Antecedentes da institucionalização da proteção estatal ao patrimônio cultural no Brasil e evolução da política patrimonial

AutorMaria Coeli Simões Pires
Ocupação do AutorBacharel em Direito pela Pontifícia. Universidade Católica de Minas Gerais
Páginas137-161
Capítulo 3
Antecedentes da institucionalização
da proteção... estatal ao patrimônio cultural
no Brasil e evolução da política patrimonial
1. ANTECEDENTES DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PROTEÇÃO
AO PATRIMÔNIO CULTURAL
Segundo Garc ía Gallo:
“La utilid ade del estúdio histórico del Derecho r adica em um he-
cho indiscutible: que el passado está vivo em el presente, que
éste, em gran pa rte, no es sino herencia de nuestros antepas sados
enriquecida com nuestra propia aportación. Sise sabe cuando se
conocen las causas(scire est per causas scire), el Derecho actual
sólo puede conocerse cumplidamente i sabemos por quê es así,
de donde viene, como se há formado”.1
Eis por que se inicia a i nvestigação acerca do institutos juríd icos da
política patrimonial no Brasil pelo resgate de antecedentes de sua
institucionali zação.
José Afonso da Silva, t ratando da evolução da proteção ao Patrimônio
Cultural no Direito pátrio, situa, consoante Rodrigo M. F. de Andrade, sua
origem nos precedentes do Direito lus o, haja vista a s ubmissão da Colônia à
Metrópole.2
Buscando anal isar o marco fundador da mesma p olítica em Portugal,
lembra o constitucionalista3 que lá se cuidou de inserir, no direito interno,
1 GALLO, Garcí a. El por quê del estúdio de la hi storia del Derecho y util idade. Re-
vista Jurí dica General del Coleg io de Abogados de Madr id, 1988. p. 26, n. 21. Apud RO-
DRIGUEZ, Concepc ion Barrero. L a ordenaci on jurídica d el patrimôni o históri co.
Madrid: Ed itorial Civitas, 1990. p. 31.
2 SILVA, José Afonso da. O direito urb anístico brasile iro. São Paulo: Revista dos Tribu-
nais, 1981. pp. 482-3 (cf”. Patrimôn io histórico e art ístico, repertório enc iclopédico
do direito bra sileiro. pp. 186 e seg., v. 36).
3 SILVA, José Afonso da. O direito urb anístico brasile iro. São Paulo: Revista dos Tribu-
nais, 1981. pp. 482-3 (cf”. Patrimôn io histórico e art ístico, repertório enc iclopédico
do direito bra sileiro.pp. 186 e seg., v. 36).
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Da proteção ao patrimônio cultural
normas de proteção ao patrimôn io cultural, com muita precedência em re-
lação a outros povos:
“Por alvará de 28/8/1721, D. João proibiu que qualquer pessoa
desfigurasse ou destr uísse, no todo ou em parte, qualquer edif í-
cio que mostrasse ser dos tempos dos fenícios, gregos, roma nos,
godos ou arábicos, assim como monumentos em que houvesse
esculpida alguma figura ou que tivessem letreiros fenícios, g re-
gos, romanos, góticos ou arábicos, incorrendo os infratores nas
penas impostas p ela Ordenação do Livro 5, Tít. 12, parágrafo 5 º”.
Na linha daquele reg istro, Portugal constr uiu uma sólida política de
proteção, até a institu ição do regime da Classific ação, que até hoje prevalece.
No Brasil, ainda no período colonial, e portanto, sob os auspícios do
Direito Luso, o primeiro sinal de alerta contra a omissão do Poder Público
na proteção dos monumentos históricos foi dado por D. André de Melo e
Castro, Conde das Galveias, em 1742, quando exped iu o primeiro ato prote-
cionista. Tomando conhecimento de que, em Pernambuco, o Palácio das
Duas Torres seria transformado em quartel e de que outras decisões assola-
riam o patri mônio cultural daquele Estado, man ifestou veemente protesto
contra essas medida s, em carta que enviou ao então Governador Luís Perei-
ra Freire de Andrade. Em várias passagens de sua car ta, D. André deixava
nítidos sinais de seu espírito conser vador; demonstrava ainda perceber a
complexidade dos problemas envolvidos na preservaç ão de monumentos de
valor artís tico e histórico, conforme se apreende do excerto:
“Pelo que respeita aos Quartéis que se pretendem mudar para o
Palácio das Dua s Torres, obra de Conde Maurício de Nassau, em
que os Governadores fazem a sua assistência, me lastimo muito
que se haja de entregar ao uso violento e pouco cuidadoso dos
soldados, que em pouco tempo reduzirão aquela fábr ica a uma
total desolação, mas ainda me lastima mais que, com ela, se ar-
ruinará também uma memória que mudamente está recomen-
dando à posteridade as ilustres e famosas ações que obraram os
Portugueses na Restauração dessa Capitan ia [...] as fábricas em
que se incluem as estimáveis circunstâncias (referidas) [...] são li-
vros que falam, sem que seja necessário lê-los [...]; se necessitasse
absolutamente, para defensa dessa Praça, que se demolisse o Pa-
lácio, e com ele uma memória tão ilustre, paciência, porque esta
mesma desgraça têm ex perimentado outros edif ícios igualmente
famosos; mas, para nós, poupar mos a despesa de dez ou doze mil
cruzados é cousa i ndigna que se saiba que, por um preço tão vil,
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