Diferentes formas de testamento

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DIFERENTES FORMAS DE TESTAMENTO
13.1 INTRODUÇÃO
O testamento é negócio jurídico personalíssimo, unilateral e solene, cuja ef‌icácia
depende da obediência à forma prescrita em lei. O cumprimento das formalidades
essenciais do testamento tem como objetivo o resguardo de sua autenticidade e a
garantia da liberdade do testador. Ainda, a solenidade do ato de testar procura chamar
a atenção para a seriedade do passo que está sendo dado, obrigando o hereditando
a pensar1.
O Código Civil de 2002, inspirado no sistema do Code Napoléon, permite que
a manifestação de vontade se exteriorize, ordinariamente, por meio de três formas
de testamento: o público, o cerrado e o particular (art. 1.862). Também se admite,
excepcionalmente, quando as condições o impuserem, o recurso a três formas es-
peciais de testamento: o marítimo, o aeronáutico e o militar (art. 1.886).
Somente é lícito recorrer às formas estabelecidas pela legislação para dispor
de bens por última vontade2. De fato, o Código Civil estabeleceu previamente as
formas válidas de testamento, somente sendo possível a escolha de um dos tipos
constantes da lei3. Como se trata de um rol taxativo (numerus clausus), aquele que
deseja testar não pode criar uma forma testamentária nova, nem pode combinar
as formas existentes, criando uma forma híbrida4. Por conseguinte, não se admite
testamento inominado e nem testamento atípico, existindo tipos que devem ser
respeitados (Typenzwang), à semelhança do que ocorre com o direito das cosas5.
A forma representa um pressuposto necessário do negócio jurídico testa-
mentário. A declaração de alguém, ainda que autêntica e solene, dispondo de seus
bens para depois de sua morte, será nula e não terá ef‌icácia se externada por modo
diverso do prescrito em lei (art. 104, III). Nessa linha, o art. 1.887 proclama não se
1. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, v. 7, p. 257.
2. O Código Civil, na linha do estabelecido no direito das sucessões de outros países da Civil Law, apresenta
um rol taxativo das formas testamentárias admitidas, o que se explica pela natureza especial das relações
reguladas. Esse também é o sistema adotado, por exemplo, pelo direito alemão, que exige a feitura do
ato de última vontade em conformidade com a forma requerida pela legislação (Typenzwang), no que se
diferencia do direito das obrigações (LEIPOLD, Dieter. Erbrecht, p. 129).
3. CHAVES, Carlos Fernando Brasil. Direito sucessório testamentário, p. 51.
4. VELOSO, Zeno. Direito Civil: temas, p. 332.
5. FRANK, Rainer; HELMS, Tobias. Erbrecht, p. 3.
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DIREITO CIVIL – DIREITO DAS SUCESSÕES • Leonardo estevam de assis Zanini
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admitirem outros testamentos especiais além dos nele contemplados. O mesmo é
válido no que toca aos testamentos ordinários, que também devem ser elaborados
com a observância das formalidades enumeradas pela lei, cujo descumprimento
leva à nulidade.
Tal nulidade é absoluta, na forma do art. 166, IV, podendo, portanto, e de acordo
com o estabelecido no parágrafo único do art. 168, ser decretada de ofício pelo juiz
quando conhecer do negócio jurídico e a encontrar provada. O testamento nulo não
transfere a propriedade do patrimônio do testador para os herdeiros e legatários.
Em todo caso, apesar do testamento ser um dos atos mais solenes do direito
brasileiro, é certo que o Código Civil de 2002 procurou simplif‌icar a sua elaboração,
seguindo tendência das modernas legislações no sentido de facilitar o acesso de todos
ao negócio jurídico testamentário6.
13.2 A INVALIDADE DO TESTAMENTO CONJUNTIVO
O Código Civil, no intuito de evitar qualquer tipo de dúvida, proibiu expres-
samente o testamento conjuntivo, seja ele simultâneo, recíproco ou correspectivo
(art. 1.863)7.
O testamento conjuntivo, também conhecido como conjunto, de mão comum
ou mancomunado, é aquele em que duas pessoas ou mais pessoas, mediante um
único instrumento, isto é, num mesmo ato de última vontade, fazem disposições
acerca de seus bens8.
Existem três formas de testamento conjuntivo. O testamento conjuntivo é si-
multâneo se os testadores dispõem, num só ato (uno contextu), em favor de terceiros.
É recíproco quando os testadores instituem benefícios mútuos, recíprocos, um em
favor do outro (cada testador gratif‌ica o outro), de modo que o sobrevivente recolherá
a herança do outro. É correspectivo quando os testadores efetuam disposições em
retribuição de outras correspondentes, sempre no mesmo ato9.
É inegável o caráter pactício do testamento conjuntivo, particularmente nas
espécies chamadas recíproca e correspectiva. Assim sendo, como o Código Civil veda
o contrato sobre herança de pessoa viva (art. 426), por conter um votum mortis de
indiscutível imoralidade, proíbe, consequentemente, o testamento de mão comum.
6. Nessa linha, Miguel Reale, coordenador-geral da Comissão de Juristas encarregada da elaboração do Ante-
projeto, asseverou que, na seara do direito das sucessões, um dos pontos cardeais do Código Civil de 2002
foi a: “Simplif‌icação, em geral, dos atos de testar, sem perda, todavia, dos valores de certeza e segurança”
(REALE, Miguel. O projeto do novo código civil, p. 94).
7. Antes da vigência do Código Civil de 1916, a doutrina admitia o testamento de mão comum, desde que feito
por marido e mulher, com instituição recíproca (NERY, Rosa Maria de Andrade; NERY JUNIOR, Nelson.
Instituições de direito civil, v. IV, p. 711).
8. RODRIGUES, Silvio. Direito civil: Direito das Sucessões, v. 7, p. 157.
9. MIRANDA, Darcy Arruda. Anotações ao Código Civil brasileiro, v. 3, p. 679.
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