Teoria Geral dos Recursos (arts. 574 a 580)

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador-Geral de Justiça
Páginas647-673
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Tratado Doutrinário de processo Penal
Arts. 574 a 580
1. Noções didáticas sobre a matéria
1.1. Conceito
Recurso, conforme Bento de Faria, é o meio
processual estabelecido para permitir a impugnação
de qualquer despacho ou sentença, renovando-se o
Juízo na instância superior, a  m de permitir a maior
scalização das deliberações do Juízo a quo.1484
Há 3 (três) características recursais:
a) Voluntariedade — a interposição de recursos
está ligada à manifestação da vontade. Para tan-
to há necessidade inequívoca da existência de
um recurso.
b) Previsão Legal — indispensável a análise do ca-
bimento para um recurso ser conhecido. Se con-
tra determinada decisão a lei não prevê recurso,
tal decisão é irrecorrível.
c) Anterioridade à preclusão ou à coisa julgada —
Antes da formação da preclusão e da coisa jul-
gada há a interposição do recurso.
RESUMO PRÁTICO
O vocábulo “recurso” vem do latim de recursos, e
este, de recurrere, que signi ca “voltar, tomar a correr,
retroceder, andar para trás”. É, portanto, o meio jurí-
dico para obter o reexame de uma decisão criminal.
1.2. A instância e a entrância
Tenho presenciado vários alunos e até pro ssionais
confundindo as terminologias instância e entrância.
a) Instância, conforme a lição de Walter P.
Acosta,1485 é o percurso legal da causa na perse-
guição que o autor move ao réu. E sendo, via de
1484 FARIA, Bento de. Código de processo penal. Op. cit., p. 172.
1485 No mesmo sentido: Acosta. Walter P. O processo penal.
Coleção Jurídica da Editora do Autor.
regra, superior à hierarquia dos órgãos a que se
atribui a revisão dos julgados, instância também
é, notadamente, grau de jurisdição.
b) Entrância é lugar de ordem das circunscrições
judiciárias, na classi cação que delas se faz para
vários efeitos legais.
RESUMO PRÁTICO
a) Entrância = divisão das comarcas.
EXEMPLO PRÁTICO
Dependendo da organização judiciária de cada
Estado, nós teremos:
1. Comarca de 1ª entrância.
2. Comarca de 2ª entrância.
3. Comarca de 3ª entrância.
Obs.: Em alguns estados do Brasil, além da 3ª
entrância, temos a entrância especial, que geralmente
se localiza na capital do Estado.
Cuidado: também já presenciei várias pessoas
pronunciando a terminologia estância que é o lugar
onde se está ou se permanece por algum tempo. Por-
tanto, também não confunda entrância com instância.
b) Instância = grau de jurisdição.
Em regra, as instâncias são duas:
• No juízo inferior (juízo a quo), constituído pelos
Juízes singulares das diversas entrâncias e pelos
Juízos coletivos dos tribunais do Júri ou turma recursal
do Juizado Especial, abre-se o primeiro percurso,
que é a 1ª instância.
• No Tribunal de Justiça e demais tribunais superiores
da Federação (Juízo ad quem) — abre-se o segundo
percurso, que é a 2a instância.
Obs. 1: A competência de que desfrutam os tribunais
superiores pode ser:
Capítulo 24
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a) originária, quando lhes cabe, com primazia, pro-
cessar e julgar o fato;
b) ou recursal, quando é consequência da interpo-
sição de recurso.
Obs. 2: De todos os órgãos do Poder Judiciário,
apenas os Juízes do Trabalho não têm competência
para questões penais.
Obs. 3: Pode até ocorrer que os órgãos compe-
tentes para conhecer e julgar os recursos não se en-
quadrem na denominada jurisdição superior. Um
exemplo é a turma recursal do Juizado Especial na
forma da Lei no 9.099/1995.
1.3. Classicação recursal
a) Classicação quanto à análise da matéria.
Os recursos podem ser classicados em recursos
ordinários e recursos extraordinários.
São recursos ordinários aqueles nos quais é
admissí vel a discussão da matéria de direito e da
matéria de fato, como a apelação, o recurso no
sentido estrito e os embargos infringentes.
São recursos extraordinários os que somente
admitem impugnação quanto à matéria de direito,
como o recurso especial, o recurso extraordinário, o
agravo da decisão de indeferimento desses recur-
sos e os embargos de divergência.
b) Classicação quanto ao diploma legal.
Os recursos também podem ser classicados
conforme o diploma legal, no qual estão previstos.
Portanto teremos:
1) recursos constitucionais são os previstos na
Constituição;
2) recursos legais são os previstos em lei;
3) recursos regimentais são os previstos nos Regi-
mentos Internos dos Tribunais.
c) Quanto ao órgão que reexamina
Quanto ao órgão que reexamina a questão os
recursos podem ser:
a) Iterativos o próprio órgão reexamina a questão.
EXEMPLO PRÁTICO: embargos de declaração.
b) Reiterativos — somente o órgão ad quem reexa-
mina a questão.
EXEMPLO PRÁTICO: apelação.
c) Mistos — o recurso é examinado pelas duas ins-
tâncias.
EXEMPLO PRÁTICO: agravo de execução.
2. Princípios recursais
2.1. Princípio da voluntariedade
O recurso é um direito assegurado à parte e, em
regra, não é uma obrigação. Somente a parte su-
cumbente cabe a oposição do recurso. É, portanto,
faculdade. Se a parte o deseja, recorre.
INDAGAÇÃO PRÁTICA
Veja essa questão retirada do contexto foren-
se prático:No processo penal, quais as exceções
ao princípio da voluntariedade recursal?”
Resposta. Conforme a relevante lição de
Ada Pellegrini, Antônio Scarance e Antônio
Magalhães,1486 o ônus de recorrer sofre atenuações:
nos casos de necessidade do duplo grau de jurisdição
(o chamado recurso de ofício do CPP), mesmo sem
recurso, a decisão poderá ser revista pelo tribunal
de segundo grau. A extensão dos efeitos do recurso
ao litisconsorte, no processo civil atual art. 1.005 e
ao corréu, no processo penal (art. 580, CPP), em
determinadas circunstâncias, possibilita a quem
não exerceu a faculdade de recorrer dividir com o
recorrente as vantagens da nova decisão. E, agora
com exclusividade para o processo penal, o princípio
do favor rei pode dar margem à denominada reformatio
in melius, ou seja, à revisão da decisão, no recurso
da acusação, para favorecer o acusado, ainda que
este não tenha recorrido. Finalmente, e ainda para o
processo penal, a regra do ônus de recorrer é mitigado,
em favor do réu, pela possibilidade de utilização, a
qualquer tempo, das ações de impugnação (habeas
corpus e revisão criminal).
2.2. Princípio do duplo grau de jurisdição
Alberto Silva Franco e Rui Stoco1487 dizem
que o princípio do duplo grau de jurisdição não está
inscrito na atual CF como garantia constitucional.
Implicitamente, porém, foi adotado, bastando atentar-
se para as disposições sobre a competência recursal
dos tribunais, não só contemplando a dualidade,
mas institucionalizando a pluralidade dos graus de
jurisdição (arts. 102, 105, 108, CF). Ada Pellegrini e
1486 GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Sca-
rance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Recursos no
processo penal. 8a ed. RT, 2004, p. 33.
1487 SILVA FRANCO, Alberto; STOCO, Rui. Código de Proces-
so Penal e sua interpretação jurisprudencial, vol. 4. RT.
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