueles que não sofreriam quaisquer restrições, casuisticamente.

Poderia justificar que essa norma visa penalizar os que além de condenados, mantivessem--se presos, considerando que apenas os casos mais graves ensejariam a prisão e apresentariam obstáculos para a obtenção de benefícios que impedissem a execução da pena.

Na verdade, essa norma seria mais um efeito da condenação criminal na esfera trabalhista, sem maiores indagações ou transcendências: condenado, com trânsito em julgado, cumprindo pena, demita-se.

Enfim, a interpretação dessa alínea vai ser resultado da fusão dessas duas hipóteses: a da impossibilidade de prestação de serviços, e a condenação criminal passada em julgado com execução de pena. A excludente prevista na lei, qual seja, a existência da suspensão da pena, implica dizer que o trabalhador, com a referida suspensão, não fica impossibilitado de prestar os seus serviços, como empregado, portanto, não haverá razões para a aplicação da justa causa.

3. Nexo com o contrato de trabalho

A falta aqui prevista pode não ter nenhum nexo com o trabalho, porque o ato é praticado normalmente fora do local do trabalho e sem nenhuma vinculação com o empregador.

Isso porque se o ato criminoso fosse praticado contra o empregador a justa causa teria outro fundamento, no caso, de ato de improbidade ou de mau procedimento. Nem teria sentido o empregador aguardar o desfecho do processo criminal, com o consequente trânsito em julgado, o que poderia levar anos e manter um empregado em seu quadro funcional que não lhe inspira

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confiança, quando ele possui outras hipóteses na lei para aplicação da justa causa, como já ventilado.

De notar-se, também que, se o ato de improbidade e a respectiva condenação criminal ocorreram antes de o empregado ser contratado não pode ser considerado como justa causa, já que o ato deverá guardar concomitância com o contrato de trabalho.

O que importa na aplicação dessa justa causa é a condenação criminal, passada em julgado, ou seja, aquela em que não comporta mais recurso, e ocorrida no curso do contrato de trabalho, ressalvada, no entanto, as hipóteses em que há suspensão da pena.

4. Prazo de prisao

A interpretação que exige a impossibilidade de prestação de serviços pelo empregado sugere que pequenos prazos de prisão, como horas ou dias, não são suficientes para a demissão do empregado.

Quanto à extensão do prazo, Giglio deixa ao prudente arbítrio do juiz, na análise do caso concreto, com apoio na equidade, a definição do período que justificaria a empresa aplicar a justa causa179.

Outra parte da doutrina aponta para a necessidade de um prazo superior a trinta dias180 para haver a justificativa da empresa para demitir o empregado por justa causa.

O fato é que essa discussão gera alguma insegurança social indesejada. Para os pequenos prazos de prisão, a empresa sempre carregará a dúvida se agiu corretamente, e o empregado sempre ficará com uma expectativa de reversão da justa causa no Poder Judiciário.

A lei já impõe critérios altamente...

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