Harmonizações e reforma trabalhista

AutorRicardo Carvalho Fraga
Páginas182-183
HARMONIZAÇÕES E REFORMA TRABALHISTA
Ricardo Carvalho Fraga(*)
(*) Desembargador no TRT-RS.
A Lei n. 13.467 foi tema de debate em sala de aula
da Pós-Graduação da Unisinos, em 11 de janeiro. Foi
evento organizado pelo Professor Anderson Vichin-
keski Teixeira, nos belos novos prédios avenida Nilo
Peçanha, em Porto Alegre.
Estive presente com o colega Gilberto Souza dos
Santos, Desembargador e mestrando em Lisboa. Na
mesa, igualmente a Juíza Odete Grasselli. Na plateia,
Marcia Cavalheiro Cordorniz e Paola Gobeti, que con-
tribuíram para a apresentação.
Adiante, algumas linhas sobre os temas que apre-
sentei naquele agradável momento de rico aprendizado.
Seja naquela sala de aula, seja nestas linhas, re-
gistra-se o respeito por todos que têm ilusões de que
estamos no rumo de “modernização” das relações de
trabalho e novos ciclos de desenvolvimento. Não se
pretendeu fazer o confronto teórico com estas ideias,
na aula e tampouco neste texto. A intenção é outra:
apontar situações concretas que indicam outros rumos,
não desejados por imensas maiorias.
A organização do estado de bem-estar tem recebi-
do ataques, até mesmo, no País de maior riqueza econô-
mica do Mundo hoje. O plano de saúde proposto pelo
ex-Presidente Barack Obama foi aprovado por pequena
diferença de votos e tem enfrentado dificuldades de im-
plementação. (Disponível em: <http://observador.pt/
explicadores/porque-e-que-o-obamacare-divide-tanto
-os-americanos/>).
A denominada reforma trabalhista está inserida
neste contexto mais amplo. A gravidade é que já esta-
mos em um dos Países com maior injustiça na distri-
buição da riqueza.
Por óbvio, os autores da nova lei não apresenta-
ram um conceito posterior e, muito menos, que fosse
mais evoluído de estado de bem-estar. Mesmo assim,
num primeiríssimo instante, diante do grande número
de alterações, impõe-se verificar se existe coerência
entre elas.
Além da coerência entre as inúmeras alterações
consigo mesmas, há de se examinar Ao contrário do
que a imprensa leiga noticia, é postura que se exige
relativamente a toda a harmonia com a Constituição
e Convenções Internacionais, e qualquer lei em nosso
sistema, e em outros também.
Quanto à Ação Direta de Inconstitucionalidade n.
5.766, sobre a gratuidade de justiça, no momento em
que estas linhas são escritas, já se tem a informação de
que o voto do relator Ministro Luís Barroso já está ela-
borado. Resta ser incluído em pauta, quando todos o co-
nheceremos. Por ora, desde logo, cabe registrar a beleza
da peça inicial de 72 páginas. (Disponível em:
www.mpf.mp.br/pgr/documentos/ADI5766reforma
trabalhista.pdf>).
No Reino Unido, recentemente, houve contro-
vérsia semelhante. A restrição não foi aceita, confor-
me notícia e estudo do advogado Antônio Escosteguy
Castro. (Disponível em:
com/money/2017/jul/26/union-supreme-court-fees-
-unfair-dismissal-claims>;
REFORMA TRABALHISTA • PRIMEIRO ANO 183
br/jornal/restricao-do-acesso-justica-e-aplicacao-
-d122a-lei-13-467-no-tempo/>).
As “ondas”, semelhantemente aos movi-
mentos de acesso à Justiça, não podem mais ser
travadas. Este aprendizado nos vem desde Mau-
ro Cappelletti. Entre tantos estudos, Carlos Al-
berto de Oliveira nos aponta algumas de suas
consequências. (Disponível em:
pro.br/home/artigos/158-artigos-ago-2001/3533
-cappelletti-e-o-direito-processual-brasileiro>).
Os números elevados não podem ser entraves a
novos avanços e necessários aperfeiçoamentos. Ao fi-
nal de 2017, em Seminário no Tribunal Superior do
Trabalho, viu-se advogada na Índia, responsável pelo
cuidado de 27 milhões de processos. (Disponível em:
;
congressodireitotecnologia.com.br/>;
br/web/guest/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/
tst-sedia-debate-internacional-sobre-uso-da-inteli-
gencia-artificial-para-agilizar-a-justica/pop_up?_101
_INSTANCE_89Dk_viewMode=print&_101_
INSTANCE_89Dk_languageId=pt_BR>;
Users/rcfraga/Downloads/01_de_junho.pdf>).
Certamente, esta advogada da Índia acharia estra-
nha a timidez do nosso CPC/1973, art. 46, parágrafo
único, e NCPC, art. 113, § 1º.
O veto presidencial ao art. 333 do NCPC impe-
diu a coletivização das soluções. Ficou-se com a alter-
nativa das uniformizações, com peculiaridades, diversas
do direito anglo saxão. (Disponível em:
conjur.com.br/2015-mar-17/leia-razoes-sete-vetos-dilma
-rousseff-cpc>;
/340-artigos-ago-2016/7711-precedentes-que-prece-
dentes-um-ensaio-sobre-a-jurisdinormacao>).
Agora, estas uniformizações, em experiência in-
cipiente, na Justiça do Trabalho, foram parcialmente
abandonadas. A Lei n. 13.015 havia inserido os §§ 3º
ao 6º ao art. 896 da CLT e a Lei n. 13.467 os revogou.
Tratamos do tema em livro nosso, Editora LTr, NCPC
— Próximos do Segundo Ano, 2017.
Repetindo e retomando a afirmativa da neces-
sidade do exame da harmonização das novas regras
consigo mesmas, com a Constituição e Convenções
Internacionais, apresentamos um acréscimo. Pensa-
mos aqui na harmonização das novas disposições,
igualmente, com outras leis.
O novo art. 8º da CLT, mencionando o art. 104
do Código Civil, é uma curiosidade. Tal limitação está
repetida no art. 611-A, § 1º. Será difícil o juiz limitar
sua atuação e dizer desconhecer os demais aprendi-
zados sobre a validade dos negócios jurídicos. Aliás,
como outra curiosidade, diga-se tal limitação não foi
repetida para o árbitro privado do novo art. 507-A.
A prescrição intercorrente do art. 11-A alcança
processos anteriores? Caso se entenda que sim, seria
mais correto e esclarecedor utilizar a palavra anistia?
Caso alcance os correspondentes recolhimentos previ-
denciários e fiscais, deveria observar as regras tributá-
rias previstas na Constituição? Nas Jornadas Anamatra,
Brasília, outubro de 2017, buscou-se encontrar a har-
monização deste art. 11-A mencionado com a limita-
ção ao da execução de ofício do art. 878. Deste modo,
ambas as regras se justificam ou se agrava a dificulda-
de de compreensão, interpretação e aplicação? Outros
temas foram debatidos. (Disponível em:
anamatra.org.br/imprensa/noticias/25797-reforma
-trabalhista-anamatra-divulga-integra-dos-enunciados
-aprovados-na-2-jornada>).
Ao tratar dos danos extrapatrimoniais, o juiz po-
derá limitar-se apenas aos dispositivos de um título
da CLT, como pretende o art. 223-A? Mais uma vez,
por certo, será inviável se dizer desconhecer as demais
leis, entre elas, o Código Civil e os aprendizados con-
temporâneos sobre responsabilidade civil.
A atenção aos deveres das testemunhas há de ser
lembrado. A previsão de multa, no art. 793-D, poderá
contribuir apenas se recordarmos outros ensinamentos.
No livro Perspectivas do Discurso Jurídico, organiza-
dor Anderson, Alejandro e Wagner indicam a fragili-
dade da prova testemunhal e, até mesmo, a existência
de conceitos de outras áreas, sobre “falsa memória”.
Alain Supiot comenta o que entende ser uma pe-
quena “abstração jurídica” do Direito do Trabalho,
no livro Crítica do Direito do Trabalho. Lisboa: Fun-
dação Calouste Gulbenkian, 2016. p. 254 e seguintes.
Aqui, diz ele, os conceitos chegam frequentemente da
sociologia, de modo quase direto.
O importante autor, em outras páginas, provavel-
mente, já tenha registrado o menor tempo das cons-
truções deste ramo comparado ao direito civil, por
exemplo.
De qualquer maneira, preocupa ler o art. 456-A e
desconfiar que os conceitos de “logomarcas” e “em-
presas parceiras”, este presente em temas jurídicos
bem diversos, tenham vindo diretamente de outras
áreas tais como marketing, por óbvio, sem desprezo a
esta novíssima área do conhecimento.

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