Relações de trabalho lato sensu

AutorFrancisco Meton Marques De Lima/Francisco Péricles Rodrigues Marques De Lima
Ocupação do AutorMestre em Direito e Desenvolvimento pela UFC. Doutor em Direito Constitucional pela UFMG/Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará
Páginas90-102

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Relação de trabalho, como já exposto, compreende todas as formas de contrato de trabalho pessoal, público ou privado, autônomo, avulso, subordinado etc., enquanto relação de emprego constitui apenas uma das espécies de relação de trabalho. Por isso, doravante empregaremos a denominação contrato de emprego para designar a relação de emprego.

Relação de trabalho, diz Ives Gandra Martins Filho, é “uma relação jurídica de natureza contratual entre trabalhador (sempre pessoa física) e aquele para quem presta serviço (empregador ou tomador dos serviços, pessoas físicas ou jurídicas), que tem como objeto o trabalho remunerado em suas mais diversas formas”. Em outra passagem, inclui o trabalho voluntário (2005, p. 30-39). Logo, a relação de trabalho tem por objeto trabalho remunerado ou voluntário.

Com a nova redação do art. 114 da CF, que alentou a competência da Justiça do Trabalho para todas as relações de trabalho, a matéria agiganta-se na importância para os operadores do Direito do Trabalho. As relações de trabalho que não de emprego continuarão a reger-se pelas leis materiais respectivas, porém, no litígio, curvar-se-ão aos princípios do Direito do Trabalho e do Processo do Trabalho.

1. Trabalhador autônomo

“Embora prestando serviço em caráter permanente, não está obrigado a cumprir ordens do recebedor dos serviços” (SAMPAIO, Aluysio. Dicionário de direito do trabalho).

Diferencia-se do empregado por faltar a subordinação jurídica ou hierárquica. No contrato de emprego, o empregador contrata o empregado para prestar serviços; no contrato de autônomo, o tomador contrata o serviço, ou melhor, o resultado do serviço. O primeiro é a locação do operário; o segundo é a locação do serviço. O primeiro é regido pela CLT; o segundo, pelo Código Civil. Em regra, o empregador assume o risco, cumprindo ao trabalhador prestar o serviço ou pôr-se à disposição; já o autônomo assume o risco do serviço contratado, cumprindo-lhe entregá-lo feito.

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Amauri M. Nascimento resume: “Aqueles que detêm o poder de direção da própria atividade são autônomos e aqueles que alienam o poder de direção sobre o próprio trabalho para terceiros em troca de remuneração são subordinados”.

2. Trabalho eventual

O trabalhador eventual tem vinculação direta com o tomador do serviço, é subordinado, mas falta o requisito da continuidade dos serviços ajustados, cf. ensinamento de Russomano. É o trabalho subordinado, mas ao qual falta o requisito da “não eventualidade”, segundo os dois sentidos desse termo, cf. exposto no Capítulo seguinte, para onde remetemos o leitor.

3. Trabalho temporário

Já o trabalho temporário é um contrato de emprego que envolve três pessoas: o tomador do serviço, a empresa prestadora do serviço e o empregado desta, que é designado para trabalhar para o primeiro.

O trabalho temporário é regido pela Lei n. 6.019/74, cujo art. 2º dispõe: “Trabalho temporário é aquele prestado por pessoa física a uma empresa, para atender à necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de serviço”. O art. 10 limita em três meses a transitoriedade da prestação. O trabalhador é empregado, com contrato por tempo indeterminado ou por tempo determinado. Apenas não é empregado do tomador do serviço e a temporariedade diz respeito a este. Assim, por conta do seu vínculo empregatício com a empresa prestadora de serviço, ele trabalha meses para uma empresa, outros meses para outra, e assim sucessivamente.

A Lei n. 7.102/83 disciplina o serviço de vigilância nas instituições financeiras — abre exceção à regra do limite de 90 dias. E a Súmula n. 331 do TST, extensa e analítica, flexibiliza o trabalho temporário para admitir a terceirização sem limite de prazo dos serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador do serviço.

O temporário enquadra-se na terceirização de mão de obra, diferenciando-se dos terceirizados não temporários porque aquele se insere na atividade-fim da empresa, o que lhe assegura paridade de remuneração com os trabalhadores da mesma categoria da empresa. Outrossim, se a locação durar mais que o permitido em lei, o vínculo de emprego se transfere para a tomadora do serviço, o que não ocorre com a terceirização para atividades periféricas. No entanto, de modo algum, se forma o vínculo de emprego com órgãos da Administração Pública direta ou indireta, porque isto frustraria a regra do concurso público.

O contrato entre as empresas para trabalho temporário é formal, por escrito, devendo especificar os motivos da contratação, assim também, o contrato de emprego temporário será por escrito. Será nula a cláusula que proíba a contratação do obreiro pela tomadora de serviço.

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Direitos — O temporário goza de todos os direitos trabalhistas atribuídos aos demais empregados. A rescisão contratual se faz na forma dos demais contratos de emprego, tanto pode ser por tempo determinado como por tempo indeterminado, cf. o caso. Os fatos da justa causa e da despedida indireta tanto podem ser aferidos no local da empresa empregadora como no da prestadora de serviço.

Responsabilidade — Em caso de falência da prestadora de serviço, responde a empresa cliente solidariamente pelas obrigações sociais e trabalhistas do trabalhador posto a seu serviço, cf. art. 16 da Lei n. 6.019/74.

Destarte, não se aplica a essa forma de trabalho a Súmula n. 331 do TST, que atribui responsabilidade subsidiária à tomadora do serviço pelas obrigações trabalhistas não honradas da fornecedora da mão de obra.

Como se vê, essa modalidade de trabalho gera três espécies de relações jurídicas: uma civil, entre a fornecedora e a tomadora da mão de obra; uma de emprego, entre a fornecedora de mão de obra e o trabalhador; e uma de trabalho, entre este e a locadora do trabalho. Isso implica que qualquer dano que o operário vier a sofrer no local de trabalho, havendo culpa do tomador do serviço ou responsabilidade objetiva (art. 927, parágrafo único do Código Civil), este será o responsável principal, ou solidário, pela eventual reparação de danos. Ver mais no Capítulo XIII.

4. Trabalho avulso

Avulso é o trabalhador pessoa física que presta serviços sem a necessária continui-dade própria do empregado. Presta o serviço sem se inserir na organização da empresa. Pode ser subordinado ou não. Catharino distingue o avulso individual do avulso sindical. O primeiro presta serviços direta e isoladamente; o segundo, associado de sindicato para prestação de serviços, trabalha em conjunto: é a mão de obra sindical, requisitada por empresa a sindicato, a quem cumpre escolher e dirigir os associados que vão prestar o serviço solicitado. O Dec. n. 63.912/68 define como avulsos, entre outros: a) estivador, trabalhador de estiva em carvão e minérios e trabalhador em alvarenga; b) conferente de carga e descarga; c) consertador de carga e descarga; d) vigia portuário; e) avulso de capatazia; f) arrumador no comércio armazenador; g) ensacador de café, cacau, sal e similares; h) classificador de frutas; i) amarrador; j) trabalhador na indústria de extração do sal; e l) catadeiras e costureiras no comércio de café.

5. Trabalho portuário

O maior disciplinamento do trabalho avulso encontra-se na legislação do trabalho portuário, destacando-se a Lei n. 12.815/2013, que revogou a n. 8.630/93 e alterou a
n. 9.719/98, entre outras providências.

O trabalho portuário realiza-se por meio de trabalhadores avulsos e de empregados. Os avulsos podem organizar-se em cooperativa e por meio desta contratar seus serviços. O art. 40 da Lei n. 12.815/13 dispõe: “O trabalho portuário de capatazia, estiva,

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conferência de carga, conserto de carga, bloco e vigilância de embarcações, nos portos organizados, será realizado por trabalhadores portuários com vínculo empregatício a prazo indeterminado e por trabalhadores portuários avulsos”. O § 1º vai definir cada uma dessas atividades, que constituem categorias profissionais diferenciadas (§ 4º).

A contratação com vínculo empregatício para as atividades acima recairá entre os portuários avulsos registrados, vedado ao operador portuário locar ou tomar mão de obra sob regime temporário de que trata a Lei n. 6.019/74.

O art. 32 da Lei n. 12.815/13 preceitua:

Os operadores portuários devem constituir em cada porto organizado um órgão de gestão de mão de obra do trabalho portuário, destinado a:

I — administrar o fornecimento de mão de obra do trabalhador portuário e do trabalhador portuário avulso;

II — manter, com exclusividade, o cadastro do trabalhador portuário e o registro do trabalhador portuário avulso;

III — treinar e habilitar profissionalmente do trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro;

IV — selecionar e registrar o trabalhador portuário avulso;

V — estabelecer o número de vagas, a forma e a periodicidade para acesso ao registro do trabalhador portuário avulso;

VI — expedir os documentos de identificação do trabalhador portuário;

VII — arrecadar e repassar aos beneficiários, os valores devidos pelos operadores portuários relativos à remuneração do trabalhador portuário avulso e aos correspondentes encargos fiscais, sociais e previdenciários.

Parágrafo único. Caso celebrado contrato, acordo ou convenção coletiva de trabalho entre trabalhadores e os tomadores de serviços, o disposto no instrumento precederá o órgão gestor e dispensará sua intervenção entre capital e trabalho no porto.

O art. 28 da mesma lei relaciona as atividades em que é dispensável a intervenção de operadores portuários, como nas operações automatizadas ou mecanizadas; nas embarcações empregadas para obras públicas, no transporte de gêneros de pequena lavoura, na...

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