Direitos Políticos

AutorGuilherme Sandoval Góes/Cleyson de Moraes Mello
Páginas725-756
Capítulo 22
Direitos Políticos
22.1. Conceito, pressupostos e natureza jurídica dos direitos políticos.
Os direitos políticos são direitos públicos subjetivos do homem-cidadão
que criam as regras do jogo democrático, que circunscreve a legítima disputa
pelo exercício do poder político no âmbito de um Estado Democrático de
Direito. Isto significa dizer que os pressupostos constitucionais dos direitos
políticos são a cidadania e a soberania popular.
Na clássica definição de Pimenta Bueno, os direitos políticos são:
prerrogativas, atributos, faculdades, ou poder de intervenção dos cidadãos ati-
vos no governo de seu país, intervenção direta ou indireta, mais ou menos am-
pla, segundo a intensidade do gozo desses direitos. São o Jus Civitatis, os direi-
tos cívicos, que se referem ao Poder Público, que autorizam o cidadão ativo a
participar na formação ou exercício da autoridade nacional, a exercer o direito
de vontade ou eleitor, os direitos de deputado ou senador, a ocupar cargos polí-
ticos e a manifestar suas opiniões sobre o governo do Estado.1
Em essência, os direitos políticos nada mais são do que direitos públicos
subjetivos através dos quais a Constituição assegura ao homem-cidadão o
exercício da soberania popular atribuindo-lhe poderes para intervir, direta
ou indiretamente, na escolha dos seus governantes, na formação da vontade
nacional, na condução da coisa pública e na elaboração das decisões políticas
do Estado. É a própria Constituição de 1988 que estabelece no seu artigo
primeiro, parágrafo único, que “todo o poder emana do povo, que o exerce
por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Cons-
tituição”. Assim, os direitos políticos consistem nos meios necessários ao
exercício da soberania popular.
Portanto, dentro de um verdadeiro Estado Democrático de Direito, a ti-
tularidade da soberania popular pertence ao povo, que a exerce diretamente
(democracia participativa, também denominada de democracia plebi-
scitária rousseauniana) ou indiretamente por meio de representantes eleitos
1 BUENO, Pimenta. Direito público brasileiro e análise da constituição do Império. Rio
de Janeiro:, p. 458, apud Celso Ribeiro Bastos, Curso de Direito Constitucional, p. 272.
democraticamente pelo sufrágio universal (democracia representativa, tam-
bém denominada democracia indireta lockeana).
No entanto, observe, com muita atenção, que somente o cidadão exerce
efetivamente os direitos políticos. O cidadão por sua vez é o nacional no ple-
no gozo de seus direitos políticos (cidadania = nacionalidade + direitos po-
líticos). Não se confundem, portanto, as ideias de nacionalidade e cidadania.
A nacionalidade é adquirida por nascimento ou por naturalização, enquanto
a cidadania é adquirida pelo alistamento eleitoral, nos termos da lei.
Ou seja, o pleno gozo dos direitos políticos representa o instrumento por
meio do qual os nacionais se transformam em cidadãos, que passam a ter ca-
pacidade jurídica de transformar a vida política do Estado, diretamente ou
por seus representantes, daí a ideia de que os direitos políticos são direitos
fundamentais próprios da cidadania, do homem-cidadão.
E mais: com a devida agudeza de espírito, é bem de ver que a cidadania é
a qualificação política da nacionalidade, ou seja, todo cidadão é nacional, mas,
nem todo nacional é cidadão. Eis aqui muito bem caracterizado o fenômeno
da nacionalidade sem cidadania, significando dizer que o indivíduo continua
nacional, mas, já não é mais cidadão, isto é, continua detentor da nacionalida-
de do País (com ponente do povo brasileiro), mas, não pode, por diferentes
motivos, exercer os direitos públicos subjetivos de participação política.
Em sede constitucional, o fenômeno da nacionalidade sem cidadania
ocorre nas seguintes hipóteses, dentre outras:
a) brasileiros, natos ou naturalizados, com condenação criminal transita-
da em julgado, enquanto persistirem os efeitos da pena (art. 15, III, da
CRFB/88);
b) nacionais, natos ou naturalizados, menores de 16 anos de idade (art.
14, § 1º, I, II, c, da CRFB/88);
c) brasileiros, natos ou naturalizados, com incapacidade civil absoluta
(art. 15, II, da CRFB/88);
d) nacionais, natos ou naturalizados, que cometerem atos de improbida-
de administrativa nos respectivos prazos de suspensão de direitos políticos
(art. 15, III, da CRFB/88, c/c art. 37, § 4º, da CRFB/88);
e) brasileiros, natos ou naturalizados, que se recusarem a cumprir obri-
gação a todos imposta ou se recusarem a cumprir prestação alternativa im-
posta após a alegação de crença religiosa ou de convicção filosófica ou políti-
ca (art. 15, III, da CRFB/88, c/c art. 37, § 4º, da CRFB/88);
f) brasileiros, natos, no cargo de presidente, vice-presidente da república
e ministro do STF, que cometerem crime de responsabilidade, pelo prazo de
oito anos (art. 52, § único, da CRFB/88);
g) brasileiros, natos, no cargo de ministro de estado da defesa em crime
de responsabilidade conexo com o crime do presidente ou vice-presidente
da república, pelo p razo de oi to anos (art. 52 , § único, da CRFB/88);
h) nacionais, natos ou naturalizados, membros do CNJ e do CNMP, Pro-
curador- Geral da República ou Advogado Geral União, que cometerem cri-
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me de responsabilidade, pelo prazo de oito anos (art. 52, § único, da
CRFB/88);
i) brasileiros, natos ou naturalizados, no cargo de ministro de estado, ex-
ceto ministro da defesa, em crime de responsabilidade conexo com o crime
do presidente ou vice-presidente da república, pelo prazo de oito anos (art.
52, § único, da CRFB/88);
j) brasileiros, natos ou naturalizados, comandantes da Marinha, Exército
ou Aeronáutica, em crime de responsabilidade conexo com o crime do pre-
sidente ou vice-presidente da república, pel o pra zo de o ito a nos (a rt. 5 5, IV ,
VI, da CRFB/88);
k) nacionais, natos, no cargo de presidente da Câmara dos Deputados ou
do Senado Federal, que tiverem perdidos ou suspensos seus direitos políti-
cos, bem como os que sofrerem condenação criminal em sentença transitado
em julgado, pelo prazo que durarem seus respectivos efeitos (art. 55, IV, VI,
da CRFB/88);
l) nacionais, natos ou naturalizados, no cargo de deputado ou senador,
que tiverem perdidos ou suspensos seus direitos políticos, bem como os que
sofrerem condenação criminal em sentença transitado em julgado, pelo pra-
zo que durarem seus respectivos efeitos (art. 55, IV, VI, da CRFB/88).
Por outro lado, observe, com mais atenção ainda, que, também, existe a
possibilidade do fenômeno da cidadania sem nacionalidade, ou seja, muito
embora o indivíduo não seja nacional de um determinado País, pode exercer
os direitos políticos de participação na condução da vida nacional, como se
nacional fosse. Em termos simples, trata-se da hipótese de cidadão que não
é nacional. Tal situação ocorre no regime jurídico da quase-nacionalidade ou
do português equiparado, onde os portugueses com residência permanente
no país e com equiparação política podem exercer direitos políticos funda-
mentais dos brasileiros, tendo em vista o que preconiza o Tratado de Amiza-
de, Cooperação e Consulta entre Brasil e Portugal. O mesmo ocorre com
brasileiros com equiparação política com visto permanente em Portugal.
Uma vez examinada a distinção entre a nacionalidade e a cidadania, im-
pende, agora, examinar a natureza jurídica dos direitos políticos, finalizando
esta segmentação temática.
Como primeira observação nesse sentido, vale destacar que os direitos
políticos fazem parte do rol de direitos fundamentais consagrados pela acep-
ção do Estado Democrático de Direito, cuja dinâmica impõe determinadas
limitações jurídicas ao arbítrio governamental, assegurando ao indivíduo di-
reitos democráticos de participação da vida política do Estado. Nesse senti-
do, como já amplamente estudado, são pressupostos dos direitos políticos a
cidadania e a soberania popular.
Com rigor, os direitos políticos nascem atrelados ao conceito de Estado
de Direito, por ocasião da Revolução francesa de 1789, na qual a burguesia
em ascensão destitui o monarca absolutista, substituindo a soberania divina
do Estado Absoluto pela soberania popular do Estado Liberal de Direito. Por
Direito Constitucional 727

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