O direito brasileiro possui instrumentos eficazes para o planejamento sucessório?

AutorDaniele Chaves Teixeira e Danielle Tavares Peçanha
Páginas213-235
O DIREITO BRASILEIRO POSSUI INSTRUMENTOS
EFICAZES PARA O PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO?
Daniele Chaves Teixeira
Doutora e Mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Pesquisadora bolsista no Max Planck Institut für Ausländisches und Internationales
Privatrecht, na Alemanha. Especialista em Direito Civil pela Università degli Studi
di Camerino, na Itália. Especialista em Direito Privado pela Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro. Professora de cursos de Pós-Graduação em Direito Civil.
Danielle Tavares Peçanha
Mestranda em Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro (UERJ). Advogada.
Sumário: 1. Introdução – 2. Crise do direito das sucessões e planejamento sucessório como resposta
à insuciência normativa – 3. Determinação de instrumentos viáveis de planejamento sucessório;
3.1 Instrumentos de planejamento causa mortis; 3.2 Instrumentos de planejamento inter vivos – 4.
Notas conclusivas – 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O Direito das Sucessões evidencia-se em constrangedora incompatibilidade
com os avanços e conquistas sociais, com regras em manifesto descompasso com
a sociedade contemporânea, ancorando-se em normas obsoletas e desatualizadas.
Nesse cenário, ganha especial destaque a temática do planejamento sucessório, com
as ferramentas disponíveis no ordenamento que permitem funcionalizar tal direito
com base nos princípios constitucionais da autonomia privada e da solidariedade
familiar. Propugna-se, pois, pela verdadeira arquitetura da sucessão patrimonial,1
garantida em termos de planejamento sucessório, capaz de atender às demandas
atuais da sociedade e da família brasileiras.
Daqui a importância do esmiuçado exame das ferramentas de planejamento su-
cessório disponíveis no ordenamento jurídico brasileiro e de seus principais contornos
jurídicos, a serem utilizadas com o propósito de afastar reversões de expectativas
vãs e conf‌litos familiares desnecessários, além de proporcionar ef‌iciência e redução
de custos às partes, com a consequente af‌irmação dos princípios da igualdade e da
solidariedade na legalidade constitucional.
1. Para o aprofundamento do tema, cfr. TEIXEIRA, Daniele Chaves (coord.). Arquitetura do planejamento
sucessório, tomo II, Belo Horizonte: Fórum, 2021.
DANIELE CHAVES TEIXEIRA E DANIELLE TAVARES PEÇANHA
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Diante da imprescindibilidade da via do planejamento sucessório no atual ce-
nário brasileiro, elencam-se instrumentos que podem ser vocacionados à máxima
realização da autonomia privada e da harmonização dos interesses sobrepostos na
transmissão dos bens. Tais instrumentos podem subdividir-se, de acordo com os
modos de sua efetivação, em instrumentos tradicionais de transmissão mortis causa,
dentre os quais o testamento apresenta papel de destaque, embora não seja o único
remédio à disposição no sistema, ou negócios inter vivos, bipartidos em negócios
com efeitos post mortem e com ef‌icácia imediata. Em uma ou em outra vias, verdade é
que o direito brasileiro possui instrumentos ef‌icazes para concretizar o planejamento
patrimonial e sucessório, cada qual com suas peculiaridades, a serem direcionadas à
ef‌icaz consagração dos objetivos daquele que planeja a sucessão de seus bens, como
se pretende demonstrar ao longo do trabalho.
Não há mais o que postergar:2 o planejamento patrimonial e sucessório é realida-
de inarredável e imprescindível ao contexto das sociedades contemporâneas, e deve
ser funcionalizado à promoção dos valores constitucionais superiores Constituição
da República. Assim, o delicado xadrez que envolve a escolha de instrumentos e
institutos a utilizar, separadamente ou em conjunto, dentre todos os disponíveis no
ordenamento pátrio, requer uma forte interação entre os envolvidos e o prof‌issional,
de forma que o planejamento não se transforme em algo dissociado das intenções
de quem o procura e dissociado da realidade jurídica patrimonial do interessado.3
Daí a imprescindibilidade de que a comunidade jurídica se dedique com cada vez
mais af‌inco ao estudo da matéria, sempre à luz da complexidade própria do ordena-
mento jurídico constitucionalizado, e é precisamente neste caminho que o presente
trabalho se situa.
2. CRISE DO DIREITO DAS SUCESSÕES E PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO
COMO RESPOSTA À INSUFICIÊNCIA NORMATIVA
Como se sabe, o Direito das Sucessões volta-se à análise de questão muito delica-
da, da qual normalmente as pessoas buscam se esquivar, que é, exatamente, encarar
a f‌initude humana: a própria morte. Como a morte é fato inexorável, abordar esse
tema tabu requer esforço que demanda atitude de compreensão íntima e de obser-
vação externa. A única certeza que se pode ter na vida é a de que todo ser humano
morrerá; e tal certeza vem acompanhada de uma incerteza, que é a de se precisar o
momento exato do f‌im.4
2. MUCILO, Daniela de Carvalho; TEIXEIRA, Daniele Chaves. Covid-19 e planejamento sucessório: não há
mais momento para postergar. In: NEVARES, Ana Luiza Maia; XAVIER, Marília Pedroso; MARZAGÃO,
Silvia Felipe (coord.). Coronavírus: impactos no Direito de Família e Sucessões, Indaiatuba: Editora Foco,
2020, p. 333-350.
3. BUCAR, Daniel; TEIXEIRA, Daniele Chaves. As armadilhas do planejamento sucessório. Consultor Jurídico
– CONJUR, publicado em 17.7.2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jul-17/bucar-tei-
xeira-armadilhas-planejamento-sucessorio. Acesso em: 14. jun. 2021.
4. Permita-se remeter a TEIXEIRA, Daniele Chaves. Noções prévias do direito das sucessões: sociedade, fun-
cionalização e planejamento sucessório. In: TEIXEIRA, Daniele Chaves (coord.). Arquitetura do planejamento

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