Vulnerabilidade da criança e do adolescente e a (in) constitucionalidade da lei de alienação parental

AutorCamila Buarque Cabral e Karina Barbosa Franco
Ocupação do AutorMestre em Direito Privado pela UFPE/Mestre em Direito Público pela UFAL
Páginas109-132
VULNERABILIDADE DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE E A (IN) CONSTITUCIONALIDADE
DA LEI DE ALIENAÇÃO PARENTAL
Camila Buarque Cabral
Mestre em Direito Privado pela UFPE. Professora Universitária. Pesquisadora do Grupo
de Pesquisa Constitucionalização das Relações Privadas (CONREP/UFPE). Advogada
com especialidade em Direito de Família e Sucessões.
Karina Barbosa Franco
Mestre em Direito Público pela UFAL. Professora Universitária. Membro do IBDFAM
e IBDCIVIL. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Constitucionalização das Relações
Privadas (CONREP/UFPE).
Sumario: 1. Introdução. 2. A vulnerabilidade da criança e do adolescente no âmbito das rela-
ções parentais. 2.1 Princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. 2.2 Princípio
da paternidade responsável. 3. A lei de alienação parental. 3.1 Ação Direta de Inconstitucio-
nalidade 6273. 3.2 O escopo da legislação. 4. Conclusão. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A partir da Constituição Federal de 1988, tem-se a clara percepção que o legislador
se preocupou com o aspecto da vulnerabilidade em relação à entidade familiar e todos os
membros que a integram, com inegável destaque para a prioridade de tutela das crianças
e adolescentes, sujeitos dotados de novo status de direito – pessoa em regular processo
de desenvolvimento com autonomia pessoa e ética.
No ordenamento pátrio, crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento,
abandonando-se a concepção de serem tratados como meros objetos sujeitos à interven-
ção estatal quando se encontravam em uma situação irregular, justif‌icando a tutela em
consonância com a doutrina da proteção integral e com prioridade absoluta.
Por conta da fragilidade, não têm capacidade de se autodesenvolver nos aspectos
intelectual, moral, social e afetivo, como também atender às suas necessidades básicas,
razão pela qual são vulneráveis e necessitam de cuidados especiais. E na parentalidade,
“o f‌ilho é sujeito a uma relação entre desiguais, caracterizada, tipicamente, pela vulnera-
bilidade e pela dependência do segundo em relação aos primeiros, uma vez que se trata
de pessoa em formação”1.
1. LAGE, Juliana de Sousa Gomes. Dano moral e alienação parental. In: TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado; DA-
DALTO, Luciana. (Coord.). Autoridade Parental: dilemas e desaf‌ios contemporâneos. Indaiatuba, SP: Foco, 2019,
p. 141-142.
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Partindo da análise das relações parentais que envolvem crianças e adolescentes,
sobressaem-se dois princípios norteadores que buscam orientar as relações e decisões: o
do melhor interesse e o da parentalidade responsável. O primeiro, previsto na Convenção
Internacional dos Direitos da Criança em 1989, e em âmbito nacional, disposto no art.
aliado ao princípio da proteção integral, previsto nos arts. 3º e 4º do mesmo Estatuto. O
segundo, com fundamento no art. 226, § 7º, no art. 229 da Constituição Federal de 1988
e no Código Civil, nos arts. 1.566, IV e 1.634, II, que consubstanciam a responsabilização
dos pais pela criação, assistência e educação dos f‌ilhos, o que se denominou “dever de
cuidado” pela ministra Nancy Andrighi no REsp n. 1.159.242/SP.
Ambos os princípios estão interligados com o exercício da autoridade parental, que
deve nortear o interesse dos f‌ilhos, e não em proveito dos próprios genitores, como será
visto ao longo da pesquisa.
Ocorre que mesmo diante da observância destes parâmetros nas relações
parentais que envolvem f‌ilhos menores, diante do rompimento conjugal ou convi-
vencial entre os pais, o processo de separação pode ensejar um cenário grave que é
a alienação parental.
No Brasil, a divulgação deste tema passou a ter maior atenção do Poder Judiciário
por volta de 2003, quando surgiram as primeiras decisões reconhecendo este fenô-
meno, muito mais antigo. Esta percepção começou a tomar corpo por conta da maior
participação das equipes interdisciplinares nos processos, culminando na publicação
da Lei n. 12.318/10, que conceitua alienação parental no seu art. 2º, elenca, de forma
exemplif‌icativa, diversas formas de sua ocorrência e prevê penalidades para o genitor
alienador.
O debate sobre a alienação parental é sempre necessário, atual e tem relevância
social e jurídica, cuja ocorrência fere, frontalmente, o direito fundamental da criança
e do adolescente à convivência familiar saudável, prejudicando o vínculo de afeto nas
relações com os genitores e com o grupo familiar, conf‌igurando, ainda, abuso moral pelo
descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental e precisa ser identif‌icada
para tornar efetivo o comando constitucional que assegura às crianças e aos adolescentes
proteção integral com prioridade absoluta, além de ser resguardado o direito fundamental
à convivência familiar saudável.
Diante deste contexto familiar e jurídico, a pesquisa se propõe a analisar e enfrentar
o tema da alienação parental e se as medidas previstas na legislação citada têm o condão
de cessar as condutas alienantes e restaurar a convivência familiar entre pais e f‌ilhos,
dando plena efetividade aos princípios do melhor interesse e da paternidade efetiva-
mente responsável. Ou se, ao revés disso, vão de encontro aos ditames preconizados na
constituição brasileira para proteção da criança e do adolescente nas relações parentais,
contrastando com a arguição de inconstitucionalidade da referida lei por meio da Ação
Direta n. 6273.
Para a pesquisa foram utilizadas várias fontes bibliográf‌icas como livros, artigos
científ‌icos, decisões e a legislação específ‌ica.
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