Dever de cuidado e responsabilidade civil das instituições financeiras nas operações em ambiente digital
Autor | Flaviana Rampazzo Soares |
Ocupação do Autor | Mestre e Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS). Especialista em Direito Processual Civil. Advogada e Professora |
Páginas | 405-421 |
DEVER DE CUIDADO E RESPONSABILIDADE
CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS
OPERAÇÕES EM AMBIENTE DIGITAL
Flaviana Rampazzo Soares
Mestre e Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul (PUC/RS). Especialista em Direito Processual Civil. Advogada e Professora.
Sumário: 1. Introdução – 2. Breves notas quanto à evolução tecnológica no setor bancário – 3. Apon-
tamentos quanto aos principais problemas vivenciados pelos clientes que usam serviços bancários
no ambiente não presencial – 4. A hipervulnerabilidade do cliente no ambiente não presencial e
o dever de cuidado dos bancos – 5. A responsabilidade dos bancos nas operações on-line – 6. O
desao da prova e do nexo causal – 7. Conclusão – 8. Referências bibliográcas.
1. INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo avaliar a incidência do dever de cuidado, apli-
cado à atividade bancária executada on-line quanto aos serviços ofertados aos seus
clientes, a qual vem se acentuando porque estes estão sendo levados a utilizar os
serviços digitais, a ensejar a ampliação da exposição a riscos de perdas financeiras
decorrentes de acessos irregulares, fraudes e operações irregulares.1
Em razão disso, foram traçados os seguintes problemas de pesquisa: (a) veri-
ficar quais são os principais desafios enfrentados pelos consumidores de serviços
bancários no ambiente digital, com ênfase nas práticas ilícitas com o objetivo de
subtrair indevidamente os recursos dos clientes; (b) verificar quando e sob quais
circunstâncias os bancos devem ser responsabilizados por operações irregulares
perpetradas, que geram prejuízos aos clientes; e (c) examinar a incidência do dever
de cuidado na atividade bancária executada não presencialmente, tanto do cliente,
quanto dos bancos.
A premissa básica utilizada neste texto é o teor da Súmula n. 297 do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), de 2004, segundo a qual “o Código de Defesa do Consu-
midor é aplicável às instituições financeiras”.
Adicionalmente, será verificado o sentido e alcance da Súmula n. 479 do STJ,
de 2012, a qual preceitua que instituições financeiras “respondem objetivamente
1. Por esse motivo, parte do pensamento exposto e do conteúdo desenvolvido neste trabalho tem origem no
seguinte trabalho prévio publicado pela Autora: SOARES, Flaviana Rampazzo. O dever de cuidado e a res-
ponsabilidade por defeitos. Revista de Direito Civil Contemporâneo, São Paulo. Editora Revista dos Tribunais.
v. 13, p. 139-170, 2017.
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FLAVIANA RAMPAZZO SOARES
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pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por
terceiros no âmbito de operações bancárias”.
Por isso, será utilizado basicamente o sistema de responsabilidade previsto no
referido Código (CDC).
Este texto abordará apenas a responsabilidade por fraudes em contas bancárias,
não sendo ampliado o objeto para instituições financeiras em geral.
Como metodologia de pesquisa, este texto utiliza como método de abordagem
o dedutivo, assim como o dialético, de natureza aplicada e, na técnica de pesquisa,
enfatiza-se a coleta doutrinária com abordagem qualitativa. O método de procedi-
mento é o documental.
Explicitados os pontos iniciais quanto aos contornos deste texto, passa-se a
uma breve explanação quanto ao desenvolvimento da tecnologia no setor bancário.
2. BREVES NOTAS QUANTO À EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA NO SETOR
BANCÁRIO
Os estudos quanto aos usos e os impactos da inteligência artificial no Direito
são recentes, e apresentam desafios aos quais cabem aos juristas proporem soluções.
Diversos setores estão migrando as suas atividades, total ou parcialmente, do
mundo “concreto” ou físico para o mundo on-line. Trata-se de um fenômeno ex-
ponencial, tanto geográfica quanto numericamente, e, assim, atividades que eram
realizadas pessoalmente por seres humanos, passaram a ser executadas por robôs ou,
ainda que por pessoas, a execução passou a ser feita por meios eletrônicos e remotos.
Um dos setores que está ampliando exponencialmente o uso da tecnologia nas
suas atividades é o bancário. No Brasil, até meados dos anos 1980, o indivíduo que
quisesse fazer uma transferência bancária para outro, deveria se dirigir pessoalmente
a uma agência do banco no qual mantinha a sua conta, ao balcão de informações,
receber uma senha de atendimento, aguardar em uma fila ou sentado em cadeiras
dispostas em espaço específico da agência, e, quando fosse chamado pelo funcioná-
rio do caixa, passar os dados da conta para operar a transferência e apresentar o seu
cartão do banco e documento de identidade, assinando documentos comprobatórios
da operação.
Os clientes costumavam conhecer por nome tanto os funcionários das agências,
quanto os gerentes de conta, que normalmente atuavam por anos a fio em uma fun-
ção, na mesma cidade. Geralmente eram poucas agências e as pessoas conheciam as
instituições financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.
A progressão em matéria de atendimento por máquinas ocorreu ao longo dos
anos, tendo alguns saltos, como na época da implementação dos caixas eletrônicos
automáticos (Automatic Teller Machine – ATM), terminais bancários que se dissemina-
ram a partir da segunda metade da década de 1980, os quais possibilitavam ao cliente
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