Falência e recuperação de empresas

AutorSuhel Sarhan Júnior
Ocupação do AutorMestre e Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
Páginas227-303
Capítulo XIII
FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO
DE EMPRESAS
Antes de se estudarem os institutos que podem ser aplicados
para a atividade empresarial em crise, importante esclarecer os mo-
tivos pelos quais há uma legislação específica só para regê-la em
momentos desfavoráveis.
O questionamento inicial é: por que o legislador dispensou
atenção especial a empresa em crise, elaborando para ela institu-
tos específicos, que até poderão beneficiá-la e de forma contrária
não deu a mesma importância para as pessoas físicas ou demais
pessoas jurídicas não empresárias em crise?
A resposta é simples e objetiva: A empresa, exercida em forma
individual ou em sociedade, é importante instrumento de fomento
da economia, haja vista que a maior parte da mão de obra brasileira
é absorvida por ela, o que implica dizer que quantos mais empresas
existirem maior será a contratação de trabalhadores, o que, por
consequência, quanto mais pessoas empregadas tivermos, mais
consumidores estarão nas ruas comprando o que, por fim, acarreta-
rá na necessidade da empresa contratar mais trabalhadores.
Enfim, a empresa movimenta o ciclo da economia, de forma
que sua crise pode gerar impactos enormes para toda uma região,
um Estado ou até mesmo ao país, em virtude do efeito cascata de-
corrente, explico.
Em São José dos Campos, interior de São Paulo, situa-se a EM-
BRAER, empresa brasileira que atua na construção e comercializa-
ção de aeronaves militares e comerciais. A EMBRAER atualmente
contrata cerca de vinte mil funcionários diretos, ou seja, se multi-
plicarmos esse dado pelo número de pessoas que dependem desses
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funcionários, caso ela feche, serão oitenta mil pessoas em São José
dos Campos que perderão seu poder de compra.
Isso implica dizer que são consumidores que deixarão de gastar
no comércio, tirarão seus filhos do curso de inglês, não comprarão
mais carros e até entrarão nos supermercados, mas apenas para
comprar produtos de necessidade básica.
Dessa forma, o comércio de São José dos Campos venderá me-
nos e com isso começará a demitir. Isso sem contar que a EM-
BRAER compra peças de fábricas terceirizadas e deixará de com-
prar e com isso mais demissões virão. A EMBRAER contrata servi-
ços de consultoria e deixará de contratar e com isso mais demissões
virão.
Enfim, o efeito é cascata e pode se alastrar para diferentes seto-
res da economia. Por isso, preocupou-se o legislador em reger a em-
presa em crise e não deu essa mesma importância para as demais.
Assim também entende Waldo Fazzio Júnior. Manual de Direi-
to Comercial (2015, p. 596):
A atividade empresarial afeta o mercado e a sociedade. O modo de
produção econômica, no sistema capitalista, é determinante das de-
mais instâncias sociais. Por isso, o interesse de agir nos processos regi-
dos pela LRE reside na necessidade de um provimento judiciário para
deslindar não só a crise econômico-financeira de um empresário, mas
toda espécie de relações daí decorrentes e suas repercussões sociais.
A preservação da atividade negocial é o ponto mais delicado do regi-
me jurídico de insolvência. Só deve ser liquidada a empresa inviável,
ou seja, aquela que não comporta uma reorganização eficiente ou não
justifica o desejável resgate.
A legislação que se aplica para reger a empresa em crise é a Lei
n. 11.101/05, conhecida como Lei de Falência e de Recuperação
de Empresas. Até o ano de 2005, a empresa em crise era regida
pelo Decreto n. 7.661/45.
Atualmente dois institutos podem ser aplicados para a empresa
que passa por crise: Falência ou Recuperação de Empresas. A recu-
peração, por sua vez, poderá se dar de forma judicial ou extraju-
dicial.
Importante consignar que muito embora sejam dois institutos
previstos na mesma lei e que se aplicam para a empresa em crise,
são autônomos e independentes entre si. Não há a necessidade de
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se recuperar a empresa para só depois aplicar a falência, em absolu-
to: A falência pode se dar diretamente.
É bem verdade, como se verá, que em muitos casos tenta se re-
cuperar a empresa, restando-se infrutífera a tentativa, decreta-se a
falência, mas não que isso seja uma obrigação.
Por serem institutos autônomos, previstos na mesma lei e que
se aplicam à empresa em crise, como saber se aplicar a recuperação
ou a falência? A resposta será dada no decorrer da obra. Todavia, de
início, a resposta é a clássica do direito: depende.
Dependendo do estágio da crise da atividade empresarial apli-
ca-se a falência ou a recuperação, exemplifico.
Imagine um restaurante localizado na cidade de Ubatuba – SP,
litoral norte do Estado de São Paulo. Cidades litorâneas são conhe-
cidas por serem sazonais, ou seja, há um fluxo grande de pessoas em
determinada época do ano e em outros não. Imagine, dessa manei-
ra, que nos meses de maio, junho, julho, agosto e setembro, tal res-
taurante devido ao baixo movimento não conseguiu pagar alguns
funcionários, não cumpriu com todos os impostos e possui dívidas
de esfera civil, principalmente decorrente do contrato de locação
do ponto comercial. É evidente que essa empresa está passando por
crise, mas os sócios sabem que dezembro irá chegar, que terá virada
de ano, férias escolares e carnaval. Enfim, sabem que a maré irá me-
lhor. Veja que essa empresa passa por crise, mas ainda é viável. As-
sim, deve ser concedida a recuperação.
Por outro lado, há crises em que a situação é mais drástica, ela
já se agravou de determinada maneira que praticamente o passivo
da empresa já superou seu ativo. Em tais situações, outra solução
não se vislumbra senão o encerramento das atividades por meio do
procedimento falimentar.
1. Causas da Crise
A crise empresarial não pode ser analisada sob apenas um viés,
pois seria tratá-la de forma simples e abstrata, mostrando-se mais
complexa que isso.
Em primeiro, existem fatores externos e internos que podem
afetar a atividade empresarial. Na maior parte das vezes tentam as-
sociá-la a má gestão de seus administradores, sócios ou diretores,
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