Responsabilidade civil por destruição de bem imóvel inventariado como patrimônio cultural

AutorAna Maria Moreira Marchesan
Ocupação do AutorPromotora de Justiça no Estado do Rio Grande do Sul
Páginas27-44
RESPONSABILIDADE CIVIL POR DESTRUIÇÃO DE
BEM IMÓVEL INVENTARIADO COMO PATRIMÔNIO CULTURAL
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APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REEXAME
NECESSÁRIO DE OFÍCIO. MUNICÍPIO DE ARAGUARI.
IMÓVEL DA DÉCADA DE VINTE. “RELICÁRIO”. ALTER-
NATIVAS PARA A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO HIS-
TÓRICO E ARTÍSTICO. INVENTÁRIOS, REGISTROS,
VIGILÂNCIA, TOMBAMENTO E DESAPROPRIAÇÃO.
ART. 216, § 1º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.
TOMBAMENTO NÃO HOMOLOGADO PELO PREFEI-
TO MUNICIPAL. DISCRICIONARIEDADE. RESPONSA-
BILIDADE DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. NÃO
CONFIGURAÇÃO. DESCARACTERIZAÇÃO DO BEM
APÓS O INVENTÁRIO. NOTIFICAÇÃO DO PROPRIE-
TÁRIO. RESPONSABILIDADE. DANO MORAL COLE-
TIVO EVIDENCIADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO.
SENTENÇA REFORMADA. RECURSO VOLUNTÁRIO
PREJUDICADO.
I. Por analogia ao artigo 19, caput, primeira parte, da Lei da
Ação Popular, é de se proceder ao reexame necessário da sen-
tença proferida na Ação Civil Pública que julgou improceden-
tes os pedidos formulados pelo Ministério Público Estadual;
II. O tombamento é apenas um dos institutos que tem por m
a tutela do patrimônio histórico e artístico, mas não o único:
tário como instrumento jurídico de preservação do pa-
trimônio cultural, ao lado do tombamento, da desapro-
priação, dos registros, da vigilância e de outras formas
de acautelamento e preservação (art. 216, § 1º, CR/88);
IV. O bem de valor cultural inventariado merece a proteção
do Estado, de tal sorte que o seu proprietário tem o dever
de protegê-lo, pois este instituto de proteção, ao lado dos
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Ana Maria Moreira Marchesan
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demais, constitui importante cadastro de bens sociais de
inegável valor sociocultural, razão porque não pode o Po-
der Judiciário ignorá-lo, sob pena de esvaziar a memória de
um povo;
V. A noticação do proprietário deagra o tombamento
provisório, devendo o proprietário se abster de realizar
qualquer intervenção no bem, sob pena de fazê-lo com
vontade livre e consciente no sentido de causar ofensa ao
sentimento coletivo, ou de valores compartilhados pela co-
letividade;
VI. As diversas atividades de dilapidação do antigo “Reli-
cário”, intensicadas após o inventário e a noticação do
tombamento provisório, evidenciam a responsabilidade do
proprietário pelos danos causados à coletividade;
VII. Afasta-se a responsabilidade do Prefeito Municipal
pela não homologação do tombamento, visto que aludido
ato administrativo reveste-se de natureza discricionária e,
no caso, o alcaide quedou-se à constatação de que o bem, há
tempos, vinha sendo paulatinamente dissipado e arruinado
pelo segundo réu;
VIII. O dano moral coletivo constitui a agressão a bens e va-
lores jurídicos comuns a toda a coletividade ou parte dela.
Cediço que um imóvel histórico representa um determina-
do ponto da história e do desenvolvimento de uma comuni-
dade. Ao se contemplar um espaço de relevância histórica,
esse espaço evoca lembranças de um passado que, mesmo
remoto, é capaz de produzir a sensação de reviver momen-
tos e fatos ali vividos. Cada edicação, portanto, carrega
em si não apenas o material de que é composto, mas toda
uma gama de signicados e vivências ali experimentados.
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