Prefácio

AutorVictor Hugo Laitano
Ocupação do AutorProcurador-Chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 4ª Região
Páginas11-12
PREFÁCIO
Trinta anos se passaram, mas não há o que comemorar. Promulgada em 1988, a Constituição Federal foi
logo denominada de “cidadã”, por inserir o trabalho como tema central e como valor fundante da República.
Resultado de um concerto social subsequente a um período de trevas da ordem democrática, os direitos sociais
foram postos no título “Dos direitos e garantias fundamentais”, topograficamente no ápice do sistema jurídico,
plenamente associado ao modelo republicano da ordem econômica e da justiça social.
A par desta fundamentalidade formal dos direitos sociais, divisa-se a fundamentalidade material de tais
direitos na leitura dos fundamentos da República Federativa do Brasil, insculpidos nos arts. 1º e 3º da Lei Maior,
notadamente a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre-iniciativa, bem como a
erradicação da pobreza e da marginalização. Com isto, a Carta Magna de 1988 reconheceu os direitos sociais
como direitos fundamentais, forjando um verdadeiro marco legislativo trabalhista a ser observado no ordenamento
jurídico infraconstitucional. Neste passo, o diploma reitor da ordem trabalhista, a CLT, foi constantemente
atualizada e aperfeiçoada, mercê dos efeitos da evolução tecnológica e da consequente construção jurisprudencial,
porém, sempre com o olhar voltado para a proteção da parte hipossuficiente na relação de trabalho, o trabalhador.
Neste cenário, se deu o surgimento, em tempo recorde, da Lei n. 13.467, com vigência a partir de 11 de
novembro de 2017, a chamada “Reforma Trabalhista”, introduzindo uma ampla alteração do sistema legislativo
de proteção social do trabalho, com forte viés flexibilizador e precarizante das relações de trabalho. Calcada em
premissas de natureza econômica, no sentido de fomentar a criação de novos empregos, a reforma, ao revés,
estimula a informalidade e a desproteção social. Com patente déficit de debate social, com a legitimidade
comprometida por ser concebida por um governo sem lastro eleitoral, as novas regras consagram um ataque
frontal ao acesso à justiça, além de institucionalizar práticas fraudulentas nos contratos de trabalho, como
a terceirização irrestrita e o trabalho intermitente. No âmbito do direito coletivo, sob o argumento de fortalecer a
autonomia individual, debilitou-se a organização sindical, desconstruindo seu sistema de custeio e sustentação.
Em torno desta temática, se inserem os estudos que compõem a presente obra que tenho o prazer e a honra
de apresentar. Na condição de membro do Ministério Público do Trabalho, tenho por atribuição constitucional
o zelo pela ordem jurídica, a defesa do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis,
pelo que é imperativo enfrentar o desmonte da teia de proteção jurídica trabalhista em todas as frentes possíveis.
É da essência do MPT a busca por um modelo de trabalho produtivo decente que garanta ao trabalhador uma
remuneração justa, desenvolvido num ambiente hígido, com proteção social e representação sindical condizente.
Trata-se de um trabalho coletivo de operadores do direito, os quais recepcionaram a ideia do engodo
argumentativo econômico que forjou os parâmetros da reforma. Buscam, sobretudo, traçar um vetor interpretativo,
sob o enfoque das garantias constitucionais, de modo a assegurar um patamar civilizatório mínimo ao ser humano
que trabalha, indispensável à salvaguarda da dignidade da pessoa humana, marco central da nossa ordem jurídica.
Releva, ainda, analisar a reforma trabalhista sob o enfoque das convenções e tratados internacionais ratificados
pelo Estado brasileiro, a começar pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pela Declaração Americana
de Direitos e Deveres do Homem, cuja aplicação decorre de seu status hierárquico qualificado no ordenamento

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