Princípios aplicáveis ao direito de trânsito

AutorAlexandre Matos
Páginas87-113
87
12
pRINCÍpIOS ApLICÁVEIS AO DIREITO DE TRÂNSITO12
Oprocessoadministrativodevetercomonalidadeprecípuaatrans-
parênciaeobjetividadenosmeiosutilizadospelaadministraçãopública
nassuasdecisões,devendoassegurartodasasgarantiaseaspectosdecida-
daniadosadministrados.
Osprincípiossãopilaresquesustentamoordenamentojurídico,ser-
vindocomo base paratodas as normaspositivadas.Assim,os princípios
sobrepõem-seataisnormas,tornandoeivadasdevícioinsanávelqualquer
delasquelhessãocontrárias.
As normas jurídicas podem ser objeto de várias interpretações, de
modoqueosprincípiosservemcomoaplicadordanorma,osquaisatuan-
doem determinadocaso concretodeterminarãoa aplicaçãodanorma de
acordocomosvaloresfundamentaisdosistemajurídico.
Existemváriosprincípiosnosistemajurídicobrasileiro,sendoqueal-
gunsdelessãoaplicáveisàsnormasdequalquerramododireito,enquanto
outrosdestinam-se exclusivamentea determinadoramo dodireito,como
osprincípiosdedireitodotrabalho,princípiosdedireitoprocessualpenal,
12 Capítuloelaboradocom basenoartigo “Osprocessos administrativosdesuspensão e
cassaçãododireitodedirigirveículosautomotoresàluzdosprincípiosconstitucionais
eadministrativos”, revista UniCuritiba,v.2, n. 39,2015, em coautoriacom Marcos
Alves da Silva. Disponível em:
download/1309/877>.
Alexandre Matos
88
porexemplo.Nopresentecaso,analisaram-seosprincípiosespecícose
osprincípiosgeraistambémaplicadosaodireitoadministrativo.
Noprocessoadministrativo,incidemtantoprincípiosexclusivosaele
comoaquelestambémaplicáveisaoutrosramosdodireito.
Muitos dos princípios direcionados ao processo administrativo en-
contram-seexpressosnoart.37daCF/1988:legalidade, impessoalidade,
moralidade,publicidadeeeciência.Existemoutrosprincípiosqueforam
instituídospelasconstituiçõesestaduais.Oart.111daConstituiçãodoEs-
tadodeSãoPauloacrescentourazoabilidade,nalidade,motivaçãoeinte-
ressepúblico.
Seráabordadoneste capítulo aqueles princípios de maior aplicabi-
lidadeeutilidadepráticano processoadministrativo, considerandoque a
relevânciada aplicabilidade dos princípios dependerá das condiçõesen-
contradasemcadacasoconcreto.
12.1 pRINCÍpIOS DA LEGALIDADE E do DEVIDO pROCESSO LEGAL
Oprincípiodalegalidadeencontra-seprevistonoincisoIIdo art.5º
daCF/1988,que determinaque“II–ninguém seráobrigadoafazerou a
deixardefazeralgumacoisasenãoemvirtudedalei”.
ACF/1988,noseuart.5°,II,trazoelementarprincípiodalegalidade,
queparaopoderpúblicodeveseraplicadodeformaestrita,determinando
quea administraçãosomente poderáfazer oquea leimanda, dentrodos
seuslimitesevisando umanalidade pública.Alegalidadetem om de
garantirumamaiorsegurançajurídica.
Oart. 37,caput, denossa CartaMagna,estabelece que“a adminis-
traçãopúblicadiretaeindiretadequalquerdosPoderesdaUnião,dosEs-
tados,do Distrito Federal edosMunicípios obedecerá aos princípios de
legalidade,impessoalidade,moralidade,publicidadeeeciência”.
Todoequalqueratodaautoridadeadministrativadeveseguiraleinos
seusestritostermos.Asrelaçõesjurídicasdedireitopúblicodiferem-sedas
dedireitoprivado,poisenquantoosparticulares podemfazertudo aquilo
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
89
quea lei não proíbe,àadministração pública cabe seguir estritamenteo
quealeidetermina,porissodiz-sequeaadministraçãoobedeceaoprincí-
piodaestritalegalidade.
OensinamentodeHelyLopesMeirelles(2016,p.93)acercadaques-
tãoénoseguintesentido:
Alegalidade,comoprincípio deadministração(CF,art.37, caput)
signicaque o administrador público está, em todasua atividade
funcional,sujeitoaosmandamentosdalei,easexigênciasdo bem
comum,edelesnãosepodeafastaroudesviar,sobpenadepraticar
atoinválidoeexpor-searesponsabilidadedisciplinar,civilecrimi-
nal,conformeocaso.
Extrai-sedaliçãodeCelsoAntônioBandeiradeMello(2009,p.100-
101)queoprincípiodalegalidadeéincompatívelcomqualquerautorita-
rismo,tendocomofundamentoasoberaniapopulareacidadania:
Oprincípiodalegalidadecontrapõe-se,portantoe visceralmente,a
quaisquertendênciasdeexacerbaçãopersonalista dosgovernantes,
Opõe-seatodasasformasdepoderautoritário,desdeoabsolutista,
contraoqualirrompeu,atéasmanifestações caudilhescasoumes-
siânicastípicas dospaíses subdesenvolvidos. Oprincípio da lega-
lidadeéo antídoto natural do poder monocrático ou oligárquico,
poistem como raiz a ideiade soberania popular, deexaltação da
cidadania.Nestaúltimaseconsagraaradicalsubversãodoanterior
esquemadepoderassentadonarelaçãosoberano-súdito(submisso).
Instaura-seoprincípiode que todo poder emana do povo, de tal
sortequeoscidadãoséquesãoproclamadoscomoosdetentoresdo
poder.Os governantesnada mais são,pois,que representantes da
sociedade.O art.1º, parágrafo único,da Constituição dispõeque:
“Todoopoderemanadopovo,queoexercepor meioderepresen-
tanteseleitosoudiretamente,nostermosdestaConstituição”.Além
disto,éarepresentaçãopopular,oLegislativo,quedeve,impessoal-
mente,deninaleienaconformidadedaConstituiçãoosinteresses
públicoseosmeiosemodosdepersegui-los,cabendoaoExecutivo,
cumprindoditas leis, dar-lhes a concreção necessária. Por isto se
diz,naconformidadedamáximaoriundadoDireitoinglês que,no
Estadode Direitoquer-seogovernodasleis enão odos homens;
imperaarule of law, not of men.
Alexandre Matos
90
Assim,o princípio da legalidade é o da completa submissãoda
Administraçãoàsleis.Estadevetãosomenteobedecê-las,cumpri-
-las,pô-lasemprática.Daíqueaatividadedetodososseusagen-
tes,desdeoqueocupaacúspide,istoé,oPresidentedaRepública,
atéo mais modesto dos servidores,só pode ser a dedóceis,re-
verentes,obsequiososcumpridoresdasdisposições geraisxadas
peloPoderLegislativo,poisestaéaposiçãoquelhescompeteno
Direitobrasileiro.
reverentes, obsequiosos,asileiroentes cabendo ao Executivoosade
daConstituiçndamentoasoberaniapopulareacidadania:
Parao citado doutrinador cabe à administração prover ao interesse
público,demodoaconcretizaroquealeijáabstratamenteestabelece:
Oprincípiodalegalidade,noBrasil,signicaqueaAdministração
nadapodefazersenãooquealeidetermina.
Aocontráriodosparticulares,osquaispodemfazertudooquealei
nãoproíbe, aAdministraçãosó podefazero quea leiantecipada-
menteautorize.Donde,administraréproveraosinteressespúblicos,
assimcaracterizadosemlei,fazendo-ona conformidadedosmeios
eformasnelaestabelecidosouparticularizadossegundosuasdispo-
sições.Segue-sequeaatividadeadministrativaconsiste naprodu-
çãodedecisõesecomportamentosque,naformaçãoescalonadado
Direito,agregamníveis maioresdeconcreção aoquejá secontém
abstratamentenasleis(2009,p.105).
Desse modo, os atos praticados pela administração pública devem
cingir-seaosditames dalei, sobpena desereminvalidados,sujeitandoo
agentepúblicoàresponsabilizaçãodisciplinar,civilecriminal.
Insta ressaltar que o princípio da legalidade, além da incidência
sobreas atividadesadministrativas,estende-se à atividadelegislativa e
judiciária.Portanto,todasasatividadesdoEstadodevemseguiradeter-
minaçãodalei.
Emvirtudedoprincípiodalegalidade,MariaSylviaZanellaDiPietro
(2011,p.65)ensina que“aAdministraçãoPública nãopode,porsimples
atoadministrativo, concederdireitosde quaisquerespécies,criar obriga-
çõesouimporvedaçõesaosadministrados;paratantoeladependedalei”.
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
91
Oprincípiododevidoprocessolegalestáprevistonoart.5°,LIV,da
CF/1988,que determina:“ninguém seráprivadoda liberdadeou deseus
benssemodevidoprocessolegal”.Esseprincípiodásustentaçãoaoutros
princípiosegarantiasexistentesnosistemajurídico,comosugereaprópria
expressão,está-sediantedeumasériedeprincípiosenormaslegaisecons-
titucionaisque deverãoser aplicadasno processopara,ao nal,alcançar
umresultadoamparadopelaCF/1988.
Járeetimos sobretaisprincípios em outraoportunidade (MATOS,
SILVA,2015,p.134):
O princípio do devido processo legal passou a existir de forma
explícitano sistemajurídicobrasileiro apartirda Constituiçãode
1988.Issonãosignicaquetalgarantianãoexistisse, poispoderia
serextraída dainterpretação sistemática doordenamento jurídico;
noentanto, o quea Constituição vigente fezfoi torná-la explícita
einquestionável,inspirada pelacláusula dodue process of lawdo
direitoinglêsenorte-americano.
Pormeiodo princípioemcomento, todae qualquerdecisãotoma-
dadentro de umprocesso, seja ela comconsequências no âmbito
pessoalou patrimonial, deve estar amparada em prévia aplicação
dasgarantiasprocessuaislegalmenteestabelecidas, assegurandoàs
partesquenãohaverádecisãoarbitrária,nemconstriçãodebensou
restriçãodedireitossemasgarantiasdoprocesso.
Oprincípiododevidoprocessolegalécomplementadopelasgaran-
tiasconstitucionaisdodireitodeacessoàjustiça,previstonoart.5º,
XXXV,daCF(aleinãoexcluirádaapreciaçãodoPoderJudiciário
lesãoouameaçaadireito),docontraditórioedaampladefesa,com
previsãono art. 5º,LV,daCF (“LV– aoslitigantes, em processo
judicialou administrativo, e aosacusados em geral sãoassegura-
dosocontraditórioeampladefesa,comosmeioserecursosaela
inerentes”)13.
Oprincípiododevidoprocessolegalserefereatodoequalquerpro-
cesso,portanto,tambémdiz respeitoaoprocessoadministrativo.Nocaso
doprocessoadministrativosancionador,torna-seimprescindívelapresen-
çadas garantias do devido processo legal, tendo em vista quediscutea
13 Disponívelem:.
Alexandre Matos
92
imposiçãodepenalidaderestritivadedireitos,merecendoumaatençãoes-
pecialdaautoridadeadministrativa.
Aobediênciaaesseprincípiocomtodasasformasinstrumentaisne-
cessáriasgarantealegitimidadedeumasentençajudicialoudeumadeci-
sãodaautoridadeadministrativa.Dessaforma,sejanoprocessojudicialou
administrativo,analidadeéabuscadaverdadeeaaplicaçãodajustiça.
Comosesabe,nodireitoprivado,avontadedaspartesnarealização
donegócio ouato jurídico éregida peloprincípioda autonomiada von-
tade,independentementedeprevisãolegal.Noprincípiodaautonomiada
vontadeprevalecealiberdadeparacontratar,desdequenãohajaviolação
àsnormasdeordempúblicaouaosbonscostumes.Jánodireitoadminis-
trativo,tal princípio nãotemaplicabilidade, uma vezquea atividade da
administraçãopública deve serestritamentepermitida pela lei. Portanto,
cabeàadministraçãopraticarseusatosdeacordo coma previsãolegal e
dentrodeseuslimites.
Naspalavras de Nelson Nery Junior(1995, p.35),“este fenômeno
quesepodechamardesubmissãodaadministraçãoàlei,dopontodevista
prático,retratamanifestamenteanoçãodeestadodedireito”.
Dessaforma, aaplicação dodevidoprocesso legalno direitoadmi-
nistrativodecorredodeverdaadministraçãopúblicaemrealizarseusatos
dentrodoestritomandamentolegal. Osprocessosadministrativosdesus-
pensãoecassaçãotemnaturezapunitiva,tendoemvistaquetaispenalida-
desconsistememverdadeirapenarestritivadedireitosaplicadaspelaau-
toridadeadministrativa,logo,devetramitarconformeagarantiadodevido
processolegal.
EnsinaLúciaValleFigueiredo(2004,p.350),que asgarantiasase-
rem adotadas nos procedimentos administrativos que ensejam punições
disciplinaresousançõesadministrativasdevemserasgarantiasdoproces-
sopenal:
Deveras, se os recursos forem interpostos de decisões emanadas
em procedimentos administrativos (nominados ou inominados),
quenãorelativosa puniçõesdisciplinaresou sançõesadministrati-
vas,devemosentenderqueas garantiasdeverãoserasdoprocesso
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
93
judicialcivil.Enquantoqueparaosúltimos(osdisciplinaresesan-
cionatórios)deverãovigerasgarantiasdoprocessojudicialpenal.
Épontopacícoqueoprocessoadministrativocapazdeaplicarsan-
çõesaocidadãodevaprocederpormeiodoindispensávelprincípiododevi-
doprocessolegaleasdemaisgarantiasdestinadasatornaroprocedimento
legítimo,evitandoatomadadedecisõesarbitráriaseinjustasnoprocesso,
ondeaAdministraçãoPúblicaatuacomoórgãoacusatórioejulgador.
12.2 pRINCÍpIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMpLA DEFESA14
Osprincípiosdocontraditórioedaampladefesaestãoexpressamente
estabelecidosnoart.5º,LV,daCF/1988:“aoslitigantes,emprocessojudi-
cialouadministrativo,eaos acusadosemgeralsãoasseguradosocontra-
ditórioeampladefesa,comosmeioserecursosaelainerentes”.
Nosprocessosemquehajaopoderestataldesanção,ouseja,aplica-
çãodeumapuniçãoàspessoasfísicasoujurídicas,devemseraplicadosos
princípiosdocontraditórioe daampladefesa,principalmenteondeexista
litígioentreaspartesenvolvidas.
Partindodoprincípiodequetodaaçãogeraumareação,osprincípios
docontraditórioedaampladefesaestãoligadosaodireitoquetodocida-
dãotemdesedefenderdequalqueracusaçãoquelhesejaimputada.
Ocontraditórioé frutoda bilateralidadedoprocesso,noqual sede-
vemouvir todasaspartes envolvidas,havendoa alegaçãodeuma parte,
a outra tem o direito de contradizer o alegado (MATOS; SILVA,2015,
p.135-136).
Essesprincípios envolvem um complexo deatos,possibilitando ao
acusadoo conhecimento da acusação, devendosercienticado de todos
14 Capítuloelaborado com baseem “Os processosadministrativos de suspensãoe cas-
saçãodo direito de dirigirveículos automotores à luz dosprincípios constitucionais
eadministrativos”, revista UniCuritiba,v.2, n. 39,2015, em coautoriacom Marcos
Alves da Silva. Disponível em:
download/1309/877>.
Alexandre Matos
94
osatospraticados noprocesso.Ocontraditórioe aampladefesatambém
estãoligadosaoutrosprincípios,como,porexemplo, oduplograude ju-
risdição,o qual possibilitao reexame deumadecisão por umainstância
superior,tambémnoprocessoadministrativodevehaverapossibilidadede
apreciaçãodadecisãoporumainstânciaadministrativasuperior.
Taisprincípiosdevem envolvertodo equalquer processo,possibili-
tandoaointeressadoaproduçãodeprovas,oexameeacontestaçãoquanto
aosargumentosapresentados.
Paraquealguémpossaexercerodireitodedefesanoprocessoadmi-
nistrativopunitivo,é essencialainformação adequadaquantoàacusação
feita,dando-lhe aoportunidadede acessoaosautos, deapresentardocu-
mentos,deproduzirprovas,deconheceramotivaçãoefundamentaçãoda
decisãoproferida.
Destaque-seque,nemmesmonoscasos deurgência,estáafastadaa
obrigatoriedadedosprincípiosemquestão,e,porisso,nãopoderáaadmi-
nistração,porcontaprópria,deixardeofereceragarantiaporeleestabele-
cida,noentanto,poderárecorreraoPoderJudiciário,requerendoliminar-
menteopedido(MATOS;SILVA,2015,p.135-136).
Contudo,excepcionalmente,aAdministraçãopoderáatuarimediata-
mente,quandoademoranaprovidênciainviabilizarumaatuaçãoposterior.
AliçãodeCelsoAntônioBandeiradeMelloénoseguintesentido:“admi-
tir-se-á,contudo,açãoimediatadaprópriaAdministraçãosemasreferidas
cautelasapenasetãosomentequando otempoa serconsumidonabusca
da via judicial inviabilizaria a proteção do bem jurídico ser defendido”
(MELLO,2009,p.116).
Somentepormeiodoprocessoadministrativo,queresguardeaampla
defesaeocontraditório,épossívelaaplicaçãodequalquerpenalidadead-
ministrativa,paraquenãosemostremferidosospreceitosconstitucionais,
tendoemvistaqueoBrasil,comoumEstadoDemocráticodeDireito,pre-
servaaigualdadeentre seuscidadãos, resguardandoa todososlitigantes
emprocesso judicialouadministrativo ocontraditório,ou seja,odireito
conheceresemanifestaracercadequalqueracusaçãoquelheéfeitaepo-
dendodemonstrarsuaversãodosfatosdiscutidosnoprocesso,bemcomo
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
95
daampladefesa,istoé,odireitodeutilizardetodososmeioslegalmente
admitidosparasedefendereprovarsuainocência.
Acercadaaplicaçãodosprincípiosdocontraditórioedaampladefesa
nosprocessosadministrativos,GilmarFerreiraMendes(2009,p.602)traz
aobservaçãodeque,“sobaConstituiçãode1988,oSupremoTribunalFe-
deralxouentendimentodequeosprincípiosdocontraditórioedaampla
defesasão assegurados nos processosadministrativos,tanto em temade
puniçõesdisciplinarescomoderestriçãodedireitosemgeral”.
Aplicandoosprincípiosemestudo,oTribunaldeJustiçadoEstadode
SãoPaulo,emjulgamentodeApelação15,datadode9dedezembrode2009,
anuloumultadetrânsitonostermosdaementaqueseguetranscritaabaixo:
AnulatóriademultadetrânsitoAusênciadenoticaçãoprévia.No-
ticaçãodainfraçãoconcomitantementeànoticaçãodaimposição
damulta–Ausênciaquecolidecomodireitoconstitucionaldaam-
pladefesaedo contraditório.Indispensabilidadedadupla notica-
ção–súmulan. 312doSTJ Obrigatoriedadedaimediata aplicação
dasançãoadministrativaelencada noartigo218,III doCTB–im-
possibilidade.Autosdeinfração àlegislação detrânsito quesere-
vestemdospressupostosdoartigo 280doCTB.Anulaçãodosatos
deinfração. Possibilidade. Sentença reformadapara julgar a ação
procedente.Recursodosautoresprovido.
É inegável a aplicabilidade dos princípios basilares previstos na
CF/1988,comoosprincípios docontraditórioedaampladefesa,vez que
qualqueratoouatémesmoaleiqueofendaqualquerdeles,estámaculado
devícioinsanável,devendoserinvalidados.
12.3 pRINCÍpIO DA IMpESSOALIDADE
Conformejámencionamosemoutraoportunidade(SILVA;MATOS,
2015,p.136),
15 ApelaçãoCívelcomRevisãonº387.081.5-0/00,9ªCâmaradeDireitoPúblico,Relator:
OswaldoLuizPalu,DatadoJulgamento09/12/2009.
Alexandre Matos
96
Pelo princípio da impessoalidade, a AdministraçãoPública deve
agirdeformaigualitáriacomtodososcidadãos,demodoqueoato
administrativonãofaçadistinçãoentreaspessoas.Tambémdecorre
desseprincípioofatodequeoatoadministrativosejavinculadoao
órgãoouentidade daAdministraçãoPública, demodoqueaauto-
ridadeque praticao atoapenaso fazem nomedaAdministração,
expressandoavontadeestatalenãoasuavontadepessoal.
OdoutrinadorJuelcideAlmeida(2004,p.640-641),dissertandoso-
breoprincípiodaimpessoalidade,destaca:
Esteprincípio decorre do princípio da igualdade ouisonomia, de
quea administração tem detratar os administradossemdiscrimi-
naçõesnemfavoritismos.Constituiumavedaçãoaqualquerdiscri-
minaçãoilícitaeatentatóriaàdignidadehumana.Busca-se,através
desseprincípio,ainstauraçãodeumgovernoqueviseaconsecução
dobemdetodos, acimadequalquerpersonalismo edeprojetosde
cunhoeminentementepessoal.
“Assim,osatos daAdministraçãoPúblicanãodevemserrealizados
comvistasabeneciarouprejudicardeterminadapessoa,físicaoujurídi-
ca,mas destinando-sea todae qualquerpessoa deformageral” (SILVA;
MATOS,2015,p.137).
LecionandoacercadoduplosentidodoPrincípiodaImpessoalidade,
aplicadoaoadministradoeàprópriaAdministraçãoPública,MariaSylvia
ZanellaDiPietro(2011,p.68)esclarece:
Esteprincípio,queaparece,pelaprimeiravez,comessadenomina-
ção,no art.37 da Constituiçãode 1988,está dando margema di-
ferentesinterpretações,pois,aocontráriodosdemais,nãotemsido
objetode cogitação pelosdoutrinadores brasileiros. Exigirimpes-
soalidadedaAdministraçãotantopodesignicar queesse atributo
podeser observado emrelação aos administradoscomoà própria
Administração.Noprimeirosentido,oprincípioestariarelacionado
comanalidadepúblicaquedevenorteartodaaatividadeadminis-
trativa.Signicaque aAdministraçãonãopode atuarcom vistasa
prejudicaroubeneciarpessoasdeterminadas,umavezqueésem-
preointeressepúblicoquetemquenortearoseucomportamento.
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
97
Citando JoséAfonso da Silva, para explicar o segundo sentido do
PrincípiodaImpessoalidade,MariaSylviaZanellaDiPietro(2011,p.68)
continua:
Nosegundosentido,o princípiosignica,segundo JoséAfonsoda
Silva(2003:647),baseadonaliçãodeGordilloque“osatosepro-
vimentosadministrativossãoimputáveisnãoaofuncionárioqueos
pratica,masaoórgãoou entidadeadministrativadaAdministração
Pública,desortequeeleéoautorinstitucionaldoato.Eleéapenas
oórgãoqueformalmentemanifestaavontadeestatal”.Acrescentao
autorque,emconsequência“asrealizaçõesgovernamentaisnãosão
dofuncionárioouautoridade,masdaentidadepúblicaemnomede
quemasproduzira.AprópriaConstituiçãodáumaconsequênciaex-
pressaaessaregra,quando,no§1ºdoartigo37,proíbequeconste
nome,símbolosouimagensquecaracterizempromoçãopessoalde
autoridadesouservidorespúblicosempublicidade deatos,progra-
mas,obrasserviçosecampanhasdosórgãospúblicos.
Aelaboração do ato administrativo não deve ser determinada pela
pessoadealguém,nãopodeoatoserdirigidocomanalidadedebene-
ciarouprejudicarqualquerpessoaou empresa.Oatoadministrativodeve
serimpessoale livre de discriminação, concretizando-se a igualdade ou
isonomiaqueseesperadaatividadepública.
AindasegundoSilvaeMatos(2015,p.137),
Adespeito dea AdministraçãoPública ocupar simultaneamentea
qualidadedeparteedejulgadoranoprocessoadministrativo,deve
serasseguradoao particular-administradoum tratamentoquelhe
permitaacompensação dessadesigualdade.Aatuaçãodo Estado
deveseramaisisentapossívelnaconduçãodoprocesso,sobpena
deinfringir-se o postulado constitucional daigualdade e da im-
pessoalidade.
Deve-sebuscar,acimadetudo,umasoluçãolegal,justaeconvincen-
tee,para tanto,devetratarosadministrados comisonomia.Nainstrução
enadecisão doprocesso administrativoa autoridadepública competente
devezelarpelamaiorigualdadepossívelentreaspartes.
Alexandre Matos
98
NaspalavrasdeCelso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 114),o
princípiodaimpessoalidadeéopróprioprincípiodaigualdadeouisonomia:
NelesetraduzaideiadequeaAdministraçãotemquetrataratodos
osadministrados sem discriminações,benécas ou detrimentosas.
Nemfavoritismosnemperseguiçõessãotoleráveis.Simpatiasou
animosidadespessoais,políticasouideológicasnãopodeminterfe-
rirnaatuaçãoadministrativaemuitomenosinteressessectários,de
facçõesougruposdequalquerespécie.Oprincípioemcausanãoé
senãoopróprioprincípiodaigualdadeouisonomia.Estáconsagra-
doexplicitamentenoart.37,caput,daConstituição.Alémdisso,as-
simcomo“todossãoiguaisperantealei” (art.5º,caput),a fortiori
teriamdesê-loperanteaAdministração.
Paraaharmoniadoprocessoadministrativocomospreceitosconsti-
tucionais,aaplicaçãodoprincípiodaimpessoalidadenãopodeserafasta-
da,sobpenadetransformar-seemmeioilegítimoedesprovidodecona-
bilidadeparaosnsaquesedestina.
12.4 pRINCÍpIO DA MORALIDADE
Oprincípioda moralidadedeveconduzir asaçõesdasautoridadese
detodoagentepúblicodeformageral;estárelacionadodiretamentecoma
honestidade,atransparênciaeobomusodamáquinaestatal.MariaSylvia
ZanellaDiPietro(2011,p.77)salientaque“nemtodososautoresaceitam
aexistênciadesseprincípio;algunsentendemqueoconceitodemoralad-
ministrativaévagoeimprecisoou queacabapor serabsorvidopelopró-
prioconceitodelegalidade”.
DeacordocomSilvaeMatos(2015,p.137):
Aimoralidadeadministrativasurgiuesedesenvolveuligadaàideia
de desvio de poder,pois se entendia que em ambas as hipóteses
(imoralidadeedesviode poder)aAdministraçãoPúblicase utiliza
demeios lícitos para atingir nalidades metajurídicas irregulares.
Aimoralidadeestarianaintençãodoagente.
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
99
De acordo com o princípio da moralidade, a Administração e
seusagentes devem atuarna conformidade comprincípios éticos.
Aviolaçãoàmoralidadeadministrativaimplicaviolaçãoaopróprio
Direito,congurando ilicitude que sujeitaa conduta viciada àin-
validação,tendoem vista o teor imperativo do art. 37, caput, da
Constituição.
Destaque-se,ainda,queoreferidoprincípioencontrasustentaçãono
art.5º,LXXIII,daCF/1988,queprevêo cabimentodeaçãopopular para
anulaçãodeatolesivoaopatrimôniooudeentidadedequeoEstadoparti-
cipe,àmoralidadeadministrativa,aomeioambienteetc.
Saliente-sequeaofensaaoprincípiodamoralidadenãosecaracteriza
porqualquerofensaàmoralcomum,masseráconguradoquandoocorrer
atransgressãoaumanormademoralsocialcomrelevânciajurídica.Nesse
sentido,CelsoAntônioBandeiradeMello(2009,p.119-120)ensinaque
oprincípiodamoralidadeseráconsideradotransgredido “quandohouver
violaçãoaumanormademoralsocialquetragaconsigomenosprezoaum
bemjuridicamente valorado.Signica, portanto,um reforçoaoprincípio
dalegalidade, dando-lhe um âmbito maiscompreensivodo que normal-
menteteria”.
Dissertando a respeito da distinção entre o princípio da legalidade
coma moralidade administrativa, MariaSylviaZanella Di Pietro(2011,
p.78-79)fazaseguinteobservação:
Seráentãoque sepodeidenticaroprincípio dalegalidadecom o
damoralidadeadministrativa?
Emfacedodireitopositivobrasileiro,arespostaénegativa.ACons-
tituiçãode 1967, no artigo 84, V,mantido como artigo 82,V,na
EmendaConstitucionalnº1,de1969,consideravacomocrimede
responsabilidadeosatosdoPresidentedaRepúblicaqueatentassem
contraa probidadeadministrativa; ea Constituiçãode 1988,além
derepetiraquelanormanoart.85,V,fazumavanço,aomencionar,
noartigo37, caput,comoprincípios autônomos,o dalegalidadee
odamoralidade(...)
Emresumo,semprequeemmatéria administrativasevericarque
ocomportamentodaadministraçãooudoadministradoquecomela
serelacionajuridicamente,emboraemconsonânciacomalei,ofen-
Alexandre Matos
100
dea moral, osbons costumes, asregrasde boa administração,os
princípiosdejustiçaede equidade,aideiacomumde honestidade,
estaráhavendoofensaaoprincípiodamoralidadeadministrativa.
Éevidenteque,a partirdomomentoemqueodesvio depoderfoi
consideradocomoatoilegalenão apenasimoral,amoralidadead-
ministrativateveseucamporeduzido;oquenãoimpede,diantedo
direitopositivobrasileiro,oreconhecimentodesuaexistênciacomo
princípioautônomo.
Emboranão se identique com legalidade (porque a lei pode ser
imorale a moralpode ultrapassar oâmbitoda lei), aimoralidade
administrativaproduzefeitosjurídicos,porqueacarretaainvalidade
doato, quepode serdecretada pelaprópria administraçãoou pelo
PoderJudiciário.
ParaSilvaeMatos(2015,p.137),
AConstituição fazevidente distinção entre osprincípios da lega-
lidadeedamoralidadeaodispordeformaexpressa sobrecadaum
delesdeformaindependente,demodoque,emboratodaaatuação
administrativaestejaligadaàdeterminaçãodalei,nãosepodedes-
vincularaatuação daadministração públicada éticae dosvalores
socialmenteexigidosdasautoridadeseagentespúblicos.
CelsoAntônioBandeiradeMello(2009,p.119-120),discorrendo a
respeitodoprincípio damoralidadeadministrativa,destaca:“Segundo os
cânonesdalealdadeeda boa-fé,aAdministração Públicahaverá depro-
cederemrelaçãoaosadministrados comsinceridadeelhaneza,sendo-lhe
interditoqualquercomportamentoastucioso,eivadodemalícia,produzido
demaneiraaconfundir,dicultarouminimizaroexercíciodedireitospor
partedoscidadãos”.
12.5 pRINCÍpIO DA pUbLICIDADE
Trata-seoprincípiodapublicidadedodeverdaAdministraçãoPúbli-
cadeconduzirseusatoscomatransparência,demodoquenãopoderáela
ocultaroqueédeinteressepúblico,sobretudoquandoseenvolvemedida
quepossaafetardireitoindividual,casodosprocessosadministrativos.
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
101
Inseridoexpressamentenoart.37,caput,daCF/1988,oprincípioda
publicidadeexigeampla divulgaçãodos atospraticadospelaAdministra-
çãoPública,ressalvadasashipótesesdesigiloprevistasemlei.
Háalgumasexceçõesnoart.5ºdaCF/1988querestringemoprincí-
pioda publicidade.O incisoXXXIII estabeleceque“todostêmdireito a
receberdosórgãospúblicosinformaçõesdeseuinteresseparticular,oude
interessecoletivoougeral,que serãoprestadas noprazo dalei, sobpena
de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível
àsegurançadasociedadeedoEstado”.O incisoLXdeterminaque“alei
sópoderárestringirapublicidadedosatosprocessuaisquandoadefesada
intimidadeouointeressesocialoexigirem”.
Oprocessoadministrativonasinfraçõesdetrânsitoseguearegrage-
ral,ouseja,todasasinformaçõesnelecontidassãopúblicas,podendo
qualquerpessoateracessoaelas, umavezqueoCódigodeTrânsito
Brasileironãomencionanadaquantoaoseucarátersigiloso.
CelsoAntônioBandeira deMello(2009,p. 114-115)faza seguinte
observaçãoacercadoprincípiodapublicidade:
Talprincípioestáprevisto expressamenteno art.37,caput,daLei
Magna,ademaisdecontempladoemanifestaçõesespecícasdodi-
reitoà informação sobreosassuntos públicos, quer pelocidadão,
pelosófato desê-lo, querporalguém queseja pessoalmenteinte-
ressado.É oque se lêno art.5º, XXXIII (direitoà informação)e
XXXIV,“b”, este últimopara ocaso especíco decertidão (a ser
expedidano prazo máximo de 15dias, conforme a Lei 9.051, de
18.5.95)para defesade direitos eesclarecimentos desituaçõesde
interessepessoal. Além disso, omesmo art. 5º, no inciso LXXII,
conferea garantia do habeas dataparaassegurar judicialmente o
conhecimentodeinformaçõesrelativasaoimpetranteque constem
deregistrosoubancosdedados de entidades governamentais ou
deâmbito público,bem como parareticação de dadosque neles
estejamarmazenados.
Naesferaadministrativaosigilosóseadmite,ateordoart.5º,XX-
XIII,precitado,quando “imprescindívelà segurançada Sociedade
edoEstado”.
Alexandre Matos
102
Sobreesseprincípio,SilvaeMatos(2015,p.138):
O princípio constitucional da publicidade dos atos da Adminis-
tração Pública representa inequívoca conquista para a sociedade,
cumprindoosanseiosdeumregimedemocráticoquedeveprimare
conduzir-sepelatransparência.
Éinegávelqueaamplapublicaçãodosatosadministrativosconsiste
emautênticagarantiaindividualecoletivacontra arbitrariedadedo
atoadministrativo.
12.6 pRINCÍpIO DA EFICIÊNCIA
ParaSilvaeMatos(2015,p.139),oprincípiodaeciência
foi incluído entre os princípios constitucionais daAdministração
Pública, previstos no art. 37, caput, da Constituição Federal, pela
EmendaConstitucionalnº19,de4dejunhode1998,conhecidacomo
a“Emendadareformaadministrativa”.Emborajáestivesseimplícito
nonossosistemajurídico,olegisladorconstituinteprocuroucomessa
modicaçãodemonstrarexpressamentearealimportânciadesteprin-
cípio,quandoaburocraciaforum obstáculoparaointeressepúblico
deveprevaleceraeciênciasobreoexcessodeformalismo..
MariaSylviaZanellaDiPietro(2011,p.84-85),emrelaçãoaoprin-
cípiodaeciência,destaca:
O princípio da eciência apresenta, na realidade, dois aspectos:
podeserconsideradoemrelaçãoaomododeatuaçãodoagentepú-
blico,doqualseesperaomelhordesempenhopossíveldesuasatri-
buições,paralograros melhoresresultados;eem relaçãoaomodo
deorganizar,estruturar,disciplinar aAdministraçãoPública,tam-
bémcomo mesmoobjetivode alcançarosmelhores resultadosna
prestaçãodoserviçopúblico.
(...)
Valedizerqueaeciênciaéprincípioquesesomaaosdemaisprin-
cípios impostos àAdministração, não podendo sobrepor-se a ne-
nhumdeles,especialmenteaodalegalidade,sobpenadesériosris-
cosàsegurançajurídicaeaopróprioEstadodeDireito.
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
103
Exige-secomoprincípiodaeciênciaque,aonaldoprocessoadmi-
nistrativo,tenha-seuma decisãoconclusivasolucionando umacontrovér-
siaenãoapenasumasimplesnegativaouausênciadedecisão,protelações,
engavetamentosoudescumprimentosdeprazos,emtotaldesrespeitocom
oadministradoquedependedasuasituaçãoregularizadaperanteaAdmi-
nistraçãoPública.Valeressaltarque,emboraadecisãoadministrativaseja
contráriaaosinteressesdoadministrado,ele necessitadeuma decisãono
seuprocessoparaquepossaoquantoantesregularizarsua situação(SIL-
VA;MATOS,2015,p.139).
HelyLopesMeirelles(apudDIPIETRO,2011,p.83-84)discorreda
seguinteformaacercadaeciênciacomoumdosdeveresdaAdministra-
çãoPública:
Oque seimpõe atodo agentepúblico derealizar suasatribuições
compresteza,perfeiçãoerendimentofuncional.Éomaismoderno
princípioda função administrativa,que já nãosecontenta em ser
desempenhadaapenas com legalidade, exigindoresultados positi-
vosparaoserviçopúblicoesatisfatórioatendimentodasnecessida-
desdacomunidadeedeseusmembros.
“Asdiscussõesocorridasàépocada aprovaçãodareforma adminis-
trativaapontaramcomoagrandevilãdamorosidadedoserviçopúblicoa
estabilidadedoservidor;ainterpretaçãofoidequesemoacompanhamen-
toeaavaliaçãoconstantedesuasações,comoacontecenosetorprivado,o
agentepúblicoseacomodaesedistanciadoprocessoprodutivo”(SILVA;
MATOS,2015,p.139).
EmboraaAdministração Públicanão convivacom acompetitivida-
de,noqualoserviçomalprestadonãoimplicaaperdademercado,como
ocorrecomainiciativaprivada,nãopodedescuidardaeciêncianoexer-
cíciodesuasfunções,pois,conformeAlexandredeMoraes(1999,p.30),
“opoderpúblicosomentecuidadaquiloqueéessencialefundamentalpara
acoletividade,eque,portanto,deveserbom,ecazeeciente”,deformaa
justicarosrecursosgastos.Nessesentido,oreferidoautorcomentaacer-
cadoprincípiodaeciência:
Alexandre Matos
104
(...)impõeàAdministraçãoPúblicadiretaeindiretaeaseusagentes
apersecuçãodo bemcomum, pormeiodo exercíciode suascom-
petências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa,
ecaz,semburocracia esempre embusca daqualidade,primando
pelaadoção dos critérios legaise morais necessários paramelhor
utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar-se
desperdíciose garantir-seuma maiorrentabilidade social.Nota-se
quenãosetrata deconsagraçãoda tecnocracia,muitopelo contrá-
rio,oprincípio daeciência dirige-separa arazão em maiordo
Estado,a prestação de serviçosessenciais à população, visandoa
adoçãodetodososmeioslegaisemoraispossíveisparaasatisfação
dobemcomum.
Comoprincípio,aeciênciapossuiduasvertentes:organizareestru-
turaramáquinaestatalparatorná-lamaisracionalparaqueasnecessidades
dasociedadesejamalcançadasdeformamaissatisfatória;eregularaatua-
çãodos agentes públicos, paraque eles tenham ummelhordesempenho
possívelamdeatingiremosmelhoresresultados.Emoutraspalavras,o
princípiodaeciênciaobjetiva aefetivaçãodoserviçopúblicoparaaten-
deràsnecessidadesdosadministrados,quepassarãoatermaiorconança
naAdministração,consolidandoosobjetivosdoEstado(SILVA;MATOS,
2015,p.139).
12.7 pRINCÍpIO DA FINALIDADE
Extrai-sedesseprincípioquequalqueratodaAdministraçãoPública
deveserdirigidoaumobjetivoestabelecidoemlei,alcançandooobjetivo
porela almejado, consubstanciado no interesse público. Isso se justica
emrazãodequealeinãodeveconterdispositivosinócuosouinúteis,mas
visaaummespecial.
Oprincípiodanalidadeé inerenteaoprincípiodalegalidade,esua
autonomiaéfundadananecessidadedeevitarinterpretaçõesequivocadas
esuperciaisemdetrimento doobjetivo danorma. Dessaforma, osdes-
viosdepoder,oudesviosdenalidade,sãonulos,poisquemnãoatende
analidadelegaldesatendeapróprialei(SILVA;MATOS,2015,p.140).
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
105
ParaCelsoAntônioBandeiradeMello (2009,p.106),é analidade
queexplica,justicaeconferesentidoa umanorma.“Apartirdelaéque
secompreendearacionalidadequelhepresidiuaedição.Logo, énana-
lidadedaleiqueresideocritérionorteadordesuacorretaaplicação,poisé
emnomedeumdadoobjetivoqueseconferecompetênciaaosagentesda
Administração”.
Aatividadeadministrativanãodeveserrealizadavisandouminteres-
separticular,sob pena dedesvio denalidade.O princípioda nalidade
protegeaordemjurídicacontrainteressesdopróprioagentepúblicooude
terceiros,privilegiandoointeressepúblicoeo mespecícotrazido pela
norma(SILVA;MATOS,2015,p.140).
NessesentidoéoensinamentodeCelsoAntônioBandeiradeMello
(2009,p.107-108):
Assim, o princípio da nalidade impõe que o administrador, ao
manejaras competências postasa seu encargo,atue com rigorosa
obediênciaà nalidade de cada qual.Isto é, cumpre-lhe cingir-se
nãoapenas à nalidadeprópria de todasas leis, queé o interesse
público,mas tambémà nalidadeespecíca abrigadana leiaque
estejadandoexecução.
(...)
Emsuma:analidadelegaléum elementoda próprialei, éjus-
tamenteo fator queproporciona compreendê-la. Porisso não se
podeconceberoprincípiodalegalidadesemencareceranalida-
dequer detal princípioem si mesmo,quer dasdistintas leisem
queseexpressa.
Peloquantosedisse,jásenotaquearaizconstitucionaldoprincípio
da nalidade encontra-se na própria consagração do princípio da
legalidade, estampado no art. 37 da Lei Magna. Na verdade,
só se erige o princípio da nalidade em princípio autônomo
pela necessidade de alertar contra o risco de exegeses toscas,
demasiadamentesuperciaisoumesmoritualísticas,quegeralmente
ocorremporconveniência enão pordescuido dointérprete. Pode-
sedizer, contudo, que háoutro dispositivo constitucional que lhe
serviriadereferênciaespecíca,emboraimplícita.Éoart.5º,LXIX,
noqual se prevê o mandadode segurança. Alise diz cabível sua
concessãocontrailegalidadeou“abusodepoder”.Abusodepoderé
ousodopoderalémdeseuslimites.Ora,umdoslimitesdopoderé
Alexandre Matos
106
justamenteanalidadeemvistadaqualcaberiaserutilizado.Donde
oexercíciodopodercomdesvirtuamentodanalidadelegalqueo
ensanchariaestáprevistocomocensurávelpelavia domandadode
segurança.
Noque tangeaos“processos administrativosde trânsito atinentesà
suspensãoecassação”(SILVA;MATOS,2015,p.140),
aaplicaçãodoprincípio danalidadevislumbra-se danecessidade
deproteçãodacoletividadecontracondutoresinfratoresqueamea-
çamasegurança dotrânsito.Tambémpor esseprincípio decorrea
impossibilidadedeprivaçãocautelardodireitodedirigirdoscondu-
toresquenãoseenquadramnadescriçãodeinfratorescontumazese
quenãorepresentamperigopara osdemaisintegrantesdotrânsito,
hajavistaodesviodanalidade,consubstanciadanaproteçãoàse-
gurançaviária(p.140).
12.8 pRINCÍpIO DA MOTIVAçãO
Oprincípio da motivação ocupa-se em garantir queoatoadminis-
trativotenha umacausade ser,de existir.Trata-sedegarantia dequeas
decisõesadministrativasnãosejambaseadasnasimplesvontadedoadmi-
nistrador,precisamindicarosmotivos,asrazõesqueassustentam.
Acercada obrigatoriedade da motivação de qualquer de seus atos,
doutrinae jurisprudência pacicaram o entendimento:elaé formalidade
indispensávelparapermitirocontroledelegalidadedosatosadministrati-
vos,independentementedanaturezadoato:vinculado,emquealeiesta-
beleceexatamenteaatuaçãodaAdministraçãoPública,oudiscricionário,
quandoalei confereàAdministração aliberdade deagir conformecrité-
riosdeconveniênciaeoportunidade(SILVA;MATOS,2015,p.140)
ParaCelso AntônioBandeira de Mello(2009, p.112),em algumas
hipótesesdeatos vinculadosa motivaçãoé implícita,bastando amenção
dofatoedaregra,pornãoserpossívelainterferênciadoadministrador.Já
nashipótesesdeatosvinculadosqueexigemapreciaçãocuidadosadefatos
efundamentosjurídicos,bemcomonosatosdiscricionários,éimprescin-
dívelamotivaçãodetalhada:
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
107
Amotivaçãodeveser préviaou contemporâneaà expediçãodo ato.
Emalgumashipótesesdeatosvinculados,istoé,naquelesemquehá
aplicaçãoquaseautomáticadalei,pornão existircampo parainter-
ferênciadejuízossubjetivos doadministrador,asimples mençãodo
fatoedaregradeDireitoaplicandopodesersuciente,porestarim-
plícitaamotivação.Aqueloutros,todavia,emqueexiste discriciona-
riedadeadministrativaouemqueapráticadoatovinculadodepende
deaturadaapreciaçãoesopesamentodosfatosedasregrasjurídicas
emcausas,éimprescindívelmotivaçãodetalhada.Éoquesucede,por
exemplo,natomada dedecisõesem procedimentosnosquaisexista
umasituaçãocontenciosa,comonochamadoprocessoadministrativo
disciplinar.Idememcertosprocedimentosemqueváriosinteressados
concorremaummesmoobjeto,comonaslicitações.
O citado doutrinador prossegue dissertando acerca do fundamento
constitucionaldoprincípio damotivação,oqualse encontraimplícitona
CF/1988:
Ofundamentoconstitucionalda obrigaçãodemotivar está–como
seesclareceemseguida–implícitotantonoart.1º, II,queindicaa
cidadaniacomoum dosfundamentos daRepública, quantono pa-
rágrafoúnicodesteperceptivo,segundooqualtodoopoderemana
dopovo, como ainda no art. 5º, XXXV,que assegura o direito à
apreciaçãojudicialnoscasosdeameaçaoulesãodedireito.Équeo
princípiodamotivaçãoéreclamadoquercomoarmaçãododireito
políticodos cidadãosao esclarecimentodo “porque”das açõesde
quemgerenegóciosquelhesdizemrespeitoporseremtitularesúl-
timosdopoder,quercomodireitoindividualanãoseassujeitarem
adecisões arbitrárias,pois sótêmque seconformar àsqueforem
ajustadasàsleis(2009,p.112-113).
AmotivaçãodosatosadministrativoséinerenteaoEstadoDemocrá-
ticodeDireito,tendoemvistaquenãoépermitidoàAdministraçãoPúbli-
caatuardemodoarbitrário,sendodireitodetodocidadãosaberaomenos
asrazõespelasquaissãotomadasasdecisõesdasautoridadespúblicas.
Defato,nãoseguraaceitávelqueasdecisõesadministrativassejam
desprovidas de fundamentação e justicativas. Nos processos adminis-
trativosde suspensãoecassação, notadamenteem razão danatureza das
Alexandre Matos
108
penalidades,deautênticaspenasrestritivasdedireitos,amotivaçãofaz-se
indispensávelparaavalidadedasdecisões,entretanto,emmuitoscasos,as
decisõessãotomadassemqualquermotivação.
ALeinº9.784/99,que regulaoprocessoadministrativonoâmbitoda
AdministraçãoPública Federal, trazosprincípios que devem serobedeci-
dospelaAdministraçãono seuart.2º,caput,nos seguintestermos:“AAd-
ministraçãoPúblicaobedecerá,dentre outros,aos princípiosda legalidade,
nalidade,motivação,razoabilidade,proporcionalidade,moralidade, ampla
defesa,contraditório,segurançajurídica,interessepúblicoeeciência”.
Oart.50dacitadaleitrazashipótesesemqueosatosadministrativos
devemsermotivados:
Art.50.Osatosadministrativosdeverãosermotivados,comindica-
çãodosfatosedosfundamentosjurídicos,quando:
I–neguem,limitemouafetemdireitosouinteresses;
II–imponhamouagravemdeveres,encargosousanções;
III–decidamprocessosadministrativosdeconcursoouseleçãopública;
IV–dispensemoudeclaremainexigibilidadedeprocessolicitatório;
V–decidamrecursosadministrativos;
VI–decorramdereexamedeofício;
VII–deixem deaplicarjurisprudência rmadasobrea questãoou
discrepemdepareceres,laudos,propostaserelatóriosociais;
VIII– importemanulação, revogação, suspensãoou convalidação
deatoadministrativo.
Segundoo§1ºdoartigotranscrito,“amotivaçãodeveserexplícita,
claraecongruente,podendoconsistiremdeclaraçãodeconcordânciacom
fundamentosdeanteriorespareceres,informações,decisõesoupropostas,
que,nestecaso,serãoparteintegrantedoato”.
MariaSylvia ZanellaDi Pietro(2011, p.83) observa,das hipóteses
emqueamotivaçãoéobrigatória,que“em regra dizem respeito a atos
que,dealgumaforma,afetamdireitosouinteressesindividuais,oqueestá
ademonstrarque apreocupação foimuito maiscom osdestinatáriosdos
atosadministrativosdoquecomosinteressesdaprópriaAdministração”.
Portanto,vislumbra-sequeoprincípiodamotivaçãoconsisteemga-
rantiaaosadministradosdequeasdecisõesproferidaspelaAdministração
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
109
Públicaestejamdeacordocomasnormaslegais,demodoaestabelecerum
silogismoentreosfatosocorridoseodispositivolegalaplicado.
12.9 pRINCÍpIO DA RAZOAbILIDADE
Oprincípiodarazoabilidadeéimportante formade ponderaras de-
cisõesdiscricionáriasdaAdministraçãoPública,quandoestassemostram
incoerentesecontráriasaobomsensoeàscircunstânciasemquesederam
osfatos.Nota-sequeoprincípiodarazoabilidadeestádiretamentevincu-
ladoaoidealdejustiçaetambémdeproporcionalidade.
Ao atuar no exercício da discrição, aAdministração Pública terá
de obedecer a critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em
sintoniacomosensonormal,ecomaprudênciareclamadaemcada
situação.Istoporqueoatributodadiscricionariedadeconferidopela
leiaoAdministrador indica que este deverá adotar a providência
maisadequada ao interesse social eàracionalidade, analisando e
decidindoda melhor forma diante dofato concreto, não podendo
agirde acordo com critérios exclusivamentepessoais e conforme
seuhumoreestadodeânimo(SILVA;MATOS,2015,p.142).
Arespeitodoprincípiodarazoabilidade,CelsoAntônioBandeirade
Mello(2009,p.108)dissertanoseguintesentido:
Enuncia-se com este princípio que aAdministração, ao atuar no
exercício de discrição, terá de obedecer a critérios aceitáveis do
pontodevistaracional,emsintoniacomosensonormaldepessoas
equilibradase respeitosa dasnalidades que presidirama outorga
dacompetênciaexercida. Valedizer:pretende-secolocar emclaro
quenão serãoapenas inconvenientes, mastambém ilegítimas– e,
portanto, jurisdicional mente invalidáveis –, as condutas desarra-
zoadas,bizarras,incoerentesoupraticadascomdesconsideraçãoàs
situaçõese circunstâncias que seriam atendidas por quem tivesse
atributosnormaisdeprudência,sensatezedisposiçãodeacatamen-
toàsnalidadesdaleiatributivadadiscriçãomanejada.
Aaplicaçãodoprincípiodarazoabilidadeestádiretamenteligadaao
espíritodaleieàjustiça,noscasosemqueaAdministraçãopossautilizar
Alexandre Matos
110
critériosde conveniência eoportunidade. Nesse tocante,oreferido prin-
cípioimpõelimitaçõesàdiscricionariedade administrativa,possibilitando
queoPoderJudiciárioaprecieadecisãotomadapelaAdministraçãoPúbli-
canousodadiscrição,manifestamentecontráriaàrazoabilidade.
Valedestacarqueaintervenção judicialem decorrênciada violação
doprincípiodarazoabilidadepelaAdministração Pública não congura
invasãoàliberdadeconferidapelaleiàAdministração,poisessaliberdade
queaAdministraçãoostentadeveserexercidadentrodalei.
Celso Antônio Bandeira de Mello (2009, p. 109) ensina que uma
providênciadesarrazoadanãopodeserhavidacomocomportadapelalei.
Logo,éilegal:édesbordantedoslimitesnelaadmitidos.
Asrazões daAdministração parajusticara satisfação dointeresse
públiconãopodemserbaseadasemcritériosexclusivamentepessoais,ul-
trapassandooslimites impostospelalei econtrariandoosensode justiça
erazoabilidade.
12.10 pRINCÍpIO DA pROpORCIONALIDADE
“Nãoseabatempardaisdisparandocanhões”,essafamosaexpressão
quesimboliza oprincípioda proporcionalidadefoiproferida pelojurista
WalterJellinek(1885-1955).
Oprincípioda proporcionalidadegaranteque asançãoadministrati-
vadeve corresponder,deformaequitativa, àconduta infracional.Assim,
condutasde menor gravidade devem ser punidas de forma mais amena,
enquantoascondutasmaisgravesdevemserpunidascommaiorrigor.
MariaSylviaZanellaDiPietro(2011,p.81)armaqueaproporcio-
nalidadeéum aspecto do princípio da razoabilidade, embora tratada de
formaautônomapelaLeiqueregulaoprocessoadministrativonoâmbito
daAdministraçãoPúblicaFederal:
EmboraaLei n°9.784/99 façareferência aosprincípios darazoa-
bilidadeedaproporcionalidade,separadamente,narealidade,ose-
gundoconstituiumdos aspectoscontidosnoprimeiro. Istoporque
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
111
oprincípio darazoabilidade,entre outrascoisas,exige proporcio-
nalidadeentreosmeios dequese utilizaaAdministraçãoeos ns
queelatemquealcançar.Eessaproporcionalidadedevesermedida
nãopeloscritériospessoaisdoadministrador,massegundopadrões
comunsnasociedadeemquevive;enãopodesermedidadiantedos
termosfriosdalei,masdiantedocasoconcreto.
Por isso, uma decisão desproporcional não se mostra razoável, ou
seja,é manifestamente inadequadaparaalcançar as nalidadesprevistas
nalei.Nessesentido,teráaAdministraçãoexorbitadodoslimitesdadiscri-
cionariedade,contrariandoaprevisãolegal,casoemqueoPoderJudiciá-
riopoderácorrigirailegalidade,poistodososatospraticadosnoprocesso
administrativoque excedem o necessário para alcançar o objetivo legal
encontram-semaculadosdeilegitimidade.
Oprincípioda proporcionalidadeconcerne àadequação eaoequilí-
brioentre a condutado infrator eapenalidade efetivamenteaplicadano
processoadministrativo,de modo que não haja sanções excessivas nem
insignicantes.AAdministraçãoPúblicadeveatuarnaextensãoeintensi-
dadeestritamentenecessáriasparasatisfaçãodointeressepúblico.
NaspalavrasdeCelsoAntônioBandeiradeMello(2009,p.110),“oplus,
oexcessonãomilitaembenefíciodeninguém.Representa,portanto,umagra-
voinútilaosdireitosdecadaqual”.Eprossegueocitadodoutrinador:
Percebe-se, então, que as medidas desproporcionais ao resultado
legitimamentealvejável são,desde logo,condutas ilógicas,incon-
gruentes.Ressentindo-sedessedefeito,alémdedemonstraremme-
noscabopelasituaçãojurídicadoadministrado,traindoapersistên-
ciada velha concepçãode uma relaçãosoberano-súdito(ao invés
deEstado-cidadão),exibem,aomesmotempo,suainadequaçãoao
escopolegal. Ora, jáse viu que inadequaçãoà nalidade dalei é
inadequaçãoàpróprialei. Dondeatosdesproporcionaissão ilegais
e,porisso,fulmináveispeloPoderJudiciário,que,sendoprovocado
deveráinvalidá-los,quandoimpossívelanular unicamenteadema-
sia,oexcessodetectado.
ParaSilvaeMatos(2015,p.144),
Alexandre Matos
112
nãohá dúvidas de que o senso de proporcionalidadeentre a gra-
vidadeda conduta eapenalidade aplicada devesempre nortear o
processoadministrativo,ouseja,asançãoefetivamenteimostadeve
seradequadaao riscogeradopelo infratoràsegurança dotrânsito,
àincolumidade física e à vidados condutores e pedestres, objeto
maiordetuteladanormade trânsito.Enm,oprincípiodapropor-
cionalidadeexigequeaatuaçãodoadministradorpúblicoestejaas-
sentadanobomsenso,noequilíbrioe naponderaçãoentreosfatos
easconsequências,tendoemvistaanalidadealmejadapelalei.
12.11 pRINCÍpIO DA VERDADE MATERIAL
Pelo princípio da verdade material, a Administração Pública deve
buscaraverdadedosfatos,nãoselimitandoàverdadeformaldoprocesso.
A decisão no processo administrativo pelo órgão competente não
devecar adstrita às informaçõestrazidaspela parte interessada,sendo-
-lhepermitida abusca de todoe qualquerelementoque auxilieseu con-
vencimentoequetraduza averdaderealdosfatosdiscutidosno processo
administrativo,amdeevitardecisõesequivocadaseinjustas.
Orequisito do agrantedocondutor suspenso naconduçãode veí-
culoautomotorparaainstauraçãodoprocessoadministrativodecassação
expressaabuscapelaverdadematerial,àmedidaque,quandotalcritério
nãoé observado,oproprietário do veículoutilizado por terceirosno co-
metimentodainfraçãopodeser penalizadocom acassação desua CNH,
casoestejacomodireitodedirigirsuspensonadataemqueainfraçãofoi
cometida,eporalgummotivonãoindicouocondutorinfrator.
Nosprocessosadministrativospunitivos,cujaspenalidadestêmnatu-
rezaevidentementedepenasrestritivasdedireitos,devemvigorarasga-
rantiasdoprocessopenal,notadamentenoprocessodecassaçãodaCNH,
emqueopenalizadonãopoderádirigirveículosautomotorespeloperíodo
mínimodedoisanos,devendo,ainda,submeter-seatodososprocedimen-
tosdereabilitaçãoparareadquirirodireitodedirigir.
Nessasenda,oprincípio daverdade materialmostra-se degrande e
valiosarelevância,paraquecidadãosinocentesnãosejam punidos com
tãoseverapenalidadeemvirtudedemerasverdadesformais.Arespeitodo
princípioemcomento,ensinaHelyLopesMeirelles(2016,p.824):
Nulidades dos atos administrativos de trânsito
113
Oprincípiodaverdadematerial,tambémdenominadodeliberdade
naprova,autorizaaAdministraçãoavaler-sedequalquerprovaque
aautoridade processante ou julgadora tenhaconhecimento, desde
quea faça trasladar parao processo. É abuscada verdade mate-
rialemcontraste com a verdade formal. Enquanto nos processos
judiciaisoJuizdeve-secingiràsprovasindicadasnodevidotempo
pelaspartes,no processo administrativo a autoridade processante
oujulgadorapode,aténaljulgamento, conhecerdenovasprovas,
aindaqueproduzidasemoutroprocessooudecorrentesdefatossu-
pervenientesquecomprovemasalegaçõesemtela.
Nestesentidoé oensinamento deCelsoAntônioBandeiradeMello
(2009,p.502):
Deveras,seaAdministraçãotempornalidadealcançarverdadeira-
menteointeressepúblicoxadonalei,éóbvioquesópoderáfazê-lo
buscandoaverdadematerial,aoinvésdesatisfazer-secomaverda-
deformal,jáqueesta,pordenição,prescindedoajustesubstancial
comaquiloqueefetivamenteé,razãoporqueseriainsucientepara
proporcionaroencontrocomointeressepúblicosubstantivo.
Emquepeseaimportânciadesseprincípio,asautoridadesdetrânsito
poucoounadatêmdeleseutilizado,preferindoacomodidadedaverdade
formalquelhessãoapresentadasnosautosadministrativos,nasuagrande
maioriapormeiodesistemaseletrônicos.Emrazãodisso,muitosproprie-
táriosdeveículosautomotores sofreminstauração deprocessos adminis-
trativos e aplicação de penalidades de suspensão e cassação sem terem
cometidoasinfraçõesdetrânsitoquelhesforamimputadas.
NaspalavrasdeSilvaeMatos(2015,p.145):
É cediço que a Administração, como representante do interesse
público,deveutilizar-sede todos os meios legais para garantir a
segurança no trânsito, penalizando os infratores. No entanto, ao
apegar-secegamenteàverdadeformal,emdetrimentodoprincípio
daverdadematerial,aAdministraçãonãoestáprotegendoqualquer
interessepúblico,maspunindoocidadãoinocentequenenhumris-
coofereceàsegurançanotrânsito.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT