Inventário, arrolamento e partilha

AutorCleyson de Moraes Mello
Ocupação do AutorVice-Diretor da Faculdade de Direito da UERJ. Professor do PPGD da UERJ e UVA. Advogado. Membro do Instituto dos Advogados do Brasil ? IAB
Páginas197-266
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Capítulo 9
INVENTÁRIO, ARROLAMENTO E PARTILHA
9.1 Considerações Iniciais
O direito à herança é cláusula pétrea, de acordo com o artigo
5º, inciso XXX, da Constituição da República de 1988.
A herança (monte, acervo hereditário ou espólio) é uma
universalidade de direito (artigo 91, CC) contendo o conjunto de bens,
direitos e obrigações transmissíveis aos herdeiros do falecido. A
herança é considerada coisa indivisa até a realização da partilha.
De acordo com JOSÉ DA SILVA PACHECO, “a herança,
provisoriamente, permanece indivisa, ficando os herdeiros na posição
de comuneiros. Cada herdeiro é proprietário e possuidor da herança,
sem distinguir o quinhão que lhe caberá. Com a partilha, após o
pagamento das dívidas, ônus e encargos, entregam-se os quinhões aos
herdeiros, extinguindo a comunhão hereditária.”180
Como dito acima, são fundamentos do direito sucessório: a
devolução unitária da herança aos herdeiros (universalidade de direito
universitas iuris) e a noção de indivisibilidade do monte hereditário.
A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os
herdeiros (artigo 1.791, CC). Até a partilha, o direito dos co-herdeiros,
quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-
á pelas normas relativas ao condomínio (artigo 1.791, parágrafo único,
CC). De acordo com o artigo 80, inciso II, do Código Civil, são
considerados bens imóveis para os efeitos legais, o direito à sucessão
aberta.
180 PACHECO, José da Silva. Inventários e Partilha s. 13ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999,
p.74.
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O herdeiro não responde por encargos superiores às forças da
herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver
inventário que a escuse, demostrando o valor dos bens herdados (artigo
1.792, CC). Dessa forma, os herdeiros devem honrar as obrigações do
falecido e a herança líquida será, portanto, distribuída com a partilha.
A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido;
mas, feita a partilha, respondem os herdeiros, cada qual em
proporção da parte que na herança lhe coube (artigo 1.997, CC).
Vale lembrar que a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal
por ocasião do julgamento do tema n. 809/STF, segundo a qual "é
inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e
companheiros prevista no art. 1.790 do CC/2002, devendo ser aplicado,
tanto nas hipóteses de casamento quanto nas de união estável, o regime
do art. 1.829 do CC/2002", deve ser aplicada ao inventário em que a
exclusão da concorrência entre herdeiros ocorreu em decisão anterior à
tese.181 É imperiosa a aplicação da tese firmada pelo Supremo Tribunal
Federal no julgamento do tema n. 809/STF, que impõe a igualdade de
tratamento no regime sucessório entre cônjuges e companheiros, em
processo cuja inexistência jurídica da sentença de partilha, ante a
181 Considerando que a lei incompatível com o texto constitucional padece do vício de nulidade,
a declaração de sua inconstitucionalidade, de regra, produz efeito ex tunc, ressalvadas as
hipóteses em que, no julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, houver a modulação temporal
dos efeitos, que é excepcional.
Ao declarar a inconstitucionalidade do art. 1.790 do CC/2002 (tema 809), o Supremo Tribunal
Federal modulou temporalmente a aplicação da tese para apenas "os processos judiciais em que
ainda não tenha havido trânsito em julgado da sentença de partilha", de modo a tutelar a confiança
e a conferir previsibilidade às relações finalizadas sob as regras antigas (ou seja, às ações
de inventário concluídas nas quais foi aplicado o art. 1.790 do CC/2002).
Dessa forma, aplica-se a tese fixada no tema n. 809/STF às ações de inventário em que ainda não
foi proferida a sentença de partilha, ainda que tenha havido, no curso do processo, a prolação de
decisão que, aplicando o art. 1.790 do CC/2002, excluiu herdeiro da sucessão e que a ela deverá
retornar após a declaração de inconstitucionalidade e a consequente aplicação do art. 1.829 do
CC/2002.
Isso porque, desde a reforma promovida pela Lei n. 11.232/2005, a declaração superveniente de
inconstitucionalidade de lei pelo Supremo Tribunal Federal torna inexigível o título que nela se
funda, tratando-se de matéria suscetível de arguição em impugnação ao cumprimento de sentença
- ou seja, após o trânsito em julgado da sentença (art. 475, II e §1º, do CPC/73) -, motivo pelo
qual, com muito mais razão, deverá o juiz deixar de aplicar a lei inconstitucional antes da
sentença de partilha, marco temporal eleito pelo Supremo Tribunal Federal para modular os
efeitos da tese fixada no julgamento do tema n. 809/STF. (REsp 1.904.374/DF, Rel. Min. Nancy
Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 13/04/2021).
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ausência de citação de litisconsorte necessário, impede a formação da
coisa julgada material.182
9.2 Inventário e Administração da Herança
9.2.1 Introdução
Com o advento da Lei 11.441/07, além do inventário judicial, é
possível a feitura do inventário e partilha por escritura pública. Havendo
testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial
(artigo 610, CPC). Se todos forem capazes e concordes, o inventário e
a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá
documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para
levantamento de importância depositada em instituições financeiras
(artigo 610, § 1o, CPC). O tabelião somente lavrará a escritura pública
se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por
defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato
notarial (artigo 610, § 2o, CPC).
Os procedimentos previstos em nosso ordenamento jurídico
para a sucessão por morte são: (a) inventário comum; (b) arrolamento;
(c) inventário negativo; (d) inventário cumulativo.
9.2.2 Inventário Comum
O artigo 1.796 do Código Civil prevê um prazo de trinta dias, a
contar da abertura da sucessão, para instaurar o inventário do
patrimônio hereditário, perante o juízo competente no lugar da
sucessão, para fins de liquidação e, quando for o caso, de partilha da
herança.
Ocorre que o artigo 611 do CPC diz que “o processo de
inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a
contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses
182 REsp 1.857.852-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado
em 16/03/2021.

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