Distinções teóricas

AutorWladimir Novaes Martínez
Ocupação do AutorConsultor de Previdência Social
Páginas359-436
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CAPÍTULO XIX
DISTINÇÕES TEÓRICAS
No estudo da técnica protetiva e do seu ramo jurídico disciplinador (Direito
Previdenciário), o estudioso frequentemente depara-se com denominações ma-
niqueisticamente postadas. Usualmente, são ideias em oposição, comumente
práticas aproximadas, mas não iguais, idealizações paralelas ou convergentes e
pontos de vista dicotomizados.
Às vezes, a semelhança das palavras conduz a certa perplexidade na identifi-
cação do objeto sob enfoque, caso da instância (nível jurisdicional da organização
dos tribunais) e entrância (área geográfica de circunscrição da competência des-
ses mesmos tribunais). Em outras ocasiões, os institutos jurídicos são avizinhados
por natureza, caso da filiação e da inscrição, uma representando um fato mate-
rial eleito pelo legislador — exercício de atividade profissional ou manifestação de
vontade da pessoa — e a outra, um ato jurídico administrativo. Quando as ideias
se confrontam, alternando-se o direito e a obrigação, é fundamental separá-los
ontologicamente para a compreensão do fenômeno pesquisado.
Na maioria dessas hipóteses é recomendável tentar apurar a individualidade,
estabelecida a diferença por determinação legal, construção doutrinária ou simples
conclusão da lógica. Nisso reside a distinção.
Esse rol de casos particulares é dividido em teóricos e práticos ou gerais
e especiais, decompostos, nesta primeira parte, em: a) técnicas de proteção; b)
aspectos jurídicos; c) questões lógicas; d) sujeito passivo; e) aspectos do Direito
do Trabalho; f) relação de previdência social; g) Direito Procedimental; h) regras
fiscais; i) previdência complementar; e j) órgãos públicos.
191. Técnicas de proteção social
O instrumento de proteção social adotado no País é indicação da maior
importância para o exame dos seus institutos, na aplicação e na interpretação
da norma positivada. Quando da apreciação de questões teóricas ou práticas,
é significativo ter, por pressuposto básico, o instrumento de proteção social
acolhido pela legislação e implantado administrativamente pela União. Os limites
dessa técnica, por sua natureza abrangente e dinâmica operacional, são sempre
difíceis de determinar-se, razão pela qual é sempre bom trazer as concepções
correspondentes à discussão.
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191.1. Seguro e seguridade social
Conforme os dizeres do art. 194, I/VII da Carta Magna, ela objetiva a
seguridade social. Ainda de acordo com o texto constitucional, trata-se de um
conjunto integrado de previdência, assistência e saúde. O dispositivo é nitidamente
declaratório, programático e não dispositivo. Ao arrolar os princípios definidores,
percebe-se a descrição da técnica protetiva desejada pelo constituinte e ela não
é, seguramente, a própria seguridade social, mas um seguro social tendente à
seguridade social. Com as emendas constitucionais de 1998 e seguintes, talvez
venha tornar-se uma verdadeira seguridade social ou dela bastante aproximada.
Seguro social ou previdência social, sob o prisma particular de sua finalidade,
pode ser conceituado como a técnica de proteção social cujo objetivo é obtenção
dos meios indispensáveis à subsistência da pessoa humana — quando esta não
pode obtê-los ou não é socialmente desejável auferi-los pessoalmente por meio
do trabalho, por motivo de maternidade, nascimento, incapacidade, invalidez,
desemprego, prisão, idade avançada, tempo de serviço ou morte — mediante
contribuição obrigatória ou facultativa, proveniente da sociedade e de cada um
dos participantes (A Seguridade Social na Constituição Federal, p. 84).
Seguridade social é técnica de proteção social, custeada solidariamente por
toda a sociedade segundo o potencial de cada um, propiciando universalmente
a todos o bem-estar das ações de saúde e dos serviços assistenciários em nível
mutável, conforme a realidade socioeconômica, e os das prestações previdenciárias,
essas últimas em função das necessidades e não da capacidade dos destinatários
(A Seguridade Social na Constituição Federal, p. 56-57).
Uma compreendendo a outra ou uma sendo uma espécie tanto quanto a
outra, técnicas, elas não se confundem.
191.2. Previdência e assistência social
Dentro do arcabouço da seguridade social convivem ações governamentais
e particulares pertinentes à previdência e à assistência. São duas técnicas dis-
tintas e inconfundíveis, cujos traços marcantes carecem ser permanentemente
avultados, embora, como tantas vezes afirmado, seja embaraçoso determinar os
seus limites reais.
Sob a ótica da divisão de domínios, é a participação do trabalhador (pre-
vidência, sob esse ângulo, a instituição na qual o direito deflui da filiação e da
contribuição obrigatórios, e assistência, uma organização em que inexiste direito
do titular, mas potestade do Estado, por ausência de contribuição), não é fácil
estabelecer onde termina a primeira e começa a segunda.
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A participação individual do trabalhador (segurado), em 1994, da ordem de
20% é insignificante diante dos 80% da empresa (leia-se sociedade), possuindo,
pois, aquela um talhe bem assistenciário.
Como instituições, historicamente diferenciadas, podem ser definidas igual-
mente como técnicas protetivas, a primeira alcançando os segurados, contribuintes
obrigatórios ou facultativos, e a segunda, os assistidos, pessoas carentes de recur-
sos mínimos para a sua subsistência.
191.3. Seguro mútuo e privado
O seguro mútuo não se confunde com o seguro privado e a combinação dos
dois, em seu nascedouro, deu origem à previdência social. Ambos prevalecentes
no século passado, de ingresso facultativo, em um caso abrangendo uma categoria
de obreiros e no outro, referidos a quem quisesse dele participar. O seguro mútuo
não objetiva lucro, ao contrário do seguro privado.
191.4. Técnicas sociais e pessoais
O gênero técnica de proteção social compreende instrumentos sociais,
em sua maioria, e mais eficiente em face do princípio da solidariedade social, e
pessoais, as primeiras utilizadas pelo homem desde tempos imemoriais, não de
todo abandonadas pelo indivíduo.
As técnicas pessoais propriamente ditas são físicas e a principal continência
protegida é a higidez do organismo. Com certo viés coletivo, a poupança e até
o FGTS são técnicas pessoais, bem como o entesouramento de pedras preciosas,
objetos de arte ou joias.
Mais elaboradas as técnicas sociais, envolvem o cidadão com a sociedade,
distribuindo os encargos entre as pessoas. Revelaram-se mais úteis e aptas a
atender as necessidades modernas, amplas e diversificadas.
191.5. Universalidade horizontal e vertical
A universalidade da seguridade social e, em particular, a da previdência
social, desdobra-se sob dois ângulos: horizontal, isto é, alcança todas as pessoas
residentes no País, e vertical, ou seja, protege os variados níveis da remuneração
dessas mesmas pessoas.
Todos os trabalhadores devem ser cobertos pelo mesmo regime de proteção,
sem prejuízo de serem geridos por diferentes entidades, como aconteceu em 1960,
com a LOPS, uma lei orgânica e geral igual para os seis IAP existentes à época e
desaparecidos em 31.12.66. Os filiados podem “segurar” toda a remuneração,

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