Princípios da atividade notarial

AutorChristiano Cassettari
Páginas27-46
4
PRINCÍPIOS DA ATIVIDADE NOTARIAL
Os princípios funcionam como alicerce e revelam o conjunto de preceitos que tra-
çam a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Assim, os princípios exprimem
e têm mais relevância do que a própria norma ou regra jurídica. Mostram a razão de ser
das coisas jurídicas, convertendo-as em perfeitos axiomas1.
Princípios não se confundem com normas jurídicas, mas podem consagrar-se nelas.
Mesmo quando sejam normas, os princípios são superiores a elas, pois são preceitos
fundamentais. Os princípios são a causa e o f‌im do direito. Do mesmo modo, não se
confundem com procedimentos técnicos: o operador do Direito não deve confundir ou
denominar princípios meros procedimentos técnicos.
Os princípios também não se confundem com a natureza ou com os efeitos jurídi-
cos. A identif‌icação da natureza jurídica, muitas vezes, deriva do princípio, mas não se
trata dele. Os efeitos jurídicos do ato realizam o princípio, mas são menos que ele: são
a sua manifestação concreta.
4.1 PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AOS SERVIÇOS NOTARIAIS
O tabelião é um delegado do Estado operando em caráter privado a serviço dos
particulares. O tabelião é o Estado a serviço dos particulares. O tabelião não trabalha
para o Estado. Essa dualidade, similar ao mitológico deus romano Jano, pode ser repre-
sentada por duas faces unidas com olhares opostos: uma f‌ixando o interesse do Estado
e outra buscando realizar o interesse do particular.
O fundamento da atividade notarial, bem como do direito, é a segurança jurídica.
É por conta desse objetivo que o Estado impõe a prof‌ilaxia notarial. A prof‌ilaxia é uma
prevenção em face do potencial, mas concreto, mal. Se a prevenção não for feita, o mal
se realizará. O tabelião é, pois, o Estado protegendo os interesses particulares com re-
levância e ref‌lexos para a sociedade e para o próprio Estado.
Como ente estatal, o tabelião está sujeito aos princípios da administração. E, como
agente a serviço dos particulares, o tabelião deve operar em obediência aos princípios
do direito privado.
Não há contradição: as duas faces da atividade harmonizam princípios oriundos
do direito público em face daqueles do direito privado. Ademais, a própria atividade
notarial constitui princípios sob os quais o tabelião deve operar.
1. DE PLÁCIDO E SILVA, O. J. Vocabulário jurídico. 21. ed., atual. por Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. Rio
de Janeiro: Forense, 2003, p. 639.
EBOOK TABELIONATO DE NOTAS_2ed.indb 27EBOOK TABELIONATO DE NOTAS_2ed.indb 27 21/04/2021 15:21:1621/04/2021 15:21:16
TABELIONATO DE NOTAS • PAULO ROBERTO GAIGER FERREIRA E FELIPE LEONARDO RODRIGUES
28
Classif‌icamos os princípios notariais em atípicos – decorrentes de outras áreas – e
típicos – aqueles que são próprios da natureza da atividade.
4.1.1 Princípios atípicos
Os princípios atípicos da atividade notarial classif‌icam-se em: a) princípios cons-
titucionais da administração pública; b) princípios de direito privado; e c) princípios
de direito registral.
4.1.1.1 Princípios constitucionais da administração
O tabelião deve observar os princípios constitucionais da administração, que estão
condensados no art. 37 da Constituição Federal, quais sejam: legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e ef‌iciência.
4.1.1.1.1 Princípio da legalidade
O princípio da legalidade, para o tabelião, signif‌ica agir conforme a lei e f‌iscalizar
rigorosamente o cumprimento da lei nos atos que instrumentaliza. Os requisitos formais
dos atos estão claramente previstos – ainda que incompletos – no art. 215 do Código
Civil. A Lei n. 7.433/85 e seu regulamento acrescem requisitos documentais somente
para os atos relativos a imóveis, apesar de pretenderem ir além.
É frequente, na atividade, o tabelião enfrentar situações em que a lei está descum-
prida e os usuários buscam o ato notarial para sanar a ilegalidade ou irregularidade, no
todo ou em parte. Entendemos que é possível a intervenção nestes casos, cumprindo
e buscando atender justamente ao princípio da legalidade e à segurança jurídica, base
de todo o direito.
Prof‌issionalmente, o tabelião não pode fazer qualquer coisa. Mas pode e deve agir
no estrito cumprimento das competências previstas na Lei Notarial e Registral, a Lei n.
A forma dos atos é de responsabilidade exclusiva do tabelião, prof‌issional do
Direito com competência e autonomia (art. 3º) para escolher o instrumento adequado
dentre aqueles previstos no art. 7º da Lei n. 8.935/94. Mesmo vinculado ao princípio
da legalidade, o tabelião tem ampla discricionariedade para a escolha da forma mais
adequada (art. 6º, II) de instrumentalizar o ato. O tabelião não está restrito aos atos e
negócios tipif‌icados no Código Civil ou nas demais normas postas, podendo formalizar
atos ou negócios atípicos.
Usualmente, os atos notariais são praticados sobre o papel. A lei não determina,
porém, que assim seja; logo, entendemos possível ao notário adotar o suporte eletrônico.
Aliás, o revogado Código de Processo Civil de 1973, em seus arts. 383 e 384, já previa
a possibilidade de qualquer espécie de reprodução.
O novo Código de Processo Civil é mais enfático e, no art. 193, informa que os
atos processuais podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam
EBOOK TABELIONATO DE NOTAS_2ed.indb 28EBOOK TABELIONATO DE NOTAS_2ed.indb 28 21/04/2021 15:21:1621/04/2021 15:21:16

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT