E não sou eu uma mulher? Um grito de mulheres-trans e travestis para a lei do feminicídio

AutorWilson Guilherme Dias Pereira, Fábio Roberto de Oliveira Santos e Fernanda do Nascimento Thomaz
Ocupação do AutorGraduado em Direito. Aprovado no XXXI Exame da Ordem dos Advogados do Brasil/Orientador, Mestre em Ciências Jurídicas pela Univali-SC/Coorientadora, Doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense
Páginas767-792
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E NÃO SOU EU UMA MULHER?
UM GRITO DE MULHERES-TRANS E TRAVESTIS PARA A LEI
DO FEMINICÍDIO
Wilson Guilherme Dias Pereira1
Fábio Roberto de Oliveira Santos2
Ferna nda do Nascimento Thomaz3
Resumo: As violências baseadas em gênero encontram-se solidificadas na
sociedade atual, construída sobre estruturas patriarcais que consolidam
desigualdades entre as categorias de homem e mulher. A necessidade de
manutenção do status misógino incentiva as violências que por vezes se
agravam a ponto de tirar a vida de várias mulheres, a fim de enfrentar os
dados alarmantes do Brasil surge a Lei nº 13.104, de 09 de março de 2015,
vulgo “Lei do Feminicídio”, mesmo com o advento jurídico desta lei.
Existe ainda uma grande necessidade de análise e estudo da lei supracitado,
uma vez que a mesma vem sendo interpretada sobre a perspectiva de “ser
mulher” como algo biológico. Portanto, o presente artigo tem a pretensão
de estudar os conceitos de gênero, sexo, das identidades de gênero e o
estudo da Lei de Feminicídio, bem como sua aplicabilidade. Essa
construção científica trata de uma revisão bibliográfica, procedida por
meio de obras, artigos, pesquisas e matérias com conteúdo histórico,
antropológico, psicológico e jurídico. A legislação brasileira avançou no
1 Graduado em Direito. Aprovado no XXXI Exame da Ordem dos Advogados do Brasil.
Aprovado no Processo Seletivo do Mestrado de Direitos Humanos e Desenvolvimento da
Justiça DHJUS/UNIR Membro do Grupo de Pesquisa Audre Lorde.
E-mail: wilguidireito@gmail.com
2 Orientador, Mestre em Ciências Jurídicas pela Univali-SC, Professor Universitário,
Defensor Público, membro do Comitê Estadual de Prevenção e de Combate à Tortura e
Comentarista voluntários da Rede Amazônica. E-mail: fabiorobert@hotmail.com e canal
no youtube Direitos Humanos em conexão com você.
3 Coorientadora, Doutora em História Social pela Universidade Federal Fluminense,
Professora adjunta da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde coordena o Grupo de
pesquisa Afrikas e curso de Pós-graduação Lato Sensu em História da África - Pós Afrikas.
Atualmente participa do projeto de pesquisa internacional intitulado "Pluralismo Jurídico
no Império Português", com sede na Universidade Nova de Lisboa.
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combate às violências de gênero, todavia é necessário que tais avanços
rompam com as concepções vinculadas ao sexo biológico, uma vez que
tais agressões se fundam nas estruturações de papéis de gênero, e não
meramente em órgãos genitais, ou cromossomos. Assim o discurso “E não
sou eu uma mulher?”, de Sojourner Truth, mulher negra e ex-escrava, em
1851, demonstra-se ainda o grito de mulheres-trans e travestis ao sistema
judiciário brasileiro.
Palavras-chave: Gênero. Patriarcado. Mulheres-trans. Travestis.
Feminicídio.
1. INTRODUÇÃO
As discussões ligadas às desigualdades e violências de gênero têm
se tornado cada vez mais intensificadas no Brasil, desde que os
movimentos feministas iniciaram processos de denúncia da estruturação
sexista do país. Por esse motivo, tal fenômeno foi alvo de muitas pesquisas
e estudos, sendo objeto de diversas obras sobre óticas sociológicas,
filosóficas, psicológicas, jurídicas, entre outras.
No decorrer dos estudos foi apontado que as agressões baseadas
em gênero não são de responsabilidade unicamente do ambiente científico
ou dos movimentos sociais, mas sobretudo exige intervenção do Estado,
de modo a enfrentar a violência de várias formas (educação, emancipação,
criminalização e outros).
Com o intuito de combater e punir tais agressões surgem no
ordenamento jurídico brasileiro e internacional normas como a Lei Maria
da Penha para as violências domésticas e familiares, posteriormente a Lei
do Feminicídio.
Contudo, a Lei do Feminicídio vem sendo aplicada a partir de uma
concepção de gênero como sexo biológico e natural; essa ótica, exclui
grupos de mulheres transexuais, travestis e transgêneros, e não enfrenta o
verdadeiro motivo das violências fundadas em gênero.
Assim, o presente estudo teve como objetivo compreender a
construção sociopolítica do gênero e do sexo, bem como entender o
fenômeno social que demarca e divide indivíduos em papéis e padrões,
além de explicitar o estudo da identidade de gênero e a autoidentificação

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