Impossibilidade da cobrança de taxa pelo uso do solo

AutorFábio Amorim da Rocha
Ocupação do AutorPresidente da Comissão de Energia do Conselho Federal da OAB
Páginas526-564
526 Temas RelevanTes no DiReiTo De eneRgia eléTRica
1 INTRODUÇÃO
Após as privatizações ocorridas com as concessionárias de distri-
buição de energia elétrica na segunda metade dos anos 1990,
inúmeros municípios brasileiros que não pagavam pela energia que
recebiam e que se encontravam inadimplentes por dezenas e até
centenas de meses com as empresas supracitadas instituíram taxas
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O objetivo era, e é, inventar um “crédito” que possa abater ou
fazer frente ao histórico de inadimplemento desses municípios.
Ocorre que as concessionárias prestam serviço de distribuição
de energia elétrica para milhões de municípios brasileiros. E para
prestar esse serviço, necessário se faz a implantação de linhas de
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nos territórios dos municípios que integram suas áreas de concessão.
Por força do (i) art. 151, do Decreto nº 24.643, de 1934 (Código
de Águas); (ii) do art. 108, alínea “a”, do Decreto Federal nº 41.019 de
1957 (Regulamento dos Serviços de Energia Elétrica); (iii) do Decreto
Federal nº 84.398, de 16 de janeiro de 1980 (alterado pelo Decreto nº
86.859, de 10 de janeiro de 1982); e (iv) da Cláusula Sexta do Contrato
de Concessão das distribuidoras, estas são detentoras de servidão
legal sobre estradas, caminhos, vias públicas, faixas de rodovias e de
terrenos de domínio público, podendo ocupá-los, sem ônus, no desen-
volvimento de suas atividades.
Entretanto, apesar da legislação federal supracitada permitir que
as concessionárias desenvolvam suas atividades sem ônus de qual-
quer espécie, diversos municípios estão, como acima mencionado,
a exigir que as concessionárias recolham aos seus cofres municipais
milhões de reais referentes à cobrança destas malsinadas taxas.
Uma rápida leitura nessas legislações municipais mostrará que
a natureza jurídica da exação em causa é a de taxa que, não custa
lembrar, trata-se de espécie do gênero tributo, exigindo, como pres-
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tributária instituída.
Sendo certo que o fato gerador da taxa resulta sempre do exer-
cício regular do poder de polícia ou da utilização, pelo contribuinte,
dos serviços públicos postos à sua disposição (art. 145, II da C.F. e
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impossibiliDaDe Da cobRança De Taxa pelo Uso Do solo 527
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demonstrado neste artigo, qualquer tipo de serviço prestado pelos
municípios, nem tampouco caracterizado o exercício do poder de
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denominação de taxa.
As concessionárias são proprietárias de milhares de postes (que
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buída nesses municípios) e a utilização destes é essencial para o
desenvolvimento de sua atividade, qual seja, a prestação de serviços
de distribuição de energia elétrica.
Os municípios não exercem nenhum controle quando da insta-
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imprescindível para os clientes receberem o serviço de energia elétrica
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ao solo não tem relação com a estética urbana e à segurança pública,
ou seja, os municípios não exercem nenhum controle na instalação/

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A cobrança estaria sendo feita pela simples permanência dos postes nas
vias públicas? E qual seria o poder de polícia exercido no presente caso?
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pelas distribuidoras são bens de uso comum do povo e não bens
pertencentes ao acervo municipal. Além disso, a competência consti-
tucional em matéria de energia elétrica é da União e, qualquer violação
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peito ao princípio federativo, pois o interesse público nacional predo-
mina sobre o municipal.
2 INCONSTITUCIONALIDADE DA TAXA – EXERCÍCIO
ILEGAL DO PODER DE POLÍCIA PELO MUNICÍPIO
A matriz legal das taxas municipais instituídas deixa claro que se
trata de taxa instituída em razão de um suposto “exercício regular do
poder de polícia” (art. 77 do Código Tributário Nacional CTN) pelos
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“utilização efetiva ou potencial de serviço público” (art. 77 do CTN)
posto à disposição das concessionárias.
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Se estamos diante de uma “taxa de poder de polícia”, então tal
exação é ilegal, posto que o exercício do poder de polícia pelos muni-
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ilegal e inconstitucional pois, como leciona Hely Lopes Meirelles,
1
tem
competência para instituir taxa quem tem competência, nos moldes
da Constituição Federal, para prestar o serviço ou exercer o poder
de polícia. Ou seja, não há dúvida de que os municípios brasileiros
não possuem a correspondente competência administrativa para
exercer poder de polícia sobre as atividades das concessionárias a
ensejar a competência tributária de lançar taxa de poder de polícia.
A Constituição Federal vigente, a exemplo das anteriores, inclui
na competência da União “explorar, diretamente ou mediante auto-
rização, concessão ou permissão, os serviços e instalações de energia
elétrica.
2, 3
(art. 21, XII, letra “b”) reservando-lhe competência priva-
tiva para legislar sobre “água e energia” (art. 22, IV).
Ademais, a mesma Constituição Federal em seu art. 175 deter-
mina que “incumbe ao Poder Público, na forma da Lei, diretamente
ou sob regime de concessão ou permissão, ..., a prestação de serviços
públicos” e no parágrafo único do mesmo artigo ordena que “a Lei
disporá sobre: I – O regime das empresas concessionárias e permis-
sionária de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de

e rescisão da concessão ou permissão. (grifamos)
Visando dar cumprimento ao disposto no supratranscrito art. 175,
foi sancionada em 26 de dezembro de 1996 a Lei nº 9.427, que instituiu
1 MEIRELLES, H. L. Direito Municipal Brasileiro, 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996.
2 O termo “instalação” compreende, segundo Darcilio Augusto Gomes. In: Para
conhecer o setor elétrico brasileiro – Glossário Técnico-jurídico, Ed. Fundação COGE,
-
lhos, linhas e acessórios que servem para a produção, conversão, transformação,
transporte, distribuição e utilização de energia elétrica.
3    Dicionário de Terminologia Energética editado pelo
Conselho Mundial de Energia – Comitê Brasileiro (ed. Associação Portuguesa de
Energia (APE), 3ª ed., 2001, p. 144, verbete 12.2.1), para o qual “instalação elétrica”

linhas e acessórios que servem para a produção, conversão, transmissão, trans-
porte, distribuição e utilização de energia elétrica. Esta expressão aplica-se igual-
mente a um único conjunto de máquinas, de material ou de circuitos elétricos.
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