Direito potestativo à renov ação do contrato de locação de imóvel para fins empresariais

AutorThiago Ferreira Cardoso Neves
Páginas385-406
24
DIREITO POTESTATIVO À RENOVAÇÃO
DO CONTRATO DE LOCAÇÃO DE IMÓVEL
PARA FINS EMPRESARIAIS
Thiago Ferreira Cardoso Neves
Doutorando e mestre em Direito Civil na Universidade do Estado do Rio de Janeiro
– UERJ. Professor de Direito Empresarial, Direito Civil e Direito do Consumidor da
Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro – EMERJ. Coordenador do Curso
de Pós-Graduação em Direito Civil da OAB-RJ/Universidade Cândido Mendes. Vice-
-Presidente Administrativo da Academia Brasileira de Direito Civil – ABDC. Visiting
Researcher no Max Planck Institute for Comparative and International Private Law
Hamburgo-ALE. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB. Advogado e
ex-sócio do escritório Sylvio Capanema de Souza Advogados Associados
Sumário: 1. Introdução. 2. O direito potestativo à renovação do contrato de locação para ns
empresariais. 2.1 O campo de incidência. 2.2 A natureza do direito à renovação do contrato de
locação empresarial e o prazo para o seu exercício. 2.3 Os requisitos para a constituição do direito
e para o seu exercício. 3. O modo de exercício do direito potestativo à renovação do contrato e a
possibilidade de se impedir a sua renovação. 3.1 A ação renovatória. 3.2 As hipóteses (taxativas?)
que conferem ao locador o direito de não renovar o vínculo. 3.3 O abuso do direito à renovação
do contrato de locação. 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A vida muitas vezes nos reserva grandes e incríveis surpresas. Para aqueles que creem,
como é o meu caso, esses acontecimentos não são obra do acaso, mas da mão de Deus. É
assim que vejo a pessoa do Prof. Sylvio Capanema em minha vida. Tive o privilégio de o
conhecer mais proximamente no já longínquo ano de 2006, no estágio oferecido pela Escola
da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro aos seus alunos. Posso dizer que foi amor à
primeira vista. A partir dali iniciou nossa trajetória prof‌issional e fraternal, que se estendeu
após o f‌im do estágio, quando continuei a acompanhá-lo na 2ª e 1ª Vice-Presidências do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no período em que ele ocupou, respecti-
vamente, as cadeiras de 2º e 1º Vice-Presidente daquela Corte. Com a sua aposentadoria,
tornamo-nos sócios no escritório que levava seu nome, tendo sido uma longa e intensa
relação de amizade e paternidade. A relação prof‌issional, contudo, teve f‌im em 2019 quando
resolvi alçar voo solo. A amizade, por óbvio, não terminou, e tínhamos inúmeros projetos
juntos, especialmente acadêmicos. Infelizmente, o inimigo invisível – o Coronavírus – in-
terrompeu precocemente os muitos planos que ainda tínhamos, e eu perdi um professor,
um mentor, um amigo e um pai. Com o tempo, a dor vai sendo substituída pela saudade,
que é suavizada pelos textos que ainda leio e que serão eternos. Devo a ele, sem o menor
constrangimento, o que sou prof‌issionalmente e muito do que sou como pessoa. O Prof.
Capanema, ou Dr. Sylvio, como assim o chamava, foi uma referência e um exemplo. Suas
THIAGo FErrEIrA CArdoSo NEvES
386
palavras de incentivo e o carinho que sempre demonstrou eu levo não apenas na mente,
mas especialmente no coração.
Por essas razões, a obra que orgulhosamente coordeno com os Professores Guilherme
Calmon Nogueira da Gama e Heloisa Helena Barboza se consubstancia em um verdadeiro
tributo a este emblemático mestre, mas, especialmente, ao especial ser humano que ele
representava, e cuja generosidade, como eu já tive a oportunidade de manifestar em outras
sedes, nos permitia brilhar sem competições ou ciúmes. Na verdade, a generosidade era
tamanha que ele nos fazia pensar e acreditar que o brilho era nosso, quando, ao contrário,
apenas ref‌letíamos o brilho dele.
O tema deste tributo, e não poderia deixar de ser, é os 30 anos da Lei do Inquilinato,
da qual ele foi um dos coautores do anteprojeto. Sua mente visionária e seus sonhos de
termos uma sociedade mais justa, livre e solidária inspiram a legislação, que balzaquiana
mostra que sua longevidade, algo incomum em nosso país, só pode decorrer da mente
iluminada daqueles que a desenvolveram.
Coube a mim tratar de um tema que nos era muito caro. No escritório, trabalhamos
em centenas de ações renovatórias de imóvel comercial, atuando tanto por locadores,
quanto por locatários. O assunto central, então, era o direito à renovação do contrato de
locação. Sua importância, jurídica e social, é inequívoca, pois permite a continuidade da
atividade econômica e a preservação da empresa. Nada obstante, seu exercício não é ili-
mitado, esbarrando em interesses outros que, quando confrontados com aqueles, devem
prevalecer, como o direito de explorar o próprio imóvel.
Inúmeras são as nuances deste direito e, portanto, relevantíssimo é o seu estudo,
razão pela qual nos debruçaremos, nas próximas linhas, sobre ele. Assim como o saudoso
professor fazia, procurarei fazê-lo da forma mais simples e objetiva possível, porque assim
se caracterizava o Professor Sylvio Capanema. O brilhantismo de suas ideias, e o conhe-
cimento oceânico que possuía, era alcançado por todos, dada a simplicidade com que
transmitia suas lições. Enf‌im, esta é uma homenagem a ele e, se assim é, outra inspiração
não pode nortear estes escritos.
2. O DIREITO POTESTATIVO À RENOVAÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO PARA
FINS EMPRESARIAIS
2.1 O campo de incidência
A Lei 8.245/1991 inicia a Seção III do seu Capítulo II sob o título Da locação não
residencial. Após tratar, em seu Capítulo I, das regras gerais aplicáveis aos contratos de
locação, o legislador passou a regular, em seu Capítulo II, as espécies de locação de imóvel
urbano. Assim, na Seção I dispõe sobre a locação residencial, voltada à moradia e resi-
dência do locatário e da sua família; na Seção II discorre sobre a locação por temporada, a
qual é destinada à ocupação temporária, a f‌im de atender necessidades momentâneas do
locatário; e, enf‌im, na Seção III cuida das locações não residenciais.
A locação não residencial é gênero que abrange toda e qualquer espécie de locação
de imóvel urbano que não tenha f‌im residencial ou para temporada. Deste modo, em se
tratando de locação de imóvel urbano destinada a f‌im diverso da moradia, e que não tenha
um caráter temporário, ter-se-á um contrato de locação não residencial, que também não

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT