Direito à Propriedade

AutorGuilherme Sandoval Góes/Cleyson de Moraes Mello
Páginas533-557
Capítulo 16
Direito à Propriedade
16.1. Introdução
O tratamento constitucional do direito fundamental de propriedade en-
contra amparo em diversas disposições de seu texto, destacando o condiciona-
mento do exercício de tal direito ao atendimento de sua função social. Ressal-
tando-se, ainda, que tanto o direito à propriedade privada quanto a necessidade
de alcançar sua função social são igualmente tratados como princípios da ordem
econômica.
Aduz o art. 5º, XXII, CRFB/88 que “é garantido o direito à propriedade”.
Entendemos o direito à propriedade como direito de estrutura complexa visto
abranger os direitos de usar, gozar, dispor e reivindicar aquilo que é objeto de
tal direito, nos quais deve ser observada sua função social, cuja disciplina não
somente na seara constitucional, mas, também, infraconstitucional que se
en-contra inserta na Parte Especial, Livro III, do Código Civil que trata so-
bre o direito das coisas, notadamente pelos arts. 1228 e seguintes: “Art.
1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o
direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou de-
tenha. “Qual o conceito de propriedade? As definições doutrinais da proprieda-
de são numerosas.
Segundo Pontes de Miranda, em sentido amplíssimo, propriedade “é o do-
mínio ou qualquer direito patrimonial. Tal conceito desborda o direito das coi-
sas. O crédito é propriedade. Em sentido amplo, propriedade é todo direito ir-
radiado em virtude de ter incidido regra de direito das coisas. Em sentido quase
coincidente, é todo direito sobre as coisas corpóreas e a propriedade literária,
científica, artística e industrial. Em sentido estrítissimo, é só do domínio”.1
533
1 PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. Parte especial. Tomo XI. 2. ed.
Rio de Janeiro: Borsoi, 1958, p. 9.
Para Clóvis Beviláqua, a propriedade, considerada como um direito, “é o
poder de dispor, arbitrariamente, da substância e das utilidades de uma coisa,
com exclusão de qualquer outra pessoa”.2
Consoante Serpa Lopes, a palavra propriedade possui um sentido que nasce
do seu próprio termo. “A coisa é própria ao proprietário nesse sentido de só a
ele, em princípio caber a utilização dos seus serviços. E era precisamente a isto
que os Romanos denominavam de dominium, por isso que o seu titular era em
princípio senhor da coisa, fazendo dela o que bem quisesse. A palavra proprie-
dade vem do latim – proprietas – derivada de proprius, significando o que per-
tence a uma pessoa. No domínio do Direito, a palavra propriedade possui um
amplo sentido, pois serve a indicar toda a relação jurídica de apropriação de um
bem qualquer, corpóreo ou incorpóreo”.3
Cunha Gonçalves entende que a definição de Scialoja é insuficiente, já que
este afirma que a propriedade “é uma relação de direito pela qual uma coisa,
havida como pertencente a certa pessoa, fica sujeita complementarmente à
vontade desta em tudo o que não seja proibido pelo direito público ou pela con-
corrência de direito alheio”.4
Cunha Gonçalves afirma que é difícil fixar de forma rígida o conceito de
propriedade, já que o referido instituto depende dos elementos temporal e es-
pacial. Daí que prefere a seguinte definição: “direito de propriedade é aquele
que uma pessoa singular ou coletiva efetivamente exerce numa coisa certa e de-
terminada, em regra perpetuamente, de modo normalmente absoluto, sempre
exclusivo, e que todas as utras pessoas são obrigadas a respeitar”.5
Roberto de Ruggiero, professor da Universidade Real de Roma, destaca
duas definições de propriedade em razão do seu alto valor científico, quais se-
jam: a definição de propriedade proposta por Filomusi, segundo a qual “a pro-
priedade é o domínio geral e independente de uma pessoa sobre uma coisa, para
fins reconhecidos pelo direito (lei) e dentro dos limites pelo direito estabeleci-
dos”6 e a definição apresentada por Scialoja, acima mencionada. O professor
italiano dá preferência a esta definição.7
534
2 BEVILÁQUA, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil comentado por Clóvis
Beviláqua. V. 1. Edição histórica. Rio de Janeiro: Rio, 1976, p. 1004.
3 SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil: direito das coisas. Vol. VI. 5. ed.
Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2001, p. 281-282.
4 SCIALOJA, Lezioni di dir. civ., p. 134 apud CUNHA GONÇALVES, Luiz da. Tratado
de direito civil. Volume XI. Tomo I. São Paulo: Max Limonad, 1958, p. 207-208.
5 Ibid., p. 208-209.
6 Diritti reali, p. 131 e seguintes apud RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito
civil. Vol. II. São Paulo: Saraiva, 1958, p. 371-372.
7 Ibid.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT