O prêmio: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa

AutorMônica Sette Lopes
Páginas237-243
O PRÊMIO: UMA COISA É UMA COISA, OUTRA COISA É OUTRA COISA237
O PRÊMIO: UMA COISA É UMA COISA, OUTRA COISA É OUTRA COISA
Mônica Sette Lopes(*)
(*) Professora associada da Faculdade de Direito da UFMG. Desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Doutora em
Filosofi a do Direito.
(1) Vale a pena comparar a redação anterior: “§ 2º Não se incluem nos salários as ajudas de custo, assim como as diárias para viagem que não excedam
de 50% (cinquenta por cento) do salário percebido pelo empregado”.
Curto-circuitando (Court-circuitant) as formas, a de-
mora e os procedimentos, a urgência, sob a autoridade
do estado de necessidade (necessidade que faz a lei), se
erige assim em passe-droit (salvo conduto) generalizado.
Disso resulta um novo tipo de risco, a insegurança jurí-
dica: não mais a insegurança econômico-social (perigo
externo), mas o risco endógeno, produto secundário e
indesejado da engenharia jurídica cujo ritmo se acelera
(OST, 1999, p. 282).
1. UMA QUESTÃO NO MEIO DAS PALAVRAS
Na primeira leitura do que veio a se transformar na
Lei n. 13.467, de 13.7.2017, o tema que mais me cha-
mou atenção se expunha em pinceladas quase invisíveis,
mas concatenadas, no curso de várias passagens. Ele não
tinha a grandiosidade da discussão sobre os efeitos da
negociação coletiva, nem atraía o olhar do intérprete
como o tópico sobre o dano extrapatrimonial ou a au-
sência de limitação de jornada para o teletrabalho. Tra-
ta-se da defi nição da natureza jurídica do prêmio.
Passados alguns meses da entrada em vigor da Lei
n. 13.467/2017, persiste a angústia com o sentido que
se dará à regra e com seus efeitos.
A impressão que se tem, da leitura dos dispositivos,
no que se anuncia como sua nova versão, é a deliberada
intenção de defi nir a natureza genérica do prêmio como
sendo indenizatória em qualquer circunstância.
Mas essa é, como se demonstrará, uma impossibili-
dade concreta, à vista da natureza retributiva ou contra-
prestativa de alguns pagamentos que se apresentam com
aquela denominação.
Assim, corre-se o sério risco de uma frustração plena
à promessa de estabilidade ou de segurança jurídica que
se anuncia, caso as empresas decidam optar por reco-
nhecer caráter indenizatório a determinadas situações,
em que a remuneração venha a ser paga pela rubrica
prêmio. Uma interpretação literal e descontextualizada
dos dispositivos confi gurará uma instabilidade de pro-
porções signifi cativas para os empregadores, mesmo que
eles aumentem os parâmetros para o pagamento de ver-
ba variável denominada prêmio na certeza, equívoca, de
que não haverá desdobramentos em contribuição previ-
denciária e em outras verbas trabalhistas.
O risco aqui não é o da perda do direito do empre-
gado. Mas o de se levar o empregador, pelo apressado
de uma promessa que não vinculará o tempo, à inse-
gurança a que se referiu François Ost no texto trazido
como pórtico deste trabalho. A engenharia jurídica que,
na composição da Lei n. 13.467/17, pretendeu levar a
certezas, pode romper facilmente com as expectativas na
situação que se examina.
Esse é o risco que justifi ca o pequeno estudo que ora
se apresenta.
2. A NOVA VERSÃO DO PRÊMIO
A Lei n. 13.467, de 13.7.2017, apresenta a fi gura do
prêmio em alguns dispositivos.
O primeiro deles é o próprio art. 457, matriz da con-
cepção que se quer ver difundida:
Art. 457. Compreendem-se na remuneração do empregado,
para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago di-
retamente pelo empregador, como contraprestação do serviço,
as gorjetas que receber.
§ 1º Integram o salário a importância fi xa estipulada, as gratifi -
cações legais e as comissões pagas pelo empregador.
§ 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de aju-
da de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em di-
nheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a
remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de
trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo
trabalhista e previdenciário.(1)
[...]
§ 4º Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo
empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a
empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho
superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas ativida-
des. (Grifos nossos em itálico nas partes que importam modi-
cação pela Lei n. 13.467/2017).
O § 2º insere o prêmio juntamente com verbas cuja
natureza indenizatória é fl agrante, até porque ou cons-

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT