Poder Legislativo

AutorGuilherme Sandoval Góes/Cleyson de Moraes Mello
Páginas807-890
Capítulo 23
Poder Legislativo
23.1. Introdução
O intuito deste capítulo é analisar a estrutura e funções do Poder Legislati-
vo, suas comissões, aí incluídas as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI),
o estatuto dos congressistas e, finalmente, o processo legislativo brasileiro como
um todo.
No entanto, antes de examinar o Poder Legislativo, impende analisar as di-
ferentes acepções do conceito de poder, de modo a compreender a organização
dos poderes do Estado brasileiro, quais sejam: Poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário.
23.2 Organização dos Poderes
No âmbito da doutrina, a expressão poder possui diferentes acepções, va-
lendo destacar, em primeiro lugar, a vertente que vislumbra o poder como re-
velação da soberania popular, tal qual consta no art. 1º, § único, de nossa Carta
Magna, cujo texto reza que todo o poder emana do povo, que o exerce por meio
de representantes (democracia representativa) ou diretamente (democracia
participativa).
A segunda acepção guarda a intelecção de poder enquanto função, exata-
mente como previsto nos artigos 44, 76 e 92, da Constituição de 1988, onde se
lê que a função legislativa é exercida pelo Congresso Nacional, que se compõe
da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, com legislatura de quatro anos,
a função executiva é exercida pelo Presidente da República, auxiliado pelos Mi-
nistros de Estado e, finalmente, a função jurisdicional exercida pelos órgãos do
Poder Judiciário.
Destarte, a partir dessa segunda acepção, pode-se afirmar que a divisão or-
gânica do poder se estabelece a partir da especialização de funções do Estado
mediante os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, que exercem funções
típicas e atípicas. Cabe ao Legislativo elaborar leis (função legiferante ou legis-
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lativa), ao Executivo administrar e aplicar na prática a lei (função administrati-
va) e ao Judiciário julgar conflitos na busca da pacificação social (função jurisdi-
cional).
Já a terceira acepção, menos examinada pela doutrina pátria, vislumbra o
poder do Estado como uma combinação de vontades (de indivíduos e de grupa-
mento de indivíduos) e meios (recursos naturais do Estado), cujo desiderato é
formulação estratégica para a busca do bem comum e para a consecução dos
objetivos fundamentais do Estado, tal qual preconizado no artigo 3º, da Consti-
tuição de 1988, que reza:
Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I –
construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvi-
mento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem pre-
conceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação.
Muito embora esta terceira acepção de poder seja uma conjunção de von-
tades e meios, com o intuito de criar a estratégia nacional para a busca do bem
comum e dos objetivos fundamentais do Estado, a manifestação do poder so-
mente é possível a partir da vontade de indivíduos e de grupamento de indiví-
duos, o que evidentemente demonstra que a realização do poder nacional é um
fenômeno essencialmente humano, na medida em que somente o homem é ca-
paz de usar os meios disponíveis para a consecução dos objetivos fundamentais
previstos na Constituição, Carta Ápice da sociedade como um todo, nos termos
do seu artigo 3º, incisos I a IV, como já visto.1
É nesse sentido que o poder nacional deve ser sempre entendido como um
todo, uno e indivisível, tal qual a soberania do Estado, também una e indivisível,
mas, isso não significa dizer que a estratégia nacional, fazendo a conjugação de
vontades e meios, possa se materializar a partir de cinco expressões desse poder,
a saber: política; econômica ; cultural; militar e científico-tecnológica. O estudo
do poder nacional é feito assim a partir dessas cinco expressões, cujo mérito é o
de planejar melhor a consecução dos objetivos fundamentais constitucionais.
Observe, com atenção, que tais objetivos (construir uma sociedade livre,
justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e, promover o bem
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1 Portanto, o poder nacional não pode ficar submetido à dimensão cratológica de um
determinado grupo social ou econômico, mas, sim, voltado para a formulação da estratégia
nacional visando a busca do bem comum e a consecução dos objetivos fundamentais constitu-
cionais. Destarte, a ideia de poder nacional projeta a imagem de um sistema complexo que
cria uma macro instituição especial – o Estado – a quem o povo delega poderes a serem
exercidos em seu nome e cuja finalidade é a busca do bem comum.
de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras
formas de discriminação) só serão alcançados por meio da aplicação do poder
nacional mediante a conjugação de vontades e meios a partir das cinco expres-
sões do poder nacional.
Finalmente, a quarta acepção da expressão poder que fica atrelada aos ele-
mentos estruturais desse poder enquanto órgão do Estado, nos termos do art.
2º, da CRFB/88, cuja dicção estabelece: “são órgãos da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.
Essa visão de poder enquanto órgão do Estado é a mais usada pela doutrina
para examinar o princípio da separação de poderes. Com efeito, sem embargo
da intelecção de que o poder é uno e indivisível, a tripartição do poder em três
órgãos (Legislativo, Executivo e Judiciário), juntamente com o exercício das
suas três funções estatais típicas (função legislativa, administrativa e jurisdicio-
nal) servem como limites ao próprio poder do Estado, onde se destacam o rol de
direitos fundamentais do cidadão comum, que se coloca acima das razões de
Estado e o princípio da separação de poderes. Separar os poderes da União é
limitar o poder do Estado.
Eis aqui os dois pilares de sustentabilidade do Estado Democrático de Di-
reito.
23.3. Mecanismos de Freios e Contrapesos (Checks and Balances)
Dentro do extenso quadro de princípios constitucionais fundamentais, des-
ponta o princípio da separação de poderes (art. 2º, CRFB/88) que consagra a in-
dependência e a harmonia entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
A tripartição de poderes é cláusula pétrea, logo não admite emenda consti-
tucional tendente a aboli-la, nem mesmo por instrumentos de democracia pleb-
iscitária rousseauniana (democracia participativa), ou seja, plebiscito ou refe-
rendo.
Tal princípio foi esboçado originariamente por Aristóteles, muito embora
seja Montesquieu seu grande teorizador. Nesse sentido a lição de Dalmo Dallari:
Fortemente influenciados por MONTESQUIEU, os constituintes norte-
americanos acreditavam fervorosamente no princípio da separação de po-
deres, orientando-se por ele para a composição do governo da federação.
Elaborou-se, então, o sistema chamado de freios e contrapesos, com os três
poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e harmônicos
entre si, não se admitindo que qualquer deles seja mais importante que os
demais.2
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2 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do estado. 29. ed. São Paulo:
Saraiva, 2010, p. 258.

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