Delitos de ação penal pública incondicionada: composição civil e pacificação social

AutorMarcelo de Oliveira Milagres e Pablo Gran Cristóforo
Páginas71-80
ART. 74
JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL
71
Como visto, a solução apresentada até aqui é cabível apenas nas duas espécies
de delitos, quais sejam, delitos de ação penal pública condicionada à representação
e de ação penal privada.
Quanto ao crime de ação penal pública incondicionada, a composição civil não
impede a persecução penal, mesmo porque, como regra, nos crimes dessa modali-
dade, a vítima principal é a coletividade ou o ente abstrato “Estado”. Em casos tais,
importa ao Estado a punição de pessoas que tenham ultrapassado, com sua ação er-
rante (delitos), os limites de tolerância social e das regras de convivência harmônica,
não podendo recair sobre o particular (vítima) a escolha e a viabilidade de punição.
É por tal motivo que eventual composição civil entre autor do fato e vítima
secundária não impede o Ministério Público de ajuizar ação penal e, ao f‌inal, exigir
a condenação do acusado. Insta alertar, entretanto, que a composição civil, nos casos
de ação penal pública incondicionada, produzirá atenuação da pena, na dosimetria
trifásica.
É no art. 59 do Código Penal, na análise das circunstâncias judiciais e na f‌ixação
da pena-base, mais especif‌icamente no quesito “consequências do crime”, que a
composição civil inf‌luenciará na dosagem da pena. Dessa forma, embora não impeça
a propositura e a tramitação da ação penal, produzirá, ao f‌inal, efeitos positivos na
aplicação da pena.
DELITOS DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA: COMPOSIÇÃO
CIVIL E PACIFICAÇÃO SOCIAL
É corriqueiro, na prática, que a conciliação entre o autor do fato e a vítima
secundária, na hipótese de infração de ação penal pública incondicionada, acarrete
arquivamento do expediente, sob o argumento de obtenção da pacif‌icação social.
Assim, mesmo não sendo a hipótese contemplada na lei, alguns membros do Minis-
tério Público e da Magistratura aceitam o arquivamento dos procedimentos crimi-
nais, depois de acordo entre os envolvidos, acreditando terem atingido o principal
objetivo do Judiciário, que é a pacif‌icação social, com o restabelecimento do status
quo anterior ao delito.
Em verdade, tal solução não encontra expressa previsão legal. Ao se aceitar
a pacif‌icação social, anuindo-se ao acordo entre os envolvidos em delito de ação
penal pública incondicionada, desconsideram-se os ref‌lexos erga omnes dos delitos
dessa natureza.
Não se pode monetarizar tudo.6 Aceitar o pagamento de indenização como
forma de substituir o Direito Penal é o mesmo que negar-lhe legitimidade na guarida
6. Cf. SANDEL, Michael J. O que o dinheiro não compra: os limites morais do mercado. Trad. Clóvis Marques.
Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2016.
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