Questões práticas

AutorWladimir Novaes Martínez
Ocupação do AutorConsultor de Previdência Social
Páginas437-511
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CAPÍTULO XX
QUESTÕES PRÁTICAS
Examinadas as principais distinções teóricas, convém agora considerar as prá-
ticas, as diretamente referentes à execução das primeiras. Pertencem ao dia a
dia, e referem-se a praxes consagradas pela lei, adotadas pelo bom senso, usos e
costumes nascidos na administração pública, por força da experiência e das neces-
sidades de solver os problemas surgidos.
Muitas delas são exteriorizações de princípios básicos ou técnicos, em sua
maioria, soluções encontradas empiricamente e transformadas, no curso do
tempo, em instituições, institutos jurídicos, técnicas e regras válidas na condução
da gestão do fenômeno previdenciário.
As principais são: a) questões envolvendo o fato gerador; b) aspectos gerais
da contribuição; c) diversos aspectos dos benefícios; d) servidor público civil; e)
construção civil; f) disposições penais; g) segurados em geral; h) pensão por morte;
i) salário de contribuição; j) previdência rural; e l) tipos de benefícios.
201. Fato gerador
O fato gerador da contribuição previdenciária, a exação arrecadada pela RFB,
é evento financeiro diretamente envolvido com o trabalho profissional do segura-
do e excepcionalmente, caso do facultativo, tendo a ver com a vontade da pessoa
de se filiar ao RGPS ou com o fato econômico, como a produção rural, o fatura-
mento, a renda dos espetáculos futebolísticos ou o concurso de prognósticos.
A complexidade da produção moderna e das relações laborais gestou um
sem número de parcelas (v. g., remuneração, indenização, ressarcimento e outras),
incluídas ou não no conceito de salário de contribuição, despertando sérias dúvidas
quanto à sua natureza.
São de toda ordem, e sua gama alcança aspectos conceituais e materiais, alguns
lógicos, principalmente jurídicos e contábeis, permeando boa parte da área de custeio.
201.1. Descontável e descontado
Em seu art. 33, § 5º, firmando uma presunção absoluta, o PCSS alude à
contribuição do servidor, empregado, temporário e avulso, dizendo ser dever do
sujeito passivo arrecadá-la e recolhê-la ao FPAS, responsabilizando-se fiscalmente,
caso não se conduza conforme o mandamento legal.
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Não fala expressamente em contribuição descontável ou descontada, mas a
diferença existe, e ela é útil quando da análise desse e de outros dispositivos da lei
e do regulamento.
Em sua versão original, o parágrafo único do art. 45, o PCSS referia-se a
“importâncias descontadas dos segurados ou de terceiros”, convindo verificar se
a locução legal reporta-se ao explicitamente mencionado ou amplia a ideia para as
parcelas descontáveis.
Descontado é o abatido do bruto, não recebido pelo empregado, resultando
o líquido. Valor do desconto é a parcela deduzida. Líquido é a diferença entre o
bruto e o abatido. Desconto, portanto, é o ato de providenciar a dedução, opera-
cionalizá-la de fato, isto é, diminuir a importância a ser recebida pelo trabalhador,
pagando-lhe, como dito, apenas o líquido; é, também, a própria importância.
Deduzida ou não, a fração descontável é aquela a ser descontada. Descontável
abrange descontado, mas a recíproca não é verdadeira.
Na hipótese do art. 33, § 5º, referido, o legislador disciplina o descontável,
isto é, o valor da contribuição a ser retido pela empresa e, posteriormente, recolhi-
do aos cofres do INSS, em juízo avaliável por pessoa dotada de senso comum. Se
o fato gerador é discutível, em termos doutrinários ou jurisprudenciais, não se-lhe
aplicando o princípio do conhecimento da lei, o contribuinte está desobrigado de
proceder à dedução. Cada um desses casos merece estudo, inexistentes regras
positivadas sobre o assunto.
No parágrafo único do antigo art. 45, o texto legal indicava um valor efetiva-
mente descontado, embora possa ser o descontável. Equivocou-se o elaborador da
norma ou pensou nas duas hipóteses.
Já no art. 95, b, quando descrevia crime que passou para o Código Penal (Lei
n. 9.983/00), as quantias ali mencionadas têm de ser as efetivamente descontadas,
para caracterizarem o crime de sonegação previsto. Quando quis referir-se a
fato concreto, então apenas o crédito, assim o disse (art. 95, c). De igual forma,
menciona a contribuição arrecadada dos segurados, no art. 95, d.
A Ordem de Serviço INSS/SAF n. 100/93 tem seu conceito próprio: “As
contribuições do empregado, descontadas ou não, a partir da competência julho
de 1991, inclusive dos domésticos, do trabalhador avulso e as decorrentes da sub-
rogação de que trata o inciso IV do art. 30 da Lei n. 8.212/91, além do disposto
no art. 95 da mesma lei, não serão objeto de parcelamento” (item 29).
201.2. Bruto ou líquido
Usualmente, a medida da base de cálculo da contribuição é o montante
conhecido como bruto, isto é, o real, aquele ainda não descontado. Vale para a
remuneração do empregado e inexiste na ficção fiscal dos contribuintes individuais.
Como dito, valor líquido é o bruto após o desconto.
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No caso do produtor rural, a incidência da taxa recai sobre o montante da
comercialização do produto rural. Sem razão, Telmo H. Ethur e Gilson J. Rasador,
quando sustentam a inconstitucionalidade da base de cálculo descrita in fine do
art. 25 do PCSS. A Constituição Federal fala em resultado da comercialização da
produção rural (art. 195, § 8º), e o art. 25 menciona o valor da receita bruta
proveniente da comercialização, entidades nitidamente diferenciadas. A primeira,
uma fração da segunda (“A Previdência — O Produto Rural”, In: O Estado de S.
Paulo, de 22.4.92, p. 2). Também a parte patronal da empresa incide sobre a
remuneração bruta dos seus prestadores de serviços.
No art. 26, quando define a participação da sociedade nas fontes de
custeio, o PCSS cria uma contribuição atípica em que o quantum da contribuição
é exatamente a importância líquida. Da receita dos concursos de prognósticos,
descontados os “valores destinados ao pagamento de prêmios, de impostos e
de despesas com administração”, resulta uma importância líquida a ser recolhida
ao FPAS. Não há alíquota a ser considerada nessa operação de determinação da
exação.
O PCSS, em seu art. 22, § 6º, prevê uma contribuição de 5% da renda bruta
dos espetáculos esportivos.
201.3. Pagamento ou crédito
Definindo, por assim dizer, o fato gerador da contribuição previdenciária
relativa ao servidor, empregado, temporário e avulso, o PCSS diz ser a remuneração
“efetivamente recebida ou creditada” (art. 28, I), não aclarando tratar-se do crédito
contábil ou do jurídico.
Considerando-se sucessivos círculos concêntricos, do maior para o menor, a
hipótese de incidência é o direito à remuneração, entendido como o poder consti-
tuído e preferivelmente declarado, se imprescindível a declaração por autoridade
competente. Abrangente esse direito, o crédito contábil e este, por sua vez, o
pagamento propriamente dito.
O creditado, isto é, aquele nas possibilidades de vir a ser auferido, é o contábil,
pois o crédito jurídico corresponde à ideia de direito.
Pagamento é concepção mais simples, compreendendo-se como o efetivo
desembolso por parte do empregador.
Assim, tanto faz: a) o segurado ter se apropriado do numerário, b) ele estar
registrado na contabilidade como faculdade a ser exercitada a qualquer momento;
e c) ser direito constituído.
Se a pretensão se encontra em discussão no judiciário, o direito não está
constituído nem declarado, aguardando-se o pronunciamento dos magistrados

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