Estatuto social das associações

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ESTATUTO SOCIAL
DAS ASSOCIAÇÕES
Conforme mencionado anteriormente, o estatuto contém dados da criação
e prevê a regulamentação do funcionamento e extinção da associação.
Dessa forma, pode-se conceituar o estatuto como a norma interna infra le-
gal onde prevê dados da criação e que possui por escopo regulamentar o fun-
cionamento e extinção da associação.
Não concordamos com o entendimento de que o estatuto social somente
seja aplicável aos associados.
Há uma situação em que o mesmo pode ser aplicado a terceiros, desde que
a natureza do preceito estatutário possibilite tal aplicação.
Trata-se de pessoa que mesmo não sendo associado esteja (mesmo por um
curto espaço de tempo) equiparado ao membro da associação.
Cite-se como exemplo uma gura bastante comum nos clubes recreativos: o
convidado do associado. Apesar de tal pessoa não ser associada, a mesma está
vinculada ao estatuto do clube naquilo que for compatível, porque sua nature-
za é equiparada ao associado.
Ademais, como bem apontou Jos é Frederico Marques ao citar Buenaventura
Pellisé Prats “os estatutos ‘são leis obrigatórias para os próprios membros
da Associação, e até para estranhos, enquanto não anuladas suas cláusulas’.
(Buenaventura Pellisé Prats, verbete ‘Asociacion’, in ‘Enciclopedia Juridica’,
1951, tomo III/8”.124
124 RT 445/20 .
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WENDEL DE BRITO LEMOS TEIXEIRA
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Destarte, a regra estatutária de tratar com urbanidade os funcionários de
uma associação ou de não indenizar furto de veículos no estacionamento da
mesma a ele também é aplicável por também ser compatível com sua nature-
za de terceiro. Por outro lado, não pode o mesmo ser excluído da associação
porque tal punição é incompatível com sua natureza de terceiro (que não é
associado).
Por todo o exposto, mostra-se claro que o estatuto social é aplicável não
somente aos associados, mas também às pessoas a eles equiparados, desde que
o preceito aplicado seja compatível com a condição dessas pesso as.
O estatuto, apesar de ser a lei fundamental da associação, tamb ém pode ser
regulamentado por regimento interno (um ou mais) e normas administrativas,
as quais serão supletivas e hierarquicamente inferiores aos ditos estatutos.
Dessa forma, na hipótese de colisão entre o estatuto e o regimento inter-
no ou norma administrativa, prevalece o estatuto por sua posição hierárquica
superior.
O Regimento Interno e as atas, ao contrário do estatuto e do ato constitu-
tivo, não precisam ser registrados para terem validade, por inexistir obrigação
legal para tanto.
Se as decisões assembleares contrariarem o Código Civil, Estatuto e regi-
mento interno da associação, as decisões serão nulas a princípio:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA DE URGÊNCIA.
ASSOCIAÇÃO CIVIL. DELIBERAÇÃO EM ASSEMBLEIA
GERAL. DESTITUIÇÃO DE PRESIDENTE ADMINISTRATIVO.
NULIDADE. NORMAS PREVISTAS NO CÓDIGO
CIVIL. INOBSERVÂNCIA. VIOLAÇÃO ESTATUTÁRIA.
- O art. 59 do Código Civil de 2002 estabelece que para os ns de des-
tituição de administradores de associações, a assembleia geral deve-
rá ser convocada com o referido intuito de forma especíca, além de
ser necessária a previsão no estatuto de quorum para a sua instalação.
- São nulas as deliberações ocorridas em assembleia geral se vericada pa-
tente violação às previsões contidas no Código Civil e às regras previstas
no próprio estatuto da associação. (TJMG- AI-Cv 1.0686.15.014677-
3/001 – Rel. Des. Pedro Bernardes - DJ 28/04/2016)
No entanto, recomenda-se o regimento para dar publicidade aos mesmos.
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ESTATUTO SOCIAL DAS ASSOCIAÇÕES
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13.1 INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2.031
Em artigo de nossa autoria sobre a legalidade da permanência da socie-
dade de cônjuges casados sob o regime da comunhão universal após o adven-
to do novo Código Civil, deixamos claro nosso entendimento da inconstitu-
cionalidade do art. 2.031 do CC125, pelo que utilizamos o mesmo argumento
na presente hipótese por sua compatibilidade lógica.
O art. 2.031 do CC regra que as associações já existentes quando do adven-
to do novo código (entre outras pessoas jurídicas) teriam prazo certo para se
adaptar às disposições do novo diploma civil.
As associações criadas sob a égide do Código Civil de 1916 não são obriga-
das a se adaptarem aos dispositivos do novo diploma civil, sob pena de afronta
ao princípio do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da segurança jurí-
dica, conforme previsão do art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal.
O brocardo “lex non habet oculos retro, ou seja, “a lei não olha para trás”, é
aplicável ao presente caso.
Como é notório, existe no direito a seguinte máxima: tempus regit actum (o
ato é regido pelo tempo em que foi feito). Assim, percebe-se mais uma vez que as
associações constituídas anteriormente à vigência do novo Código Civil devem
ser regidas pela lei da época de sua constituição, ou seja, o Código Civil de 1916.
Por via de consequência lógica, entendemos que não é imprescindível ne-
nhuma modicação no estatuto e ato constitutivo das associações criadas an-
teriormente ao novo Código Civil, haja vista que o art. 2.031 do CC é incons-
titucional por afrontar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito ao querer
aplicar uma lei nova a negócios jurídicos que se deram antes de sua entrada
em vigor.
As leis retroativas causam repugnância entre os operadores do Direito se-
gundo ensinamentos de Hans Kelsen:
As leis retroativas são consideradas censuráveis e indesejáveis porque
fere nosso sentimento de justiça iningir uma sanção, especialmente
uma punição, a um indivíduo por causa de uma ação ou omissão as
quais o indivíduo não poderia saber que se vincularia tal sanção.126
125 TEIXEIR A, Wendel de Brito Lemos Teixeira; ATTIE, Jose Amér ico Fonseca. A legalidade da
permanência da so ciedade de cônjuges casados sob o reg ime da comunhão universal após o
advento do novo Código Civil . Revista Forense Eletrônic a, n. 378.
126 KELSEN, Han s. Teoria geral do direito e do estado. São Paulo: Ma rtins Fontes, 1998; p. 61.
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