Locação built-to-suit e sua interpretação pela jurisprudência

AutorAlexandre Ferreira de Assumpção Alves e Lucas Caminha
Páginas427-443
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LOCAÇÃO BUILT-TO-SUIT
E SUA INTERPRETAÇÃO PELA JURISPRUDÊNCIA
Alexandre Ferreira de Assumpção Alves
Doutor em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor
Associado nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da UERJ.
Professor Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Lucas Caminha
Mestre em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Graduado
em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro da Comissão
de Direito da Concorrência da Ordem de Advogados do Brasil no Rio de Janeiro (OAB/
RJ). Advogado no Rio de Janeiro.
Sumário: 1. Introdução. 2. A surgimento do built-to-suit, a disrupção das estruturas tradicionais de
utilização de imóveis para ns não residenciais e a captação de recursos para sua Implementação.
2.1 As estruturas de captação de recursos e seu efeito na alocação de responsabilidades no buit-to-
-suit. 3. Contrato built-to-suit: natureza jurídica e alocação das responsabilidades. 3.1 Obrigações
do empreendedor imobiliário. 3.2 Obrigações do locatário/explorador do imóvel. 4. A acolhida
do built-to-suit pela jurisprudência e, em seguida, pela legislação. 4.1 A adoção do built-to-suit
pelos agentes econômicos em um vácuo legislativo. 4.2 O cenário positivo para a contratação à
luz da interpretação jurisprudencial desde a introdução do built-to-suit no Brasil. 4.3 A previsão
legislativa do built-to-suit em 2012 como “contrato de construção ajustada” e seu impacto em novas
contratações. 5. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
Embora a organização do estabelecimento empresarial seja um encargo de qualquer
empresário e caiba a ele a escolha dos elementos corpóreos e incorpóreos que integrarão
a universalidade de fato, a maioria esmagadora deles ainda se utiliza de imóveis (próprios
ou não) para o exercício de empresa, nem que seja como base remota para o estabeleci-
mento virtual.
O escopo primordial do artigo é investigar a estrutura jurídica de locação empresarial
denominada locação built-to-suit (ou contrato de construção ajustada), por meio da qual
uma pessoa física ou jurídica, em geral constituída na forma de sociedade empresária (i)
contrata um empreendedor imobiliário para comprar um imóvel e nele realizar constru-
ção, adaptação ou reforma substanciais, sob “encomenda” da primeira; e, em seguida, (ii)
aluga esse imóvel, adquirido pelo empreendedor, para exercer a sua atividade econômica
por um prazo considerável (i.e., de dez a vinte anos), nele f‌ixando seu ponto empresarial.
A pertinência do instituto mostra-se relevante porque o bom desempenho da eco-
nomia brasileira na primeira década do século XXI – em que pese o momento recessivo
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dos últimos anos desta década – aumentou a demanda empresarial por mais espaço físico
(imóveis), especialmente quando há ampliação da empresa. No entanto, as estruturas jurí-
dicas tradicionalmente usadas pelos agentes econômicos para conseguir novas instalações
(i.e., aquisição de imóvel; arrendamento mercantil e contrato de locação) eram acometidas
por diversas inef‌iciências alocativas que serão discutidas no capítulo 2.
O objetivo do presente estudo sobre o built-to-suit se dividirá em (i) apresentar as
suas vantagens econômicas para o explorador do imóvel em relação à compra ou locação
de imóvel; (ii) explicar a sua estrutura contratual e alocação de obrigações/responsabi-
lidades às partes; (iii) expor sua trajetória no Brasil desde que se tornou prática habitual
nos anos 90 e teve a sua validade constantemente reaf‌irmada pela jurisprudência; e (iv)
compreender os efeitos da sua tipif‌icação pela Lei 12.744/2012 e da sua interpretação pela
jurisprudência.
Utiliza-se o método dedutivo, partindo-se da premissa maior que a contratação da
construção ajustada permite um cenário de maior f‌lexibilidade para as partes e alocação
ef‌iciente de recursos, mas também (premissa menor) exige a adoção de regras especiais
para a alocação de responsabilidades, a f‌im de resguardar os recursos aplicados pelo
locador/empreendedor e tornar o arranjo contratual viável e promissor. Para tanto,
a dedução é que grande parte do sucesso do modelo contratual se deve à acolhida do
built-to-suit pela jurisprudência e como o reconhecimento pelos Tribunas sedimentou o
arcabouço de segurança jurídica, além da alteração promovida em 2012 na Lei 8.245/91
Como base empírica desse estudo, foram levantados contratos built-to-suit por
conglomerados economicamente relevantes no Brasil, tendo como base documentos de
ofertas públicas de certif‌icações de recebíveis imobiliários (CRI).
2. A SURGIMENTO DO BUILT-TO-SUIT, A DISRUPÇÃO DAS ESTRUTURAS
TRADICIONAIS DE UTILIZAÇÃO DE IMÓVEIS PARA FINS NÃO RESIDENCIAIS E A
CAPTAÇÃO DE RECURSOS PARA SUA IMPLEMENTAÇÃO
A primeira década do século XXI, na esteira do bom desempenho da economia,
promoveu um crescimento expressivo de procura por imóveis, diante do PIB positivo em
quase todos os anos da década1, época essa que motivou a publicação pela revista norte-a-
mericana The Economist, da famosa capa “Brazil takes off”, ilustrando o Cristo Redentor
em ascensão como um foguete2. Esse aquecimento econômico também contribuiu para um
correlato aquecimento no mercado imobiliário, podendo ser levantadas duas razões: (i)
a expansão do crédito imobiliário, inclusive pelos f‌inanciamentos do Sistema Financeiro
da Habitação (“SFH”) e, (ii) a demanda das sociedades empresárias por mais espaço físico
para expansão de atividades econômicas3.
1. Em toda a primeira década desde século (2000 a 2009), apenas no último ano – 2009 – o PIB brasileiro foi negativo (- 0,13%),
tendo atingido picos de 5,76% e de 7,07%, respectivamente, nos anos de 2004 e 2007 (Fonte: Sistema Gerenciador de Séries
Temporais, .br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries>.
Acesso em: 30 nov. 2020.
2. THE ECONOMIST. “Brazil takes off: Now the risk for Latin America’s big success story is hubris”, The Economist
(12.11.2009), Dipsonível em: f>. Acesso em: 08 nov.
2020.
3. FIGUEIREDO, Luiz Augusto. Built to Suit. Revista de Direito Imobiliário, v. 72, São Paulo: RT, jan/jun 2012, p. 168.

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