Da ideologia à autenticidade na compreensão dos pressupostos do acontecer do direito material no processo: uma aposta paradoxal na ação de direito material como categoria hermenêutica

AutorDaniela Boito Maurmann Hidalgo
Páginas153-174
DA IDEOLOGIA À AUTENTICIDADE NA
COMPREENSÃO DOS PRESSUPOSTOS
DO ACONTECER DO DIREITO
MATERIAL NO PROCESSO:
uma aposta paradoxal na ação de Direito
material como categoria hermenêutica
Daniela Boito Maurmann Hidalgo1
O presente estudo trata dos problemas concernentes à relação entre
Direito material e Processo, procurando demonstrar que a negação,
pela doutrina majoritária, da ação de Direito material, considerada
mero slogan, é a grande fonte da subtração do mundo prático e, por
isso, da inefetividade do processo e da consequente não concreti-
zação dos direitos (pretensões) de Direito material, que dependem
do processo para realizar-se. Para tanto, busca, na (des) construção
da pré-compreensão dessa relação, delinear o modo como essa rela-
ção se desenvolveu até a completa autonomia entre Direito material
e processo, demonstrando que esse alheamento não foi superado.
Analisa, em seguida, como o paradigma da modernidade, como era
da técnica, se projeta nessa relação, transformando o Direito mate-
rial em produto do processo, em que a essência do Direito mate-
1 A autora é Mestre em Direito, título obtido na Universidade do Vale do Rio dos Sinos –
UNISINOS –, onde, defendendo dissertação que veiculava a tese ora resumida, sob orienta-
ção do Prof. Dr. Ovídio Araújo Baptista da Silva, em banca examinadora formada pelo Prof.
Dr. Lenio Luiz Streck e pelo Prof. Dr. Sérgio Cruz Arenhardt, obteve a nota máxima. É Es-
pecialista em Direito Processual Civil, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul – PUC-RS. É, ainda, Defensora Pública do Estado do Rio Grande do Sul, docente da
FARGS (Faculdades Riograndenses), membro do corpo docente para concursos públicos da
FMP (Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul) e
docente em cursos de graduação e pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil. Autora
da obra Relação entre direito material e processo; uma compreensão hermenêutica: compreensão e reflexos
da afirmação da ação de direito material (Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010), além de arti-
gos jurídicos publicados no Brasil e no exterior.
Resumo
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rial, o que ele é, não é considerada. Procura, a partir disso, buscar
os elementos que levam à possibilidade de aniquilação do Direito
material pelo processo, em que o Direito material não é o que ele é,
mas o que diz dele o processo, o que só é possível porque a força do
Direito material – a ação de Direito material – fora negada. Nesse
contexto, o objetivo é demonstrar que a negação da ação de Direito
material subtrai as possibilidades/pressupostos do acontecer do Di-
reito material no processo. O desiderato final é fundamentar a tarefa
hermenêutica da ação de Direito material. O embasamento teórico
está, no que concerne à defesa da ação de direito material, na doutri-
na de Pontes de Miranda e Ovídio Araújo Baptista da Silva. A leitura
hermenêutica que se propõe busca, fundamentalmente, em Martin
Heidegger e Hans-Georg Gadamer, as condições de possibilidade
de desvelamento da ideologia que está à base da negação da ação de
Direito material e a projeção de uma visão autêntica da relação entre
Direito material e processo, em que a ação de Direito material é a
fonte de irradiação de efeitos e fala ao processo como o modo-de-ser
do Direito material.
1 Introdução
O presente trabalho se propõe a projetar uma visão autêntica do pro-
cesso em sua relação com o Direito material, investigando o modo como essa
relação foi (des) construída, com o paulatino abandono do real, para projetar
uma virada: da ideologia à autenticidade na compreensão dos pressupostos
do acontecer do Direito material no processo.
É necessária a compreensão do desenvolvimento dessa relação no de-
correr da história, desconstruindo os pré-juízos da tradição2, para desvelar o
horizonte do qual parte o intérprete quando ele se depara com a pergunta
pela tarefa de realização do Direito material no processo. Isso porque tal re-
lação, preocupada apenas com o plano normativo, atende aos pressupostos
de um Estado liberal que não se preocupa com a realização das pretensões no
2 Quando se fala em tradição, tem-se em mente o que foi tematizado por Gadamer, do qual
se extrai: “O que é consagrado pela tradição e pela herança histórica possui uma autoridade que se tornou
anônima, e nosso ser histórico e finito está determinado pelo fato de que também a autoridade do que foi
transmitido, e não somente o que possui fundamentos evidentes, tem poder sobre nossa ação e nosso com-
portamento. [...]. É isso, precisamente, que denominamos tradição: ter validade sem precisar de fundamen-
tação”. GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista:
Universitária São Francisco, 1997. v. 1. p. 372.
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