Ordem social

AutorPaulo Roberto de Figueiredo Dantas
Páginas811-844
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ORDEM SOCIAL
16.1 ESCLARECIMENTOS INICIAIS
Nós já vimos, em mais de uma oportunidade, que os direitos fundamentais surgiram
com a necessidade de proteger o homem do poder estatal, a partir dos ideais advindos do
Iluminismo. Vimos, igualmente, que referidos direitos também têm, na atualidade, outras
importantes funções, dentre as quais a de garantir aos indivíduos as denominadas liberdades
positivas, ou seja, o conjunto de direitos que impõe ao Estado a prática de diversas ações1,
visando à obtenção da igualdade substancial (não mais apenas formal) entre as pessoas.
Com efeito, o simples reconhecimento de direitos fundamentais nem sempre é suf‌iciente
para que os indivíduos possam efetivamente gozá-los, tamanha a pobreza que ainda existe
no meio social, tornando-se indispensável, portanto, que o Estado também consagre um
conjunto de direitos destinados justamente à obtenção, tanto quanto possível, de uma certa
igualdade material entre as pessoas, através da redução das desigualdades socioeconômicas.
Entre os direitos dessa natureza, destacam-se os chamados direitos sociais.
Os direitos sociais, também já vimos anteriormente, estão fortemente vinculados ao
chamado princípio da dignidade humana, apontado pela doutrina como a fonte primordial
de todo o ordenamento jurídico, e, sobretudo, dos direitos e garantias fundamentais, nota-
damente os direitos sociais. Estes direitos têm inequívoco caráter universal, destinando-se
à proteção de todo o gênero humano, benef‌iciando não só os brasileiros, como também os
estrangeiros que se encontrem no território nacional.
Contudo, nunca é demais lembrar, apesar de seu caráter universal, destinando-se à tutela de
todo o gênero humano, os direitos sociais destinam-se principalmente à proteção dos mais fracos,
sejam os menores de idade, sejam os maiores considerados hipossuf‌icientes, assim entendidos
aqueles que dependem, em maior grau, das prestações materiais promovidas pelo Estado.
Após relacionar os diversos direitos sociais,2 a Constituição Federal trata, no Capítulo
II, de seu Título II, dos direitos mínimos dos trabalhadores urbanos e rurais, da liberdade de
associação prof‌issional ou sindical e do direito de greve, assuntos já estudados no Capítulo
8, deste livro. Já no Título VII, nossa Carta Magna contém normas que tratam, dentre outros
direitos sociais, da seguridade social, da proteção à maternidade, à infância e aos idosos.
Conforme expressa redação do artigo 193, da Le Maior, a ordem social tem como base
o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais. O parágrafo único3
1. Justamente por se tratar de ações (prestações positivas) que devem ser prestadas pelo Estado, esses direitos são também
chamados de direitos de promoção ou direitos prestacionais.
2. Constituição Federal, artigo 6º: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o trans-
porte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados,
na forma desta Constituição”.
3. Parágrafo único incluída pela Emenda Constitucional 108, de 2020.
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CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL • PAULO ROBERTO DE FIGUEIREDO DANTAS
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do mesmo artigo, a seu turno, nos esclarece que o Estado exercerá a função de planejamento
das políticas sociais, assegurada, na forma da lei, a participação da sociedade nos processos
de formulação, de monitoramento, de controle e de avaliação dessas políticas. Passemos
agora a estudar, de forma mais detalhada, o Título VII, da Constituição Federal (denominado
“Da ordem social”).
16.2 SEGURIDADE SOCIAL
Conforme disposto no artigo 194, da Carta Magna, “a seguridade social compreende
um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destina-
das a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”. Portanto,
nos expressos termos de nossa Lei Maior, a chamada seguridade social engloba as ações,
tanto do Estado como da sociedade, relacionadas: (a) à saúde; (b) à previdência social; e
(c) à assistência social.
Nos expressos termos do parágrafo único daquele artigo 194, da Constituição da
República, o poder público deve organizar a seguridade social, nos termos da lei, com base
nos seguintes objetivos:
– Universalidade da cobertura e do atendimento;
– Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
– Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
– Irredutibilidade do valor dos benefícios;
– Equidade na forma de participação no custeio;
– Diversidade da base de nanciamento, identicando-se, em rubricas contábeis especícas para cada área, as receitas e as
despesas vinculadas a ações de saúde, previdência e assistência social, preservado o caráter contributivo da previdência social4;
– Caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalha-
dores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados5.
O artigo 195, da Constituição Federal, ao seu turno, esclarece que a seguridade so-
cial será f‌inanciada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, também nos termos de
lei ordinária, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, bem como de recursos obtidos através das seguintes
contribuições sociais:
– Do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidente sobre: (a) a folha de salários e demais
rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo
empregatício; (b) receita ou faturamento; e (c) lucro;
– Do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, podendo ser adotadas alíquotas progressivas de acordo
com o valor do salário de contribuição, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo Regime
Geral de Previdência Social6;
– Sobre a receita de concursos de prognósticos.
– Do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar.
As receitas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios destinadas à seguridade
social constarão dos respectivos orçamentos, não integrando o orçamento da União. A
proposta de orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada pelos órgãos
responsáveis pela saúde, previdência social e assistência social, tendo em vista as metas e
4. Redação dada pela Emenda Constitucional 103, de 2019.
5. Redação conferida pela Emenda Constitucional 20, de 1998.
6. Redação dada pela Emenda Constitucional 103, de 2019.
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prioridades estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, assegurada a cada área a gestão
de seus recursos.
Conforme expressa determinação da Constituição Federal (artigo 195, § 3º) a pessoa
jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá
contratar com o poder público nem dele receber benefícios ou incentivos f‌iscais ou creditícios.
Ainda segundo a Lei Maior (§ 4º do 195), a lei poderá instituir outras fontes destina-
das a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, desde que por meio de lei
complementar, e com a observância das regras f‌ixadas no artigo 154, inciso I, da Lei Maior.7
Quer isso dizer que, para tal f‌im, a União poderá criar impostos, desde que editados por
lei complementar, que sejam não cumulativos e que não tenham fato gerador, ou base de
cálculo, iguais aos dos impostos já previstos na Constituição Federal.
São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades benef‌icentes de as-
sistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. O produtor, o parceiro, o
meeiro e o arrendatário rurais e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que
exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes,
contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado
da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei.
As contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada
poderão ter alíquotas diferenciadas em razão da atividade econômica, da utilização intensiva
de mão de obra, do porte da empresa ou da condição estrutural do mercado de trabalho,
sendo também autorizada a adoção de bases de cálculo diferenciadas apenas sobre a receita
ou o faturamento, ou o lucro.
Conforme dispõe o § 10 do artigo 195, da Lei Maior, a lei def‌inirá os critérios de trans-
ferência de recursos para o sistema único de saúde e ações de assistência social da União para
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e dos Estados para os Municípios, observada
a respectiva contrapartida de recursos.
SEGURIDADE SOCIAL
– A chamada seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da também
da sociedade, e se destina a assegurar a todos os direitos relativos a: (a) saúde, (b) previdência e (c) assistência social.
– A seguridade social será nanciada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orça-
mentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como de recursos obtidos através de contribuições sociais.
16.3 SAÚDE
Conforme preceitua o artigo 196, da Constituição da República, “a saúde é direito de
todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações
e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
O artigo 197 de nossa Carta Magna, por sua vez, dispõe serem de relevância pública as
ações e serviços de saúde, competindo ao Estado, nos termos da lei, dispor sobre sua regu-
7. Constituição Federal, artigo 154, inciso I: “A União poderá instituir: mediante lei complementar, impostos não previstos
no artigo anterior, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculo próprios dos discri-
minados nesta Constituição”.
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