A língua natural dos povos indígenas e o direito constitucional à diferença na propaganda eleitoral

AutorAparecida Luzia Alzira Zuin e Marcelo Xavier da Silva
Páginas69-105
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A LÍNGUA NATURAL DOS POVOS INDÍGENAS E O
DIREITO CONSTITUCIONAL À DIFERENÇA NA
PROPAGANDA ELEITORAL
Aparecida Luzia Alzira Zuin 1
Marcelo Xavier da Silva2
Resumo: O objeto deste artigo é apresentar a língua natural dos povos
indígenas a fim de dar visibilidade e democratizar candidaturas a partir do
seu uso, na propaganda eleitoral. Com isso, proporciona-se maior
pluralidade ao processo eleitoral e, consequentemente, promove-se o
fortalecimento da democracia, considerada a efetivação do direito
constitucional à diferença. A pesquisa avaliou a legislação eleitoral em
vigência, propondo alterações e/ou medidas que possam estimular a
ampliação da participação política dos indígenas a partir de suas línguas
naturais na propaganda eleitoral. Para tanto, apresenta os principais
conceitos, proposituras de alterações e sugestões de atualização da
linguagem da propaganda eleitoral junto ao Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) durante os trabalhos de Sistematização das Normas Eleitorais (SNE,
Eixo III, da Propaganda Eleitoral e Temas Correlatos (2021-2022); traça
um quadro conceitual sobre a propaganda eleitoral e o direito às
visibilidades para todas as candidaturas. A abordagem metodológica
empregada na pesquisa é qualitativa; descritiva e exploratória; com os
procedimentos bibliográfico e documental.
1 Docente dos Programas de Pós-Graduação Mestrado Profissional Interdisciplinar em Direitos
Humanos e Desenvolvimento da Justiça (DHJUS) e Mestrado Acadêmico em Educação (PPGE),
e do curso de Direito, da Universidade Federal de Rondônia (UNIR). Doutora e Mestra em
Comunicação e Semiótica, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP). Pós -
doutorado em Estudos Culturais (Programa Avançado de Cultura Contemporânea
(PACC/UFRJ), com estágio na Università del Salento (Lecce-Itália) em Filosofia d o Direito; e
Pós-doutorado em Direito, linha de Políticas Públicas Urbanas pela Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: profalazuin@unir.br
2 Docente do Departamento de Ciências Jurídicas (DCJ), da Universidade Federal de Rondônia
(UNIR). Ministra as disciplinas Direito Administrativo e Direito Eleitoral. Mestre pelo Programa
de Pós-Graduação Mestrado Profissional Interdisciplinar em Direitos Humanos e
Desenvolvimento da Justiça (DHJUS). Doutorando em Direito da Cidade pela Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ). E-mail: marcelo.xavier@unir.br
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Palavras-chave: 1. Propaganda Eleitoral. 2. Língua Natural. 4. Indígenas.
5. Normas Eleitorais.
Introdução
O objetivo deste trabalho é trazer para o debate da propaganda
eleitoral a necessidade de visibilizar e democratizar todas as candidaturas,
a partir das linguagens adotadas e da sua respectiva publicização. É fato
que o sistema eleitoral precisa repensar o alcance de toda população às
informações de quem se candidata, de forma que, efetivamente, possa-se
efetivar uma democracia representativa. Isso abarca todos os grupos
minoritários nos cargos públicos de poder, desde a participação de
mulheres, pessoas trans, negras, povos originários, pessoas com
deficiência.
Para esse debate tão relevante propomos este artigo que se
constitui dividido nas seguintes partes: inicialmente, nos detemos nos
conceitos gerais de propaganda eleitoral, depois relacionamos a
conceituação com teorias da linguagem, para, por fim, propor as sugestões
de inclusão das línguas naturais indígenas como forma de democratização
nas campanhas eleitorais.
Com a particularidade do conceito de língua natural, na
perspectiva da Semiótica Discursiva (francesa ou greimasiana), esta teoria
serve como instrumento procedimental analítico ao estabelecimento da
relação com o campo da comunicação, e para análise da propaganda
eleitoral, é a semiótica da escola francesa, também conhecida como
discursiva ou greimasiana, que se ocupa dos mecanismos de produção dos
efeitos de sentido dos textos e, mais recentemente, das práticas e das
situações humanas. Nessa direção, a Semiótica tem se apresentado como
um instrumento teórico, ou ainda, como uma disciplina sistemática de
método operacional de análise, servindo para a conceituação que se propôs
no presente trabalho de conceituar língua natural indígena. Logo, a
principal contribuição da semiótica discursiva é de natureza metodológica
(ZUIN, 2015), pois, enquanto ferramenta analítica para os estudos da
língua, linguagem e cultura, a análise semiótica do discurso, é bastante
inovadora e pertinente para os estudos.
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Foi o que ocorreu, seguindo a orientação realizada durante o
período de proposituras de atualização da legislação eleitoral, no caso,
além de definir o que é língua natural, apresentou a língua indígena como
conceito sociossemiótico, e como ela se caracteriza na natureza humana
indígena; afinal, embora transcendendo os indivíduos que a utilizam,
apresenta-se como organização estrutural imanente, cumprindo a função
social na luta dos povos indígenas para sua manutenção viva. Almejou,
também, discorrer sobre os modos como os indígenas, por meio das suas
línguas naturais (materna; com função social própria da natureza humana
deste grupo específico), que se distinguem da língua portuguesa (porque
constituída de elementos semióticos distintos daquela), - de sujeitos-
eleitores, passem a conferir seu papel como atores sociais no processo
eleitoral.
Por esse motivo, propôs à Sistematização de Normas Eleitorais
(SNE) a condução para que as línguas naturais dos povos nativos sejam
estimuladas na propaganda eleitoral quando um(a) candidato(a) indígena
estiver concorrendo ao pleito e quando a propaganda eleitoral, nos demais
casos, for dirigida às comunidades indígenas. A defesa desse modelo
expressaria melhor o vínculo político e democrático, tendo em vista que,
como os eleitores são atores do processo eleitoral e, ainda, podem ser
considerados como atores sociais, por pertencerem a um grupo vulnerável.
Além do mais, sendo a propaganda eleitoral um direito do(a)
eleitor(a), e não apenas do(a) candidato(a), esta deve considerar as
tradições e organização social daqueles(as) eleitores(as) inseridos(as) em
grupos vulneráveis cuja diferença é reconhecida e protegida
constitucionalmente. Assim, chama a atenção para que a condição de
sujeito-eleitor(a) também seja a confirmação do sufrágio que é um direito
público subjetivo, ou seja, um direito próprio da condição de cidadão(ã),
que inclui tanto o poder de escolha dos seus representantes, quanto à
possibilidade de concorrer aos cargos públicos eletivos. Mais, em um
regime democrático representativo, por meio do qual o povo elege seus
representantes, dando-lhes poderes para que atuem em seu nome, o sujeito-
eleitor(a) merece ser visto(a) para além do voto.
Justifica-se a propositura considerando que os indígenas se
constituem como grupos vulneráveis no processo eleitoral, compreendido
o processo eleitoral - como o período que se inicia com convenção e se
encerra com a diplomação dos(as) eleitos(as), incluindo, nele, a campanha

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