A globalização, a oit, o trabalhador migrante e as normas de proteção

AutorRonald Silka de Almeida - Renato Luiz de Avelar Bandini
Páginas69-78

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Rünald Silka de Almeida1

Renato Luiz de Avelar Bandini2

1. Introdução

O trabalho dos migrantes é tema de grande preocupação da comunidade internacional, notadamente em tempos de grandes migrações, como as que vêm ocorrendo nos dias de hoje.

O presente estudo tem como objetivo verificar qual o tratamento dado aos trabalhadores imigrantes, proteção, absorção do mercado de trabalho da referida mão de obra, bem como quais os mecanismos de inclusão social apresentados pelo Brasil.

Esta pesquisa tem como ponto de partida o conceito de migração, migrante e imigrante, as noções históricas sobre imigração, quando são abordadas as grandes migrações ocorridas no mundo e suas causas, a globalização e o imigrante, com destaque para os principais desafios enfrentados pelos trabalhadores migrantes.

Em um segundo momento são abordadas as normas internacionais e nacionais que buscam proteger e assegurar tratamento igualitário aos trabalhadores imigrantes.

Trata a presente, portanto, de analisar os motivos que levam a grandes migrações de trabalhadores na história da humanidade, a legislação pertinente e se essa efetivamente vem cumprindo o seu papel de proteger a assegurar tratamento isonômico aos trabalhadores migrantes.

2. Migração, migrante e imigrante - Conceito

Os termos migração, migrante e imigrante de imediato trazem a ideia de deslocamentos humanos, mesmo porque diversos são os motivos que levam o indivíduo ou indivíduos a deixarem o seu local de origem, ele pode ser compelido em razão de sua própria vontade em procurar novos meios de vida, ou decorrente de eventos ocasionados por situações extremas como guerras, fuga da pobreza e da fome, fatores naturais de grande calamidade e que fomentam os deslocamentos, legais ou ilegais, permanentes ou temporários.

Tais deslocamentos se tornam, em muitos, casos de grande impacto nas sociedades - Estados, que recepcionam os indivíduos, tanto é que o tema migração é objeto de cooperação internacional, com a participação crescente de organizações não governamentais, verdadeiras agências de representação de migrantes e refugiados.

Assim, diante da importância e da dinâmica das migrações, passamos inicialmente à conceituação dos termos migração, migrante e imigrante, a fim de também melhor delimitar o estudo.

O termo "migração" designa a movimentação de entrada (imigração) ou saída (emigração) de indivíduo

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ou grupo de indivíduos, geralmente em busca de melhores condições de vida, e é de se observar ainda que essa movimentação pode ser entre países diferentes ou dentro de um mesmo país3, consequentemente "migrante", é aquele que migra.

Já o conceito de "imigrante", está diretamente relacionado com a pessoa que imigra ou imigrou, e que ou quem se estabeleceu em país estrangeiro, e segundo Waldir Vitral é "todo estrangeiro que se fixa em um país, que não o seu, com ânimo definitivo de aí permanecer e desenvolver suas atividades"4.

Assim, observa-se que a definição de trabalhadores migrantes está relacionada ao ânimo de permanecer no novo local e em desenvolver uma atividade, tanto é que Nora Pérez Vichich, p. 108, cita que se definem genericamente como "trabalhadores migrantes internacionais" aquelas pessoas que trabalham em um país que não é aquele em que nasceram".

Já a definição de trabalhador migrante, dada por alguns autores, como é o caso de Ricard Zapata Barrero, trata-se de uma pessoa que emigra de um país para outro para ocupar um emprego no qual não poderá exercer por conta própria, porém a evolução do Direito Internacional ajudou a ampliar essa definição, tanto é que a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e Seus Parentes, de 1990, define como sendo "trabalhador migrante" qualquer pessoa que realize ou tenha realizado uma atividade remunerada em um Estado não nacional, incorporando várias modalidades e categorias de trabalho e trabalhadores independentes e aqueles que anteriormente estavam excluídos de trabalhadores fronteiriços.

Assim, passa-se a uma breve análise histórica sobre a imigração.

2.1. Noções históricas sobre imigração

Desde os primórdios da civilização, o homem como ser social e histórico, diferente do animal que é natural, para sua sobrevivência tem vivido em comunidade. Entre o homem e a natureza há um mediador chamado trabalho que também é social, pois, ninguém consegue produzir individualmente e há a necessidade de se associar para de forma produtiva sobreviver5.

Surge a relação social que é a cooperação acrescida da interdependência consciente. Cada nova conquista humana reescreve a totalidade do ser humano; quando explica-se o homem pela cultura, explica-se pela metade, pois são as relações sociais de produção que dão origem à cultura6. A marca da humanidade no homem não é natural, é artificial porque resulta da arte do trabalho humano. Logo, o homem raciocina, por isso desenvolve o trabalho.

Para adquirir conhecimento o homem precisa da prática social (apropriação da natureza e produção a partir dela).

Na prática social o homem desenvolve conhecimento: a) sobre a natureza; b) da relação do homem com a natureza; e c) da relação do homem com outros homens (campo de conhecimento da sociedade). Essas relações de produção são as fontes de desenvolvimento humano, sendo uma prática social e não mera atividade, e para a aquisição do conhecimento muitas vezes o homem como ser social e gregário7 que é não se fixa definitivamente ao lugar onde nasce, mas empreende migrações de forma a buscar melhores condições de vida.

Deve-se também levar em consideração que um dos fenômenos na atual globalização e que "deve ser destacada é a questão da migração internacional, que assume contornos diferentes e apresenta novos desafios no que se refere à sua análise e à sua interpretação8".

Esclarece Saladini9 em relação à migração internacional que "ainda que esse seja um efeito corrente do movimento de globalização, a migração internacional não é um fenômeno novo, mas algo que sempre existiu e permeia a história da civilização".

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Vanessa Oliveira Batista10, explica que os movimentos migratórios se confundem com a história da humanidade, e deram origem às nacionalidades e à identidade de diversas nações, porém deixa claro que "as migrações focalizadas nos aspectos económicos e político são um fenómeno do mundo moderno e se relacionam diretamente com os postulados do liberalismo, adotados a partir do século XIX"; ocorre porém que "o que era liberdade de ir e vir passou a ser alvo de uma série de restrições legais, pois as variadas crises pelas quais passou o mundo levaram os governos a interpretar as migrações, por muitas vezes, como fatores de desestabilização econômica e/ou política". Por vários motivos e em momentos diversos da história as pessoas, de forma voluntária ou involuntária, foram levadas a sair de seu país de origem para buscar refúgio, melhores formas de vida e sobrevivência, e "muitas vezes a motivação explícita ou implícita era a busca pelo trabalho11".

Conforme cita Saladini12, em razão de aspectos históricos a questão da imigração pode ser tratada em quatro momentos diferentes, apesar de existirem outros; o primeiro "aquele pontuado pelas grandes descobertas e pela necessidade de povoamento do Novo Mundo"; em segundo "os anos anteriores e posteriores às duas Grandes Guerras"; em terceiro "as massas migratórias encaminhadas ao Brasil"; e, em quarto "o contexto moderno da migração para o trabalho sob a perspectiva da globalização econômica".

A migração em razão das grandes descobertas se deu "a partir de fins do século XV13", com o descobrimento "de novos continentes, como América e Austrália", e que possibilitou "a ocorrência da maior migração em massa registrada na história: nos cem anos que se seguiram a 1815, mais de noventa milhões de pessoas migraram de e para diversos países, principalmente saindo da Europa14".

A Austrália e as Américas eram verdadeiros polos para imigração, primeiro em razão das grandes áreas despovoadas e em segundo pela necessidade de colonização e desenvolvimento econômico, tanto é que para esse fim eram cedidas terras aos imigrantes15.

Portanto, "emigrar era um projeto de vida, não uma aventura. O emigrante buscava dar um significado concreto à sua existência, reunindo suas economias, desfazendo-se de suas propriedades, abandonado o lar e a terra de seus ancestrais para investir num novo desafio em um país longínquo e desconhecido, amparado principalmente por uma esperança baseada na sua capacidade empreendedora, na sua autoconfiança e determinação para atingir o seu objetivo16".

Ocorre que "as guerras sempre foram motivo de êxodo humano, fosse para fugir do conflito enquanto travado, fosse para buscar novos horizontes após o fim do embate17", e as duas Grandes Guerras foram sem sombra de dúvidas grandes motivadores de emigração em razão da necessidade principal de procurar refúgio, tanto é que nesses "conflitos mundiais: dez milhões de pessoas morreram lutando na Primeira Guerra, e mais dez milhões de civis faleceram direta ou indiretamen-te em razão desse conflito; na Segunda Guerra, foram 50 milhões de mortos, menos da metade deles solda-dos18"; e é de se observar que "desde 1945 até fins do século XX, já se somavam mais outros 50 milhões de vidas perdidas em outros embates, sendo que apenas os conflitos na Bósnia e em Ruanda somaram um milhão de vítimas19".

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Com relação à migração forçada, esclarece Sala-dini20 que "entre as duas grandes guerras existiu uma diminuição nos fluxos migratórios, porque diversos países que eram receptores tradicionais estabeleceram políticas restritivas de...

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