A importância do direito comparado no estudo do direito das sucessõeS

AutorGustavo Henrique Baptista Andrade e Marcos Ehrhardt Junior
Páginas459-479
A IMPORTÂNCIA DO DIREITO COMPARADO
NO ESTUDO DO DIREITO DAS SUCESSÕES
Gustavo Henrique Baptista Andrade
Pós-doutorado em Direito Civil pela UERJ. Mestre e Doutor em Direito Civil pela UFPE.
Vice-Presidente do IBDFAM-PE. Membro do Grupo de Pesquisa Constitucionalização das
Relações Privadas (CONREP) UFPE-CNPq. Procurador do Município do Recife. Advogado.
Marcos Ehrhardt Junior
Doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Professor de
Direito Civil da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e do Centro Universitário
Cesmac. Editor da Revista Fórum de Direito Civil (RFDC). Vice-Presidente do Instituto
Brasileiro de Direito Civil (IBDCIVIL). Presidente da Comissão de Enunciados do Instituto
Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM). Membro Fundador do Instituto Brasileiro de
Direito Contratual – IBDCont e do Instituto Brasileiro de Estudos de Responsabilidade
Civil (IBERC). Advogado. E-mail: contato@marcosehrhardt.com.br.
Sumário: 1. Introdução – 2. A metodologia do trabalho cientíco; 2.1 A contribuição do Direito Civil
Constitucional; 2.2 O direito comparado – 3. Estado da arte do direito das sucessões no Brasil – 4.
O que, como e por que mudar? – 5. À guisa de conclusão: a importância do direito comparado no
estudo do direito das sucessões – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Antes mesmo de serem apresentados conceitos primários ou enquadrar o direito
comparado em alguma categoria específ‌ica, faz-se necessário advertir que ele é uma
ferramenta de grande utilidade para a pesquisa científ‌ica, para o intérprete e para o
aplicador do direito. Para além de simples referências ao direito estrangeiro, o direito
comparado é uma escolha metodológica que exige grande esforço do pesquisador e
auxilia sobremaneira não somente no aprofundamento e esclarecimento acerca de
algum instituto jurídico para melhor conhecê-lo e igualmente compreendê-lo na
ambiência do seu próprio ordenamento jurídico, mas também na solução de casos
práticos, seja onde existe lacuna da lei, seja onde haja necessidade de uma alteração
legislativa que possa aperfeiçoar dito instituto e adequá-lo à realidade social. Neste
último caso, serve ao reforço argumentativo em eventual processo legislativo.
É imperioso destacar a pouca produção científ‌ica sobre o direito comparado, em
especial na doutrina brasileira. Não obstante tenha sido uma das primeiras disciplinas
oferecidas na Faculdade de Direito do Recife já em 1892,1 não foi mantida a tradição
na mesma Escola nem nos currículos de outras instituições de ensino.
1. A Cadeira era a de Legislação Comparada, sendo professor Clóvis Beviláqua. SILVA, José Afonso da. Um
pouco de Direito Constitucional comparado. Três projetos de constituição. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 19.
GUSTAVO HENRIQUE BAPTISTA ANDRADE E MARCOS EHRHARDT JUNIOR
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Entre os componentes da pesquisa em direito comparado, um se destaca pela
sua importância na própria construção do direito, que é o dado histórico. Na ver-
dade, nem sempre a pesquisa se dá em tempos históricos diversos, mas os fatores
vivenciados em certo momento contribuem sobremaneira para a compreensão de
dado sistema jurídico ou mesmo, mais particularmente, de determinado instituto.
Essa vertente é valorizada pela Faculdade de Direito da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro – UERJ, que trabalha a contingencialidade como fator de compreensão
do direito comparado, no Grupo de Pesquisa Historicidade e Relatividade do Direito
Civil, liderado pelo Prof. Carlos Nelson Konder.
O estudo e o aprofundamento da pesquisa em direito comparado são de gran-
de importância sob os mais diversos aspectos, destacando-se, como af‌irmado, a
compreensão de determinada categoria, instituto ou mesmo dispositivo legal de
certo ordenamento jurídico ante outro sistema, com vistas à igual compreensão do
mesmo ponto no próprio sistema do pesquisador ou ao seu aperfeiçoamento, à sua
transformação através de eventual alteração legislativa.
O direito das sucessões tem estreita interlocução com o direito de família e
outras situações jurídicas existenciais, mas também com o direito patrimonial em
geral e o direito de propriedade em especial. Dita interlocução, quando operada sob
o prisma das normas constitucionais – e essa é uma das etapas da pesquisa em direito
comparado – facilita demasiadamente a identif‌icação de assintonias entre dispositivos
de normas hierarquicamente diferenciadas ou, em contrapartida, a constatação de
harmonia entre essas normas.
Nesse ponto, vale destacar a utilização da metodologia civil constitucional2
também na pesquisa em direito comparado. Os dois métodos não se excluem, com-
plementam-se, dada a necessidade de extrair do sistema o item a comparar, transpor-
tando-o à Constituição, de onde será construída a ponte para a efetiva comparação.
Tendo em vista as grandes transformações sociais ocorridas nos últimos cem
anos, muitas delas consequência direta de rupturas institucionais trazidas pelo
reposicionamento de vários atores sociais, a exemplo da mulher casada (Lei nº
4.121/1962 – Estatuto da Mulher Casada), da criança e do adolescente (Lei nº
– Estatuto do Idoso) e da pessoa com def‌iciência (Lei nº 13.146/2015 – Estatuto da
Pessoa com Def‌iciência ou Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Def‌iciência),
entre outros, mas principalmente pela nova ordem constitucional estabelecida em
1988, muito se evoluiu na busca da concretização do projeto de Estado desenhado
pelo legislador constituinte.
2. Acerca da metodologia civil constitucional, ver por todos as obras de Paulo Luiz Netto Lôbo, Gustavo
Tepedino, Luiz Edson Fachin e Maria Celina Bodin de Moraes. Na literatura estrangeira, os italianos Pietro
Perlingieri e Stefano Rodotà.

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